Análise Arkade: Batman: O Inimigo Interno (Ep. 5) – Same Stitch

31 de março de 2018

Análise Arkade: Batman: O Inimigo Interno (Ep. 5) – Same Stitch

E finalmente chegamos ao final da segunda temporada de Batman: The Telltale Series com o lançamento do quinto episódio, com o título original Same Stitch (ainda sem versão oficial em português até a data da publicação deste texto). Nele, que talvez seja o mais ousado capítulo de toda a sub-franquia do homem-morcego na Telltale, a temporada inteira ganha, de fato, seus contornos mais brilhantes e valoriza as escolhas feitas pelo jogador ao longo da jornada. Afinal, quem será o Coringa daqui em diante? Você decide.

O encerramento do arco que se propôs a apresentar a origem de um dos vilões mais icônicos de todos os tempos da cultura pop soube explorar o potencial das narrativas rizomáticas das quais a Telltale se tornou referência – as vezes, quase um sinônimo. Mais do que nunca, aquela expressão de “Fulano vai se lembrar disso” realmente se mostra significativa para o final da trama. A teoria de que o Batman é responsável direto no surgimento dos seus piores inimigos é colocada em prática aqui de forma sutil, sorrateira e ao mesmo tempo definitiva. O Coringa, seja quem for, é cria do herói.

Análise Arkade: Batman: O Inimigo Interno (Ep. 5) – Same Stitch

O ápice de uma história interativa

Já diz uma das máximas do desenvolvimento de jogos: se o jogador descobrir que suas ações, escolhas e atitudes não fazem diferença, sua imersão está comprometida. Por vezes, os jogos da Telltale tem caído nessa armadilha de deixar explícito que não importa quais os caminhos definidos pelo jogador, visto que qualquer um deles irá chegar no mesmo lugar. Isso é terrível para estruturas dessa natureza, mais do que em qualquer outro gênero.

Felizmente, a segunda temporada da sua versão de Batman – praticamente uma reconstrução da mitologia do homem-morcego e das bases que sedimentam o chamado Bat-verso – consegue fugir disso oferecendo escolhas de fato significativas, algo pouco evidente nos primeiros episódios. Se antes cada diálogo moldava as duas faces do herói – a do vigilante e a do playboy – em uma dimensão mais íntima e pessoal, fica claro no quinto episódio que isso também influencia no que acontece ao seu redor.

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Assim, a trama desta segunda temporada tem um tom muito mais turvo do que a da primeira, onde o que mais importava era saber quem é o vilão, quais suas motivações e quais são as ações do jogador para evitar o pior. Mesmo com a sempre necessária ameaça à população de Gotham, tudo o que mais importa aqui é como se dá cada uma das relações problemáticas não só com o seu principal antagonista, mas também com outros inimigos e aliados. É difícil, pois, manter as aparências e os princípios éticos quando isso muda a vida de tanta gente. É aquela sensação que cada escolha é entre algo ruim e algo pior.

Há ainda muita ousadia em termos de conteúdo. Esse quinto episódio é completamente diferente dependendo das escolhas feitas antes, sobretudo no final do anterior. Ou seja, ainda que dure as costumeiras duas horas, há o dobro disso para quem puder fazer os dois caminhos, algo pouco corriqueiro mesmo em outros jogos da desenvolvedora. É interessante ver que, ao contrário do que foi visto no restante da temporada, o fato de se conhecer os personagens previamente não é tão significativo assim.

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Curioso será ver uma possível terceira temporada se desdobrar a partir de cada um dos caminhos estabelecidos aqui. Não que um impossibilite o outro, nada disso. É possível começar de uma mesmo ponto, já que mesmo quando se converge para um Coringa vigilante, sua personalidade perturbada se mostra evidente e pronta para explodir. Mas mesmo assim, uma trama onde esse passado é relevante pode dar uma boa dor de cabeça para os melhores roteiristas.

Quando narrativa e mecânica se misturam

É fato que em termos de interação – difícil usar o termo “jogabilidade” para uma experiência da Telltale – o jogo não se arrisca demais. Mesmos mecanismos, mesmo sistema de diálogo e mesma dinâmica de ação. Os combates finais são intensos e bem coreografados, bem no estilo QTE, mas pouco apresentam tensão ao jogador. Mesmo o modo de investigação e de resolução de pequenos puzzles sendo diferente, não passa de uma versão bem simplificada da função similar vista na franquia Arkham. Nada surpreendente, nada decepcionante. O bom e velho mais do mesmo.

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De qualquer modo, este episódio não só termina a temporada de forma bastante satisfatória como consegue agregar valor aos anteriores, mesmo em seus piores momentos. Macroscopicamente, há problemas, como a forma como personagens importantes são relegados a coadjuvantes de segundo ou terceiro escalão, enquanto outros são alçados a um co-protagonismo. Sinto falta, por exemplo, de um arco mais consistente para Bane, Mulher-Gato e Senhor Frio, enquanto Amanda Waller ganha peso e Gordon quase cai no esquecimento.

O que fica mesmo é algo que está no cerne dessa versão do universo de Gotham: a dualidade nada antagônica entre Bruce Wayne e Batman. Se a primeira temporada conseguiu estabelecer ambas as facetas de forma muito mais complexa do que outras mídias o fazem, a segunda aprofunda essas relações, inverte expectativas e expande o alcance desse confronto interno, a ponto de muitas vezes pouco importar se o personagem está ou não com seu uniforme. Cada vez mais, ser o Batman significa carregar o fardo de ser também Bruce Wayne. E isso importa.

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Conclusão

Batman: O Inimigo Interno é, sem dúvidas, uma evolução na franquia. Apesar dos deslizes e das repetições, o game consegue expandir o que fora apresentado anteriormente, dando sustentação sólida para o estabelecimento do grande arqui-inimigo do protagonista. Seu quinto episódio, Same Stitch, é o ápice dessa bem embasada estrutura, convertendo para consequências palpáveis tudo o que o jogador passou até chegar lá.

Se por um lado, a fórmula Telltale de se contar histórias pode estar apresentando sinais de esgotamento, há sinais de inovação em termos mais efetivos de causa e consequência. Claro que isso significa elementos mais obtusos no que tange o roteiro e a produção artística, mas ao mesmo tempo, deve agradar e valorizar o investimento pessoal de seu público quando decide se importar com cada decisão, mesmo as mais simplórias e banais. Se mantiver esse caminho, há muito o que vivenciar especificamente quando se deseja ser o Batman.

Análise Arkade: Batman: O Inimigo Interno (Ep. 5) – Same Stitch

Batman: O Inimigo Interno: Same Stitch está disponível para Playstation 4, XBox One, PCAndroid e iOS. Ainda que tenha apresentado um problema na configuração para o português na versão de avaliação desta análise, deve estar logo disponível com localização para o Brasil.

Paulo Roberto Montanaro

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