Análise Arkade: Destiny (PS4, PS3, XOne, X360) é lindo, divertido, viciante… e cheio de falhas
Depois de uma massiva campanha de marketing, Destiny está entre nós. Nos internamos no bilionário novo shooter da Bungie, e trazemos nossa análise completa para você!
Destiny quebrou recordes antes mesmo de ser lançado. Com um orçamento que chegou aos 500 milhões de dólares (jogo mais caro já produzido) e um absurdo número de pré-vendas (recorde de pré-vendas de um novo IP), o game assolou a internet e até mesmo as transmissões de gameplay quebrou recordes (maior número de vídeos de gameplay assistidos no Twitch), o que virou uma bola de neve de hype, expectativa e antecipação.
Com uma campanha de marketing esmagadora, vídeos com a maior cara de superprodução e fases alpha e beta muito disputadas, a Bungie conseguiu inserir Destiny no inconsciente coletivo gamer. Mas será que o hype gerado foi correspondido? Vamos descobrir!
SINOPSE
Sem rodeios, a verdade é: a história de Destiny é genérica e fraca. Ela se apoia em conceitos pra lá de manjados de “luz versus trevas” para nos introduzir à situação precária que a humanidade vive centenas de anos no futuro. Durante a chamada Era Dourada, colonizamos outros planetas e dominamos a tecnologia e o espaço. Porém, esses tempos de paz acabaram quando o Colapso (um cataclisma misterioso) dizimou boa parte da humanidade.
Nesta época de caos, a salvação surge na forma do Viajante, um corpo celeste misterioso que usou sua Luz para proteger que restou da humanidade da Treva, um mal que está assolando a galáxia e controlando diversas raças alienígenas.
Depois de reunir o que restou da humanidade em um lugar conhecido como “A Torre”, o Viajante meio que hiberna, mas há um Porta Voz que mantém sua palavra viva, e sua Luz é o que guia os Guardiões, valorosos guerreiros cujo objetivo é basicamente defender a raça humana e viajar pelo espaço eliminando possíveis ameaças.
Como se não bastasse o fato da história clichê e previsível, ela é muito mal contada. É tudo resumido, sintetizado, e a maioria das conversas são desinteressantes e não explicam nada. Na prática, a história piegas é uma mera desculpa para te fazer criar um personagem e explorar uma (nem tão) vasta galáxia metendo tiro em aliens de variados tipos e tamanhos.
PERSONAGENS E INIMIGOS
Como no alpha e no beta, temos 3 classes de personagens para escolher: Arcano, Caçador e Titã. Cada classe possui duas subclasses, com árvores de evolução (bastante lineares), equipamentos e habilidades especiais próprias, algumas voltadas para suporte, outras para ataque. Nestas duas semanas que me internei em Destiny, fui de Caçador, gosto muito da classe, de seus poderes e de sua faquinha pra lá de estilosa.
Você ainda pode escolher três raças distintas: Humano, Desperto e Exo. Essas mudanças são puramente estéticas (ainda que hajam pouquíssimas opções de customização), visto que a história e o andamento da campanha é exatamente o mesmo para qualquer raça.
As diferentes classes são tão mal explicadas quanto qualquer outra coisa no jogo. Por exemplo: os Exos são seres orgânicos/robóticos ou são apenas máquinas com inteligência avançada? De onde eles vieram? Quem os construiu (se é que foram construídos por alguém)? E o Viajante, qual sua origem? Por que diabos nosso protagonista começa o jogo morto? Nada é minimamente explicado, o jogador é simplesmente atirado naquele mundo e precisa conviver com essa escassez de informações.
Os inimigos possuem uma backstory igualmente vaga. Ok, os Decaídos parecem realmente malvados — um deles empunha uma arma e ruge ferozmente já na cutscene inicial — mas logo vão aparecendo outras raças e nós vamos de planeta em planeta distribuindo tiros em seres… por quê? Eles são realmente ameaças? A impressão que fica é que somos nós, os valorosos Guardiões, que estamos invadindo outros planetas e chacinando aliens “hostis” simplesmente porque um robôzinho tagarela e um sujeito esquisitão que conversa com uma bola gigante (?!) nos disseram para fazer isso.
Felizmente, viajar pelo espaço — acompanhado por seus amigos — disparando tiros nesses aliens é extremamente divertido, e é aí que Destiny realmente se torna interessante.
