Análise Arkade: ReCore é uma boa ideia meio mal executada
O que esperar de um jogo que tem em seu time criativo as mentes por trás de clássicos como Mega Man e Metroid Prime? ReCore tem tudo isso… mas também tem muitos problemas. Confira nossa análise completa!
Um mundo distante
ReCore se passa em um planeta chamado Far Eden. A humanidade planejava migrar para lá depois que um cataclisma chamado de “Redemoinho“ arruinou a Terra. Porém, Far Eden não era realmente um planeta adequado para uma colonização humana.
Para resolver isso, nossos cientistas enviaram robôs, que seriam responsáveis pela “terraformação” do planeta, tornando-o apto para receber os humanos. Também foram enviados alguns engenheiros, botânicos e outros especialistas, que ajudariam nesta transformação.
O problema é que ela nunca aconteceu. Algo corrompeu o Núcleo dos robôs, que se tornaram hostis e agora reivindicam o planeta para eles. Na pele da jovem Joule, que foi mandada para lá por seu pai para monitorar as “obras”, é seu papel descobrir o que aconteceu e tentar colocar as coisas em ordem, tirando Far Eden das garras dos robôs para que a humanidade possa renascer por lá.
A jornada também tem um lado mais pessoal para a garota, pois o paradeiro de seu pai também é desconhecido. Existem audiologs dele espalhados pelo planeta, e os Núcleos Prismáticos (já falo mais sobre eles) parecem esconder algum tipo de mensagem secreta que só Joule é capaz de decifrar.
Explorando Far Eden
Em se tratando de mecânicas e gameplay, ReCore é um jogo que mistura ação, aventura e plataforma com tiro em terceira pessoa. Este não é um jogo de mundo aberto, Far Eden é dividida em hubs, que são bem grandes, e ligados através de teleféricos ou enormes portais. O planeta lembra um pouco do mundo que vimos no jogo do Mad Max: deserto e areia para tudo que é lado, com bases em ruínas e montes de sucata espalhados por todos os lugares.
O básico do que você faz no game é explorar. E Joule é muito boa nisso. Munida de um pseudo exo-esqueleto que lhe concede habilidades como dash e pulo duplo, ela não tem frescura na hora de escalar, explorar masmorras (sim, ReCore tem masmorras!), saltar entre plataformas móveis (muitas vezes a dezenas de metros do solo) e enfrentar robôs do mal.
Confira abaixo um momento de plataforma bem desafiador e interessante, onde o robôzinho Seth dá uma ajuda para Joule:
Ainda que ela tenha um rifle para encarar seus inimigos — com munições de diferentes cores, para você mudar de acordo com a cor do núcleo dos inimigos, o que agrega certo fator estratégico aos combates — na hora das batalhas também é bem útil seu grappling hook, que lhe permite arrancar na marra o Núcleo dos inimigos. E, claro, você também tem seus Nucleobots, que serão seus maiores aliados tanto na exploração quanto nos combates.
Robôs amigos
Joule começa sua aventura com um companheiro robótico canino chamado Mack. Ele é capaz de escavar a areia em busca de itens e também pode atacar os inimigos. Posteriormente, você vai encontrando (ou montando) outros Nucleobots, como o grandalhão Duncan, que é meio que um gorila-robô que é pura força bruta, e Seth, uma espécie de aranha-robô capaz de te carregar pro trilhos específicos.
A sinergia entre Joule e seus robôs é muito bacana, e há até um leve sabor de MetroidVania envolvido: depois que você ganha um novo companheiro robô e entende qual é sua habilidade, você lembra de todos os lugares pelos quais você passou que tinham aquela pedra para ser destruída, ou aquele jatinho de vento para servir de impulso. Há pequenos puzzles contextuais que tornam cada robô útil à sua maneira, e eles são muito bem integrados aos cenários.
Outra coisa legal é que todos os seus robôs são customizáveis e até intercambiáveis: você encontra esquemas para criar novas partes para eles, que melhoram suas estatísticas, bem como melhorar seus Núcleos para deixá-los mais poderosos. Depois de um tempo você pode até colocar o Núcleo de um no corpo de outro o que muda as habilidades e a forma como cada robô se comporta, ainda que isso não seja lá tão útil.
Uma coisa chata é que, depois que você já tem vários robôs, o jogo te obriga a andar com “times” de apenas 2, os outros ficam guardados. Isso não faz sentido e ainda atrasa sua vida, pois invariavelmente vai acontecer de você chegar a um lugar e não ter o robô certo para cumprir determinada função.
Problemas técnicos
Ainda que o feeling de jogar ReCore seja bem legal — explorando masmorras como Lara Croft e fazendo dashes no ar como Mega Man — o jogo está longe de ser perfeito, e chega cheio de problemas técnicos. Os loadings são extremamente demorados no Xbox One — em alguns casos passam de 2 minutos –, o que é muito para um jogo que nem mundo aberto é.
