Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da Escuridão

8 de setembro de 2011

Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da Escuridão

Você que acompanha o blog da Arkade certamente já conhece o game A Luz da Escuridão – ou para mercados gringos, The Light of the Darkness – uma produção brasileira que conta com uma mitologia própria e visual caprichado. Com o perdão do trocadilho, o game é realmente uma luz na escuridão do (ainda) escasso mercado de criação de games no Brasil. O mais novo membro da nossa equipe, Antonio Ribeiro, conversou com Fernando Rabello, o criador do jogo. Rabello nos contou como foi criar o jogo do zero com poucos recursos, e falou também sobre os softwares utilizados, o mercado de games nacional e muito mais! Confira na sequência esta entrevista exclusiva!

Arkade: Fernando, qual é o seu background? Sua formação, experiências, etc. Conte um pouco pra gente.

Fernando Rabello: Bom, eu fiz faculdade de design na UFRJ e Estácio de Sá. Trabalho a muitos anos como ilustrador, designer e com computação gráfica. Eu tenho um perfil bastante autodidata e empreendedor, aprendi computação gráfica por conta própria e tem sido minha principal atividade nos últimos 7 anos. Na maior parte do tempo tenho sido freelancer.

Sempre passei boa parte da minha vida desenvolvendo meus projetos, como o Luz da Escuridão e o Pressão Bizarra . Gosto de trabalhar com pessoas, principalmente quando há uma causa em comum. Gosto de investir no projeto dos outros e gosto quando pessoas se entusiasmam com os meus projetos.

Quanto ao desenvolvimento de games, eu comecei a trabalhar com isso apenas em 2008 e gastei muito tempo de pesquisa, tanto de game design, quanto de técnicas relacionadas com animação, modelagem, texturização e etc.

Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da Escuridão

Arkade: Quando veio a ideia de criar um jogo inteiramente do zero?

Fernando Rabello: Eu sempre quis trabalhar com games e cinema. É uma pena que são duas áreas que não são muito desenvolvidas por aqui, ainda mais no ramo da ficção. Então o que eu vinha fazendo era desenvolver um projeto de universo (chamado A Luz da Escuridão). Criei um conteúdo grande e eu tinha planos de usar em projetos diversos (games, cinema, livros, RPGs, etc).

Em 2008 a Secretaria de Cultura do Estado do Rio lançou um edital que, pela primeira vez, passou a incluir jogos eletrônicos. Vi ali uma oportunidade e inscrevi um projeto de game baseado neste universo. Ganhei o edital e montei uma equipe para trabalhar no jogo. Alguns desses profissionais eu já havia trabalhado antes em outros projetos de games que não vingaram.

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Arkade: Você já havia feito outros jogos antes? E por que preferiu a plataforma Flash?

Fernando Rabello: Eu havia trabalho em alguns projetos que não foram muito longe, na extinta Magus Ludens do Rio de Janeiro. Apesar dos projetos não terem dado certo, foi uma ótima experiência pois eu pesquisei bastante na época.

Eu escolhi a plataforma Flash por uma questão de viabilidade. Primeiro, pois as ferramentas que trabalhamos no Flash são bastante conhecidas e são ferramentas amigáveis para artistas como eu e como os que trabalharam no projeto. Segundo que  não existem muitas engines 2D boas no mercado, então precisaríamos ficar desenvolvendo uma série de ferramentas próprias para o desenvolvimento do jogo, como editor de levels e etc. caso usássemos uma engine 3D. Outro motivo da escolha é a disponibilidade que o flash tem para rodar em várias plataformas. Sem nenhum trabalho adicional o jogo já roda em MAC e Linux e ainda tem a possibilidade de rodar em iPhone e Android com algumas modificações.

Enfim, o Flash viabilizava muita coisa para desenvolvedores como nós e para este tipo de projeto em particular. É uma pena que esta plataforma tenha tanto estigma. É uma ótima plataforma para certos tipos de projetos de games. Não apenas jogos simples, mas também jogos bem complexos. As pessoas tem que abrir a mente quanto isso.

Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da Escuridão

Arkade: O Luz da Escuridão tem uma trama complexa e vários elementos de apoio bem elaborados (língua própria, escrita, etc). Você recorreu à algum consultor em línguas, história, etc para auxiliá-lo ou é tudo fonte da sua inspiração?