GAMEPLAY E DIVERSÃO
A Bungie fez escola com a série Halo, franquia que é sinônimo de qualidade em termos de FPS nos consoles. E esse know how é muito bem aproveitado aqui. O gameplay de Destiny é incrivelmente bom. Ele não reinventa a roda em nenhum momento, é aquele mesmo gameplay de FPS que a gente já conhece, mas tudo é extremamente polido, fluido e bem calibrado. Jogar Destiny com os amigos é realmente divertido e torna-se viciante num piscar de olhos.
A grosso modo, Destiny parece uma inusitada mistura de Halo com Borderlands e até uma pitada de Diablo: você estará sempre caçando novos inimigos pelo simples prazer de (talvez) coletar um novo item, arma ou equipamento. Cumprir as missões da (nem tão interessante) campanha acaba se tornando um mero detalhe, o que realmente importa é a exploração, os tiroteios e a busca pelo loot.
Isso tudo fica ainda mais divertido pelo “fator MMO”: Destiny pode ser jogado do começo ao fim em grupo. A Torre está sempre cheia de gente, e qualquer missão do jogo aceita esquadrões de até 3 jogadores (já rolaram Raids que aceitam grupos de até 6 players) e mesmo sozinho você vai acabar encontrando outros jogadores enquanto joga, e missões de Assalto sempre carecem de 3 jogadores para começarem. Nas missões comuns, rola aquele feeling de Journey: você pode entrar sozinho e outros jogadores estarão lá, mas você não precisa necessariamente jogar com eles.
Se você jogar com outros players, fique tranquilo, pois o loot de cada um é específico: cada jogador só enxerga e coleta seu próprio loot, o que deixa tudo mais justo. Ao final de cada missão cooperativa, ainda rola uma distribuição (aparentemente aleatória) de itens entre os jogadores envolvidos.
As armas possuem 3 modelos: principais (fuzis e pistolas do tipo “canhões de mão”), secundárias (escopetas, snipers e fuzis de carga) e pesadas (basicamente lança-foguetes e grandes metralhadoras). Já os equipamentos se dividem em capacetes, manoplas, armaduras peitorais, botas, insígnias, cinturões e capas (estes últimos de acordo com a classe).
Tanto armas quanto equipamentos podem ser de diferentes classes, que subdividem-se por cores: equipamentos brancos são os mais comuns, verdes são incomuns, azuis são raros, legendários são roxos e exóticos são amarelos. Do verde para cima, os equipamentos possuem seus próprios level ups (que funcionam como perks) e após o nível 20, seu Guardião só sobe de level utilizando equipamentos que concedam “pontos de luz”, e isso só rola com cetos equipamentos raros, legendários ou exóticos, então fique ligado para não “travar” no level 20, pois daí pra frente o XP coletado não sobe mais o level do seu Guardião, só de seus equipamentos e subclasses.
A distribuição de loot de Destiny é um tanto confusa e aleatória. Ao contrário de jogos como Diablo ou Borderlands, aqui existem pouquíssimos baús, de modo que você precisa ter um bocado de sorte para ver um inimigo dropar algo raro, especialmente quando estiver na busca pelos equipamentos que concedem pontos de luz. A maneira como os jogadores são recompensados ao final de cada missão também parece totalmente ao acaso; é normal vermos o pior jogador de uma partida PvP recebendo algo e o primeiros do grupo não.
Para complicar um pouco mais, os Lúmens (dinheiro do jogo) logo deixam de ser importantes, e você precisa gastar “Pontos de Reputação” para comprar armas e equipamentos melhores. O problema é que existem vários tipos diferentes: existe a reputação do Crisol, da Vanguarda, da Rainha, do Criptoarque… cada um usa seus próprios pontos para negociações. Moedas Estranhas, Fragmentos de Luz e outros itens raros também são usados como moeda de troca com certos vendedores. Após o level 20, upar seu personagem torna-se um exercício de paciência e determinação.
Independente do seu level, porém, uma coisa é fato: jogar Destiny é muito divertido, especialmente com os amigos. Eu já terminei a campanha há dias, mas continuo voltando ao game simplesmente para cumprir os desafios diários, fazer um ou outro contrato, ou simplesmente para encarar o frenético (e meio desbalanceado) PvP do Crisol, que conta com modos de jogo bem manjados do tipo Deathmatch e King of the Hill, mas normaliza danos de armas para todos, independente do level.