E o que é pior: mesmo com esse tempo todo de carregamento, o jogo entrega um visual bem abaixo da média, com sombras e texturas dignas de um jogo de Playstation 2. O visual desértico é compreensível para a proposta do jogo, mas deixa o visual em si extremamente repetitivo e genérico.
Se acha que estou pegando pesado, olha essa textura/sombra na pedra que coisa mais feia:
ReCore chega ao Brasil 100% em português, e suas dublagens são relativamente boas. Infelizmente, não é possível jogar com áudio em inglês e legendas em português, se mudar o idioma do console até as legendas ficarão em inglês.
Fora isso, espere para ver muitos bugs: em certas escaladas, pode acontecer de Joule “cair do cenário”, ou atravessar elementos do cenário. Também aconteceu de uma área de uma masmorra simplesmente não carregar, e minha Joule ficou presa no limbo. Meu mapa também parou de funcionar mais de uma vez (a tela ficava carregando eternamente)… o que seria bem ruim caso o mapa fosse realmente útil, o que ele não é.
Mas existe algo pior do que problemas técnicos em ReCore. Os…
Problemas de game design
Por mais divertido que seja saltar por plataformas móveis em ReCore, este jogo traz uma “mentalidade” muito ultrapassada de game design, que parece estar ali simplesmente para “esticar” a campanha, que poderia tranquilamente durar menos sem se tornar chata.
Explicando: tudo em ReCore gira em torno dos já mencionados Núcleos Prismáticos. Eles servem basicamente como chaves, permitindo que você interaja com equipamentos e libere passagens para novas áreas. As masmorras opcionais do game lhe concedem Núcleos Prismáticos, mas você também pode consegui-los eliminando certos inimigos raros ou simplesmente explorando o mapa.
A campanha em si é composta de poucas missões principais, e no decorrer dela você mal consegue juntar 15 Núcleos Prismáticos. Os demais poderiam ser simplesmente colecionáveis opcionais para quem busca fazer tudo o que o jogo oferece, certo? Errado: você precisa de um número específico de núcleos prismáticos para abrir certas portas. Só que invariavelmente acontece de você não ter o número necessário de Núcleos para abrir uma porta, o que te obriga a ficar retrocedendo e explorando mais em busca deles.
Pior: a reta final do jogo se passa em uma torre, e para cada novo andar que você vai subir, precisa de mais 5 Núcleos Prismáticos. Você entra nesta torre com 20 Núcleos (o que já dá um bocado de trabalho para conseguir), mas para continuar subindo, terá que ficar voltando ao mapa para reunir nada menos que 45 Núcleos Prismáticos!
Ou seja, depois que você já derrotou o último chefe do jogo, você é obrigado a continuar jogando, e explorando por várias horas simplesmente para coletar itens que até então o jogo dava a entender que seriam meio que opcionais. Se não tiver os 45 Núcleos Prismáticos, você simplesmente é impedido de prosseguir e ver o final da história.
Esta é uma maneira preguiçosa e estúpida de alongar a campanha, e o que poderiam ser divertidos desafios opcionais tornam-se tarefas obrigatórias chatas e repetitivas… e mesmo os combates, que até eram legais, se tornam um fardo quando mais e mais robôs vão “brotando” da areia enquanto você faz todo esse backtracking.
Creio que boa parte dos problemas técnicos do jogo (loadings demorados, texturas ruins e bugs) podem ser resolvidos com patches… agora, game design tosco não há patch no mundo que conserte, e isso é o que mais me incomodou neste jogo. Lembra um pouco a interminável coleta dos troféus do Charada para ver o “final bom” de Batman Arkham Knight, com o diferencial que aqui você sequer consegue terminar o jogo.
Conclusão
Eu planejava terminar o game antes de escrever este review, mas não consegui, simplesmente porque ainda me faltam mais de 15 Núcleos Prismáticos para poder acessar os últimos andares da torre. E eu realmente não sei se vou ter paciência para fazer isso.
É uma pena que um jogo com tanto potencial seja afetado por ideias tão ruins. Apesar das limitações técnicas, ReCore é divertido e seria redondinho se durasse ali umas 8 ou 12 horas. Mas a busca pelos Núcleos certamente acrescenta mais várias horas de jogo, e o que você faz por obrigação nunca é tão legal quanto aquilo que você faz por diversão.
Assim, ReCore segue bem por algumas horas, mas quanto mais você joga — ou é obrigado a jogar — mais chato e repetitivo ele vai ficando. Como eu já disse no review de No Man’s Sky: as vezes menos é mais. A maneira como tentaram “inchar” o jogo para fazer a campanha durar mais é chata e realmente acaba com a empolgação. Uma pena, pois (com o perdão do trocadilho) o Núcleo do game — que é a exploração e– é muito bom.
Se ainda assim você estiver a fim de encarar ReCore, recomendo que jogue sem pressa, e vá coletando todos os Núcleos Prismáticos que conseguir pelo caminho. Se deixar para se preocupar com isso só lá na reta final, a chance de você acabar ficando frustrado e irritado é bem grande.
ReCore está sendo lançado hoje para PC e Xbox One. O game possui dublagens, menus e legendas em português brasileiro.