Fernando Rabello: Não houve nenhuma consultoria nesse aspecto, apenas pesquisa e muita projetação.  A grande vantagem de ficar desenvolvendo um universo é que você tem tempo para pensar em muitas coisas e assim você elimina muitos furos e vai deixando tudo bem amarrado e complexo.

O idioma Sansico era algo muito importante pois no universo de A Luz da Escuridão,  não existem humanos. Também não existem mitos do nosso mundo como diabo, vampiros, lobisomens, trolls, orcs, unicórnios, nada disso. É um mundo com outras criaturas e outras culturas.

O Sansico visto no trailer não é tão complexo quanto algumas pessoas pensam, e nem tão simples quanto outras acreditam. Atualmente ela é uma pseudo-língua, pois não existe uma gramática/semântica própria ainda, mas sim um processo pelo qual um texto é traduzido para esse idioma.

Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da EscuridãoEntrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da EscuridãoO jogo possui 2 alfabetos próprios: o Sansico Branco e o Sansico Negro.

Arkade: Há quanto tempo o jogo está em desenvolvimento? Quanto tempo você acredita faltar para concluí-lo?

Fernando Rabello: O jogo está em desenvolvimento há uns 2 anos. Mas não continuamente. É importante lembrar que grande parte desse tempo, nenhum dos profissionais puderam trabalhar fulltime devido à falta de financiamento para o projeto que é o nosso principal problema atualmente.

Para terminar o jogo faltaria cerca de 5 a 6 meses, com os profissionais trabalhando fulltime no projeto.

Entrevistamos Fernando Rabello, criador do game A Luz da EscuridãoMapa dos reinos da luz e da escuridão.

Arkade: Sabemos que no Brasil o apoio à indústria de criação de games é muito escasso. Como você está fazendo para custear a produção do jogo? Há alguma forma de subsídio?

Fernando Rabello: O cenário de desenvolvimento no Brasil é extremamente adverso. Conseguir financiamento é uma tarefa bastante difícil por diversas razões. O Brasil é um país com pouco knowhow e que é obscuro para investidores estrangeiros. Falta também uma integração maior entre os desenvolvedores. Falta mais apoio da mídia. Falta existir um movimento.

Mas o Luz da Escuridão vem tendo uma grande repercussão na internet então o caminho que estamos buscando para viabilizar o projeto é através uma campanha em um site chamado Kickstarter.

O Kickstarter é uma ferramenta maravilhosa para desenvolvimento independente de projetos. Em primeiro lugar o público tem que perceber que não são campanhas de doações. Não estamos pedindo caridade. Ao contrário disso, o público investe e tem uma série de recompensas que de outra forma não teria, coisas muito legais, desde ganhar o jogo no lançamento a ter seu rosto imortalizado numa estátua dentro do game, seu nome nas lápides do jogo (sombrio isso, mas é interessante)… coisas que ele jamais teria em “jogos grandes”.

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O público tem que perceber a força que tem. Vemos muito as pessoas reclamando: “poxa, chega de FPS”, “chega de DRM”, “por que a empresa X não produz aquele grande jogo Y?”. O público tende a se sentir muito alienado em relação ao que é produzido por aí, sem ter poder sobre isso, mas ao contrario do que parece, o público tem sim, muito poder. Ele tem o poder de fazer as coisas acontecerem com um esforço mínimo de cada um, cada um fazendo a sua parte. Com sites de crowdfunding como o Kickstarter o público pode fazer projetos de games virarem realidade, projetos independentes, projetos livres, games que o público tem entusiasmo.

No Kickstarter é tudo muito simples, a pessoa escolhe quanto quer investir (desde US$ 1 até o infinito) e escolhe sua recompensa de acordo com o valor que apoiou. O público pode gerenciar seu apoio, aumentando ou diminuindo durante a campanha, da forma que quiser. O projeto precisa atingir uma meta mínima, se não atingir o dinheiro não muda de mãos, ninguém é debitado. Isso dá segurança ao apoiador pois se o projeto não consegue um mínimo, não haveria forma da equipe desenvolver.

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