O fato de eu ainda me divertir com Destiny, porém, não me deixa cego para seus problemas. O simples fato do jogo te obrigar a permanecer online já pode ser considerado um problema: ele sequer começa se não houver conexão, e qualquer oscilação na sua internet (ou mesmo nos servidores da Bungie) e você será kickado da partida, recebendo uma tela simpática como essa:
Infelizmente, porém, os problemas não param por aí, e vão muito além de uma história clichê e da persistentência de uma conexão com a internet.
POTENCIAL DESPERDIÇADO
Mass Effect, Star Wars, Star Trek, Battlestar Galactica, Stargate, e até Dead Space são ótimos exemplos de franquias espaciais que conseguiram construir uma mitologia rica. Destiny tinha potencial para fazer parte deste grupo. Mas não faz justamente porque não se preocupa em valorizar seu próprio universo.
Conforme já dissemos, a história é bastante vaga, e embora você esteja o tempo todo ganhando “Cartas do Grimório” que contém informações bacanas, o Grimório só pode ser acessado pela internet ou pelo app do game. E quando a profundidade (nem tão profunda assim, diga-se de passagem) de um jogo está fora do jogo, definitivamente há algo errado.
A superficialidade que permeia a “mitologia” de Destiny torna-o uma casca vazia — ok, uma casca belíssima e tremendamente divertida –, sem personalidade. E não é só em termos narrativos que essa superficialidade fica evidente: elementos de gameplay que poderiam ser incríveis também são muito mal aproveitados.
Pegue por exemplo as naves: elas são lindas, estilosas, aerodinâmicas… mas você jamais pode realmente utilizá-las. As naves são basicamente as telas de loading de Destiny, e você as vê em toda sua glória somente enquanto espera sua próxima missão carregar. Em nenhum momento você pode pilotar a sua nave ou mesmo entrar nela, ela está ali somente para disfarçar o loading com sua beleza e sua imponência. Perseguições espaciais? Tiros laser? Explosões? Esqueça, nada disso está aqui.
Os Pardais — que são as motos voadoras que os Guardiões possuem — são igualmente mal aproveitados. Você até vai utilizá-los para se locomover mais rapidamente, mas é algo tão simplório que não consigo deixar de pensar por que diabos não existem sequências de perseguição, avalanches, desmoronamentos ou simplesmente corridas multiplayer (no estilo das Pod Races de Star Wars) entre Pardais? Qualquer coisa além de “ir do ponto A ao ponto B” seria bem-vinda.
Os próprios mapas são vazios e sem graça. Ok, o visual é de tirar o fôlego, mas não há nada lá. Em Marte e Vênus passamos por resquícios de civilização, mas eles estão lá somente por estarem. Bioshock e The Last of Us são provas de que lugares vazios e pós-apocalípticos podem nos contar excelentes histórias, mas em Destiny isso não acontece: lugares vazios são apenas lugares vazios.
REPETITIVIDADE
Outro ponto em que Destiny escorrega é no design de suas missões. Em cerca de 90% delas — sejam elas na Terra, na Lua, em Marte ou em Vênus, que são todos os mapas jogáveis do game até o momento — há o mesmo modus operandi. Esteja você sozinho ou acompanhado, é sempre a mesma coisa.
Para começar, seu Fantasma (o robôzinho voador que te acompanha) te passa um breve briefing da missão e diz o que você deve fazer e onde deve ir. Você vai até lá — fuzilando uns aliens no processo — e então precisa segurar a barra contra hordas de inimigos enquanto seu Fantasma faz alguma coisa (decifra uma mensagem, abre uma porta, inspeciona algum artefato). Depois disso, mate mais alguns aliens e enfrente um chefe final (geralmente uma “esponja de balas” que é mais demorada de derrubar do que genuinamente difícil) que ainda evoca inimigos ocasionalmente para complicar.
E você vai fazer isso muitas e muitas vezes. Parece que a Bungie pensou que o mesmo tipo de missões seria algo muito legal, pois raras vezes o estilo de missão foge dessa receita. Muda o planeta, mas salvo pouquíssimas exceções — como a missão em que empunhamos uma enorme espada — o estilo das missões é sempre o mesmo.
Para piorar, as missões de Assalto são simplesmente variações de missões comuns ligeiramente mais difíceis. Você irá cumprir o mesmo objetivo e matar o mesmo chefão, a única diferença é que agora os inimigos estarão mais fortes e serão mais duros na queda. Os Contratos seguem a mesma cartilha, e propõe os mesmos tipos de desafios genéricos e repetitivos.
