Análise Arkade: Outlast 2 é uma experiência macabra de terror e sobrevivência
Tire as crianças da sala. Apague a luz. Vista sua fralda mais confortável e venha se borrar de medo com a gente em Outlast 2, game que traz temas pesados para chocar — e aterrorizar — o jogador!
Uma premissa familiar
Se eu tivesse que resumir a premissa de Outlast 2, seria da seguinte maneira: controlamos um cara que precisa ir resgatar a esposa em um lugar sinistro e misterioso, cheio de pessoas psicóticas que irão tentar matá-lo sempre que o virem.
Isso soa familiar? Pois é, o recente Resident Evil 7 começa meio que da mesma maneira! Mas, tirando esta premissa básica e a temática de horror presente em ambos, de resto os dois jogos tomam caminhos completamente diferentes. Enquanto Resident Evil nos arma com pistolas e escopetas, aqui temos apenas uma câmera, e somos totalmente indefesos contra os abomináveis perigos que se escondem na escuridão.
O protagonista da vez é Blake, cinegrafista que estava acompanhando sua esposa Lynn (que é repórter), em uma reportagem investigativa sobre uma jovem grávida que desapareceu misteriosamente em uma região remota do Arizona. O helicóptero que levava o casal sofre uma pane e, após uma queda violenta, os dois se separam.
Lynn não está nos destroços, o que dá a Blake a esperança de que ela tenha buscado abrigo em um vilarejo próximo. O que ele não sabia é que esta comunidade isolada é chefiada por um cultista maluco, que acha que o fim do mundo está chegando, e adivinha o que seus fanáticos seguidores fazem para buscar a redenção divina e quem sabe conseguir entrar no Paraíso? Pois é, sacrifícios humanos, com generosas pitadas de tortura e mutilação.
Outlast 2 supostamente se passa no mesmo universo do jogo anterior, mas não traz praticamente nada dele, pelo menos não em termos de plot ou narrativa. O claustrofóbico Mount Massive Asylum dá lugar a um cenário muito mais amplo, onde plantações, celeiros e casebres dividem espaço com matadouros e altares de sacrifício. Temas como fanatismo religioso, abuso sexual e misoginia são recorrentes aqui, fundindo-se em um universo realmente perturbador e absolutamente não indicado para pessoas de estômago fraco.
Aliás, o game já começa sendo super simpático com o jogador, e traz uma mensagem bem animadora:
Tendo muito mais uma premissa do que uma história, o que recebemos é um pano de fundo que poderia ser incrível, mas acaba sendo meio mal aproveitado em vários momentos: muitas ideias são jogadas, mal aproveitadas. Parece que a Red Barrels simplesmente não conseguiu juntar tudo de maneira coesa. O resultado não é ruim nem decepcionante, mas deixa uma sensação de que poderia ter seguido por outro caminho, sido melhor aproveitado, sabe?
Fugindo e se escondendo
Se há algo que Outlast 2 mantém essencialmente igual ao que vimos no primeiro game, porém, é a vulnerabilidade do protagonista. Blake não carrega nenhuma arma, nem é capaz de se defender de forma nenhuma. Sua única salvação é fugir, se esconder e, principalmente, agir com cautela, evitando o contato direto com os fanáticos e com quaisquer outras criaturas sinistras que invariavelmente pintarem no seu caminho.
A escuridão opressiva de Outlast 2 também será sua inimiga, obrigando-o a usar o modo visão noturna da sua câmera se quiser enxergar alguma coisa. Porém, a câmera consome bateria, e ainda que o jogo seja relativamente generoso na distribuição de baterias (pelo menos na dificuldade normal), o ideal é que você use sua câmera com parcimônia, e acostume-se a dar uma olhada geral no ambiente com ela, deixando a exploração propriamente dita para ser feita no escuro.
O level design de Outlast 2 dá algumas pistas sutis do que fazer ou para onde ir: uma vela acesa, uma marca de sangue em uma parede, um buraco em uma cerca de arame. Tudo isso serve para lhe guiar, mas nada é esfregado na sua cara; você precisa estar atento aos sinais que o jogo te dá, e mesmo assim pode acabar ficando perdido em vários momentos. O cenário mais amplo oferece mais experimentação, mas também abre mais espaço para erros, e o aborrecido sistema “tentativa e erro” acaba sendo necessário ocasionalmente, quando você é morto de novo e de novo até descobrir o que fazer ou para onde ir.
Por mais cauteloso que você seja, invariavelmente será visto; até porque existem momentos scriptados onde você SERÁ perseguido. Nessas horas o jogo geralmente te obriga a — literalmente — rastejar por coisas hediondas (corpos mutilados cheios de vermes, por exemplo) pelos quais você provavelmente já até tinha passado, simplesmente para esfregar na sua cara algumas das coisas mais nojentas que uma engine é capaz de produzir.
