RetroArkade: Shenmue foi a obra prima de Yu Suzuki e do Dreamcast

3 de agosto de 2014

RetroArkade: Shenmue foi a obra prima de Yu Suzuki e do DreamcastAntes do mundo aberto de GTA e da interação de Watch Dogs, existiu Shenmue. Hora de relembrar os dois jogos de uma série que representa a excelência gamer.

Jogar Shenmue em 2014 é como uma viagem especial ao passado: vários elementos em jogos que são comuns hoje foram feitos pela primeira vez ou tiveram uma atenção especial nestes jogos de Dreamcast: o tempo no jogo que controlam o dia e a noite (semelhante aos Zeldas de Nintendo 64), os Quick Times Events, onde botões específicos devem ser apertados na hora certa e o simples mundo aberto que lhe permite fazer o que lhe dá na telha, no mesmo conceito dos GTAs e semelhantes que vieram depois.

A produção — até então a mais cara de sua época — foi o passo mais ousado de Yu Suzuki, lendário desenvolvedor da SEGA que começou a produzir o jogo ainda para o Sega Saturn, mas com a derrota para o Playstation e a decisão de lançar logo o Dreamcast para melhorar a concorrência — que descobriríamos depois ser uma espécie de último tiro, que infelizmente deu errado — o projeto foi transferido para o 128-bit da SEGA.

Mas será que o Saturn conseguiria com suas limitações reproduzir todas as ideias que veríamos no Dreamcast? Veja você mesmo e tire suas conclusões:

Na minha opinião, não. O Saturn tem sim excelentes jogos em 3D como Nights ou Burning Rangers (duas jóias da SEGA com a mão de Yuji “Sonic” Naka) mas algo mais ambicioso como controle de tempo e a liberdade que o jogo propunha dificilmente seria realidade no 32-bit. Uma curiosidade: no início a ideia do jogo era contar a história de Akira de Virtua Fighter, mas depois mudanças no desenvolvimento transformaram o no Ryo Hazuki que todos gostamos hoje.

Por isso, hora de levar todas as ideias para a “casa nova”. O Dreamcast prometia e cumpria muita coisa em seu quesito técnico, com seus 128-bit na época em que “bit” vendia console, um competente Windows CE gerenciando o sistema e aquela telinha bacana no controle que exibia conteúdo dos jogos se houvesse uma VMU conectada ali.

E vale lembrar que o fim da década de 1990 foi uma era próspera em ideias e novos conceitos. Os consoles da época (N64, PSOne e Dreamcast) recebiam jogos que traziam mais que o “andar e passar de fase”: Metal Gear Solid (1998), Legend of Zelda: Ocarina of Time (1998) e Final Fantasy VII (1997) são alguns exemplos de jogos com muito investimento e muita novidade que impressionou todo mundo na época. Com Shenmue não foi diferente, até porque o investimento foi pesado: 47 milhões de dólares. Se é muito hoje, imagine em 1999.

RetroArkade: Shenmue foi a obra prima de Yu Suzuki e do Dreamcast

“Já são três horas…” Entendedores entenderão.

Quem colocava o GD no Dreamcast podia conferir uma abertura cinematográfica com os gráficos do jogo aonde a história era anunciada: Lan Di, um chefão da mafia chinesa mata o pai de Ryo e rouba um espelho que se chama Dragon Mirror. O protagonista então descobre que existe um outro espelho, Phoenix Mirror. Logo, a missão de Ryo no jogo é: encontrar o Phoenix Mirror, recuperar o Dragon Mirror, descobrir as razões da morte de seu pai e vingá-lo. No segundo jogo, a história continua, mas com Ryo indo até Hong Kong para descobrir mais respostas (e se quiser saber mais, que jogue o jogo!).

A trindade “gráfico-controle-som” impressiona até hoje, especialmente se você é um feliz proprietário de um VGA Box, aparelho que permite ligar o console em entradas VGA (de monitor ou TV) ampliando assim as capacidades visuais do console. Meu Dreamcast funciona na base do S-Video e em uma TV de LCD e garanto que o resultado já é muito bom, Agora, imagine com este aparelho…

Mas com ou sem VGA Box, o visual é muito detalhado, com toda a representação de um Japão/Hong Kong de 1986 e com muita luz, especialmente a noite com as placas de neon iluminando o comércio noturno, como bares e fliperamas. Os personagens não tem aquela textura polida mas convencem com detalhes únicos e mesmo os NPCs não são tão aleatórios assim. Até porque cada um deles tem algo diferente a te dizer.