Tudo parece ainda mais repetitivo pelo fato de que os mapas são sempre os mesmos. A Terra se resume ao Cosmódromo, na Antiga Rússia, e todas as missões na Terra só rolam ali. Você não explora “a Terra”, você explora só aquele pedacinho dela. O mesmo vale para Lua, Marte e Vênus: são todos mapas relativamente grandes, mas limitados e que se tornam manjados justamente pela repetição.
O número bastante limitado de mapas e planetas provavelmente tem uma explicação: DLCs. Se a Bungie e a Activision quiserem, elas podem passar anos lançando novos conteúdos para Destiny. Um novo planeta aqui, uma raid ali, um novo chefão acolá… ainda que esteja longe de der um MMO “padrão”, o final da campanha de Destiny — que dura entre 6 e 8 horas — definitivamente não é o final do game, que pode (e deve) ter seu universo muito expandido no futuro… só vamos torcer para que essas expansões não doam muito no bolso.
AUDIOVISUAL
Certamente o ponto em que Destiny mais brilha. O visual deste jogo é simplesmente incrível. Os cenários (embora vazios e repetitivos) são belíssimos, e contam com ótimas texturas e efeitos de iluminação fotorrealistas que são impressionantes. Das paisagens desérticas do Cosmódromo aos templos alienígenas de Vênus, passando até pelo design de naves, equipamentos e armas, a direção de arte de Destiny é realmente caprichada.
As animações tanto de inimigos quanto de NPCs e protagonistas também são boas (ainda que nos momentos em terceira pessoa os Guardiões pareçam um tanto desengonçados). O ataque melee também é demais, e o mais legal é que cada classe tem a sua própria “porrada”. A interface do jogo é bem limpa, e seus menus são muito bem organizados e intuitivos, lembrando um pouco uma interface de PC.
Rodando em 1080p e 30fps na nova geração (testamos o game no PS4), o desempenho de Destiny é bastante fluido e estável, sem engasgos ou quedas de framerate (ainda que os load times sejam meio longos).
A trilha sonora — assinada por Martin O’Donnell, que cuidou da trilha de todos os Halos produzidos pela Bungie – é simplesmente espetacular, e consegue misturar coros e orquestrações com batidas eletrônicas e dubsteps de maneira poderosa. A faixa de Paul McCartney que toca nos créditos finais até soa tímida se comparada ao magistral trabalho de O’Donnell.
Confira abaixo uma das excelentes músicas do game:
Os efeitos sonoros mantém o mesmo nível, com tiros, explosões e lasers bem convincentes. O jogo chegou ao Brasil totalmente dublado em português, e a maioria das dublagens cumpre muito bem seu papel. Algumas são meia-boca (o sujeito que narra as partidas do Crisol é péssimo), mas considerando que até a dublagem gringa foi alvo de críticas (muitas delas voltadas para Peter Dinklage, o Tyrion Lannister de Game of Thrones, que dubla o Fantasma), no geral a dublagem brasileira do jogo está muito boa.
CONCLUSÃO
Embora eu tenha apontado diversos defeitos no decorrer desta resenha, repito: eu ainda estou jogando Destiny. Por mais oco, repetitivo e sem personalidade que ele seja, jogá-lo é divertido e viciante. Poucas semanas após seu lançamento já fica um gosto meio amargo de “sério que terei que matar esse mesmo chefe de novo?”, mas o frenesi da batalha e a busca pelo (escasso) loot ao lado dos amigos continuam me fazendo voltar para este (mal explorado) universo.
Se Destiny fosse apenas mais um shooter genérico de uma empresa mediana, ele certamente pararia por aí. Mas não é. Ele é ambicioso, ele custou muito caro, ele tem os logos de duas gigantes em sua capa e sua campanha de marketing gerou um hype enorme. Esse hype foi correspondido? Não exatamente. Isso será remediado no futuro (mais conteúdo, mais planetas, mais diversidade)? Talvez. Só resta saber quanto essa brincadeira vai nos custar.
Do jeito que foi entregue, Destiny é um jogo que prometeu muito, mas não cumpriu. Ok, ele sem dúvida é lindo, divertido e viciante, mas isso certamente não vai manter os jogadores interessados eternamente. O final do ano está aí, cheio de lançamentos promissores. Que a Bungie e a Activision tenham traçado um “destino” decente para Destiny, ou os servidores do jogo vão acabar tão vazios quanto os mapas do game.
Mas enquanto isso não acontece, eu vou ali cumprir uma raid com os amigos e já volto.
Destiny foi lançado no dia 9 de setembro, com versões para Playstation 4, Playstation 3, Xbox One e Xbox 360.