Outlast 2 estabelece uma rotina que os fãs do primeiro game provavelmente já conhecem: explore os ambientes com cuidado, leia todos os documentos e arquivos que encontrar, evite contato direto com qualquer criatura e, caso seja visto, fuja o mais rápido que puder e se esconda. E mesmo que ache um bom esconderijo, não ache que isto é sinônimo de segurança, pois a IA de certos inimigos concedeu-lhes uma curiosidade sádica, e eles podem te encontrar e te trucidar em um piscar de olhos.
No geral, a experiência de gameplay que Outlast 2 proporciona não é realmente nova, nem mesmo evolui o que a franquia já apresentou antes, mas ainda funciona, e consegue entregar cerca de 10 horas de jogatina em que terror, medo, nojo, ansiedade e tensão estão sempre juntos.
Documentando o terror
Muito além da necessária função de “iluminar” os ambientes, sua câmera também está diretamente atrelada ao seu progresso no jogo: sem uma história propriamente dita sendo martelada na sua cabeça, você precisa coletar informações que aprofundem a cruel realidade daquele lugar para ter um panorama geral do que acontece por ali.
Ainda que seus objetivos primordiais sejam sobreviver e encontrar sua esposa, o ímpeto jornalístico de Blake torna necessário que ele documente eventos, lugares e acontecimentos importantes. Se o material gravado será uma baita reportagem investigativa ou as últimas horas da vida do homem, depende do jogador.
Uma novidade bacana que foi implementada em prol da narrativa são os flashbacks: em certos momentos e lugares, Blake é tomado por alucinações (jogáveis) que mostram uma realidade muito diferente. Apesar de corredores imaculadamente limpos, estes ambientes visitados no passado são apenas uma fachada, que esconde a podridão de uma realidade que já estava corrompida há anos, e o terror que acompanhamos aqui — geralmente do ponto de vista de uma jovem garota — é igualmente perturbador.
Audiovisual
Outlast 2 é produzido com uma versão atualizada da Unreal Engine 3. A engine que foi a queridinha da indústria na geração passada já mostra sinais da idade, mas no geral não decepciona, e é favorecida pelo talento dos artistas da Red Barrels e pela onipresente escuridão do game. Alguns elementos — o sangue, por exemplo — acabam destoando do conjunto: ele é brilhante demais, e mais parece geleia do que sangue de verdade.
É no departamento sonoro, porém, que o jogo brilha: a atmosfera de terror é acentuada por uma trilha sonora digna dos melhores filmes do gênero — com todos os violinos agudos e agourentos que se espera –, e o microfone da sua câmera ocasionalmente capta sussurros, passos e rangidos que são de gelar a espinha. As dublagens em geral são muito boas, e mesmo Blake, que é o primeiro protagonista com voz e personalidade da série, cumpre bem seu papel, ainda que não tenha muita coisa interessante para dizer.
Vale destacar também o excelente trabalho de localização do game: tudo está legendado em português, e os documentos que você encontra estão realmente escritos em nosso idioma — não estão em inglês com uma tradução por cima, como geralmente acontece. Palavrões e pragas não foram amenizados, em um trabalho de localização chocante e realmente digno de nota para um game que, afinal, não é exatamente um triple A.
Conclusão
Outlast 2 não é realmente inovador no que se propõe, mas entrega uma experiência aterrorizante e perturbadora digna de uma franquia que já se tornou referência no gênero. O tom está ainda mais sinistro, os temas são mais pesados e polêmicos, e a falta de pudor da empresa em mostrar um lado ainda mais gore do horror merecem ser levados em conta. A história poderia ser melhor e mais instigante, mas a escorregada narrativa é compensada por um gameplay sólido e funcional e um universo digno de pesadelo.
Talvez Outlast 2 não se torne um clássico como foi o jogo de 2013, mas isso é simplesmente por ele ser a sequência de algo que já deixou um legado, e estabeleceu um patamar bem alto. Apesar disso, o terror que temos aqui é de primeira linha, e sem dúvida merece ser experimentado por fãs da série e de um bom survival horror, que tenham nervos para aguentar a tensão e estômago para o macabro espetáculo visual que o jogo entrega.
Outlast 2 é o tipo de jogo ideal para jogar de madrugada, no escuro, usando um bom par de fones de ouvido… desde que você tenha culhões para isso.
Outlast 2 está sendo lançado hoje (25/04), com versões para PC, Playstation 4 e Xbox One.
Esta análise foi feita com base em uma cópia de Xbox One, que nos foi cedida antecipadamente pela publisher.