RetroArkade: Shenmue foi a obra prima de Yu Suzuki e do Dreamcast

Quem curte aqueles filmes de artes marciais dos anos 80 vai curtir demais o visual de Shenmue.

Controlar Ryo também é interessante: embora nunca gostei do fato de não poder usar o analógico para controlar o personagem, tudo o que o jogo propõe funciona bem: explorar a cidade não é chato (embora se torne repetitivo mas por culpa da própria evolução dos jogos que tornaram Shenmue algo primitivo), as lutas são bem feitas e os Quick Time Events também dão conta do recado (embora você passe raiva quando erra alguma coisa).

Falando de lutas, mestres ensinavam golpes novos e eficazes para Ryo. E sempre que quisesse treinar e aprimorar suas técnicas, era só ir para a sua casa e entrar no dojo, onde um empregado da família estava disposto a tomar uns cascudos em nome de seu aprimoramento.

O som então, era demais: sabia a hora certa de transmitir calma e tensão ao jogador. Trouxe todo aquele clima cinematográfico comum da época e contou com algo impressionante mesmo para os dias de hoje: 200 dubladores diferentes colocaram vozes em cada personagem do jogo, seja ele principal, secundário ou apenas um NPC. Cada pessoa do jogo tinha algo diferente a lhe dizer (mesmo que apenas uma frase que se repetia sempre).

Outra coisa legal era que Shenmue podia ser um emulador: na casa de arcade, Ryo (quer dizer, você) pode jogar clássicos da SEGA como Spacie Harrier ou Hang On. Sem mencionar que o “faça o que der na telha” do jogo (que ficou popular em 2001 com GTA 3) te permitia arrumar emprego, fazer favores, ajudar pessoas, comprar refrigerantes, discar a partir de telefones públicos e muito mais.

RetroArkade: Shenmue foi a obra prima de Yu Suzuki e do Dreamcast

Jogo de artes marciais sem artes marciais não tem graça… por isso, LUTEM!

E com o óbvio sucesso de público e crítica, Shenmue 2 saiu em 2001, mas em péssima hora: o Dreamcast já havia sido engolido pelo Playstation 2 e Gamecube e Xbox estavam aparecendo para o público. Os três concorrentes ofereciam o mesmo que o Dreamcast, porém melhor. Tanto é que o segundo jogo chegou nos Estados Unidos apenas em 2002 e para o Xbox original, já com o console descontinuado e a SEGA funcionando apenas como desenvolvedora.

O jogo é ruim? claro que não, pelo contrário. É melhor que o primeiro mesmo não agradando muito a crítica por já sentirem a tal repetição e o fato de que as coisas devem ser feitas de maneira “real demais”, como uma análise da revista EGM. Na análise que aconteceu no fim de 2002 com as notas 6.5, 7.5, 7.0 os analistas diziam que era mais ou menos como “se fosse um jogo em que a Lara Croft tivesse que pegar seu passaporte, fazer as malas e amarrar suas botas antes de fazer a missão”. As conversas “toda hora” também foram motivo de crítica.

Algo que Shenmue 3 poderia evoluir. Porém nunca houve Shenmue 3. Após o alto investimento nos dois primeiros jogos, o fracasso comercial do Dreamcast e a consequente fraca venda de jogos da franquia fizeram com que a trilogia tivesse seu terceiro jogo esquecido. Notícias e mais notícias nos dão a entender que o terceiro jogo pode no mínimo estar nos planos da SEGA, mas se isso é verdade ou apenas um “queria que fosse real” plantado por aí, ainda não sabemos.

http://youtu.be/gBwkVo7logk

O que sabemos é que Shenmue é obrigatório para todo gamer. Sua proposta era ambiciosa demais para a época e deu errado por várias razões (sendo que a maioria delas nada tem a ver com o jogo em si). Mas deixou um legado que nos faz “sentir Shenmue” até hoje. Se você hoje gosta de “rodar o mundo” em GTA, de conversar com várias pessoas como em L.A. Noire e acha o máximo a interação com o ambiente de Watch Dogs, faça a sua gratidão gamer falar mais alto e vá conhecer esta obra prima já!

Junior Candido

Conto a história dos videogames e da velocidade de ontem e de hoje por aqui! Siga-me em instagram.com/juniorcandido ou x.com/junior_candido

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