Um bate-papo sobre os remasters dos três GTAs clássicos em GTA The Trilogy
GTA III revolucionou, GTA Vice City evoluiu e GTA San Andreas consagrou. Estes três games, lançados em 2001, 2002 e 2004, fizeram parte da história dos videogames, por oferecerem histórias de submundo, humor ácido, ideias criativas e, principalmente, um mundo aberto nunca antes visto, em qualquer game de qualquer época.
Cada um tem o seu preferido, mas Claude Speed, Tommy Verceti e Carl CJ Johnson marcaram seus nomes na história dos videogames, tendo seus jogos curtidos e apreciados até hoje. E nestas duas décadas, foram várias as formas de se curtir os jogos, que envolvem os consoles originais, PS2 e Xbox, os computadores, os smartphones e os consoles atuais, com versões atualizadas.
Mas, passados vinte anos da chegada de GTA III, a Rockstar achou por bem relançar, mais uma vez, seus três games que definiram uma geração, com a promessa de melhor qualidade, sem perder a essência. Tal promessa gerou as mais diversas expectativas, que rendeu recepções amigáveis e decepções. De qualquer forma, há alguns elementos que os três games apresentam, que vale a pena conversarmos juntos a respeito.
O 3 em 1 de GTA
Se você joga videogame, pelo menos já ouviu falar de Grand Theft Auto ou, mais provavelmente, de GTA. A franquia, que se tornou gigante em 2001 com GTA III, trouxe uma nova forma de jogar videogame, mais aberta, mais viva, mais irônica e também, mais violenta.
Vice City e San Andreas, além de dois spin-offs que nasceram no PSP, continuaram o legado. Legado este que foi relançado a partir de 2011, para computadores e smartphones. Com o passar do tempo, os videogames também ganharam versões, com o Playstation 4 recebendo o trio através de um programa de relançamentos do Playstation 2.
Já esta “Edição Definitiva“, como a Rockstar apresentou, trata-se da celebração de 20 anos de GTA III e seu legado. É um pacote com os três games, com a promessa de visual remasterizado, chegando ao 4K, desempenho de 60 FPS e melhorias técnicas e de desempenho, com controles readaptados para um formato mais atual, e a adição de troféus e conquistas.
Pelo menos foi isso que a Rockstar prometeu.
Rockstar, filtro não é remaster
Durante todos estes anos, os três clássicos GTAs receberam centenas de melhorias da comunidade, especialmente no PC. Há modificações que melhoram a definição e o desempenho, que adicionam novos carros e até personagens, e que adicionam legendas em português, em uma época em que isso não era tão comum.
Então é possível afirmar que, de certa forma, o jogador dos GTAs clássicos já contava com tais melhorias — extraoficialmente, mas contava. O problema é que este relançamento oficial deu a entender que a proposta da Rockstar era entregar “algo a mais”. E este algo a mais não veio.
Entenda: isso não necessariamente estraga os jogos — afinal estamos falando de três games que foram excepcionais em suas épocas. Porém, as novidades são poucas e simplesmente não justificam o relançamento, o título “Definitive Edition” e muito menos o preço cheio cobrado.
O problema é a preguiça no trabalho, sentida ao jogar os games. Começando pelos controles, que foram apenas remapeados, e não melhorados. As melhorias perceptíveis são mais por causa dos novos controles do que por alguma melhoria por parte da Rockstar. Como exemplo, tanto as missões de Zero, quanto a Escola de Aviação de San Andreas, contam com os mesmos problemas de jogabilidade.
Já o visual, está tudo ok. E quando digo “ok”, quero dizer que a remasterização foi feita, mas sem nenhum brilho. Modificações de fãs já faziam melhor há pelo menos dez anos, que inclusive atualizavam o game corrigindo bugs e erros, o que não ocorreu aqui. Há diversos relatos de bugs, a todo momento. Eu mesmo, em San Andreas, passei muito por uma “ponte invisível”, olha só:
E, para piorar, travadas. Joguei a trilogia em um Playstation 4 e Xbox Series S. E, embora no novo Xbox seja possível escolher o modo desempenho, ainda assim há travamentos em determinadas partes. Inaceitável para um game de décadas passadas. Saints Row: The Third deu uma aula no tema remasterização, transformando o game de 2011 em um game lindo de se ver, com efeitos de luz recriados e correções necessárias.
O som, aliás, é o mesmo de 2001, 2002 e 2004, com aquele “chiado” característico. Normal nestes anos, mas também inaceitável hoje. Ao menos as rádios seguiram intactas, na medida do possível. Mas, nos três games, em todos os momentos, a sensação que temos é a de que lembraram não tem dois meses que GTA III faria 20 anos e correram atrás do prejuízo, fazendo um mínimo, e um mínimo apressado ainda por cima.
O que nos leva a perceber que apenas foram colocados alguns filtros, e que foi lançado assim mesmo. Sem capricho no som, sem melhorias nos controles e sem correções dos bugs — ou mesmo com novos bugs, como o lance da chuva que você deve ter visto por aí.
Em se tratando de melhorias, as legendas em português talvez sejam a melhor novidade para o público brasileiro, cuidado que outras gigantes, como a Bethesda, não se dão ao trabalho de entregar em seus (re)lançamentos.
Tudo isso pelo preço cheio? Aí é que não dá mesmo!
É aí que entra o grande ponto deste desapontamento da comunidade: o preço. Para começar, a Rockstar tirou das lojas as versões anteriores destes games, o que desanimou muita gente. E depois, apresentou a trilogia, desta forma, com todos os problemas e limitações, ao que conhecemos por “preço cheio”.
A (má) ideia de “substituir” os jogos originais por suas novas versões não é novidade — a Blizzard já fez algo do tipo há um tempo –, mas continua não funcionando. Nos PCs, a Rockstar voltou atrás, e está até oferecendo a trilogia original de graça para quem comprou a nova, para compensar o fiasco.
Só para você ter noção de como este preço de lançamento é equivocado: comprei, em 2012, a versão especial de GTA III para iPhone, que contava com algumas melhorias interessantes, para a época, pagando apenas US$ 1,99 (cerca de R$ 5 na época). Tudo bem que foi promoção, mas um game destes, nestas condições, não deveria ser vendido por menos de US$ 10.
E ainda, mesmo que fosse vendido a US$ 10, um respeito maior pelos fãs se faz necessário. Este remaster, que como disse, demonstra ter sido feito de forma apressada, e desconsidera totalmente o amor e dedicação da comunidade — inúmeros fãs tiveram seus mods removidos, quando na verdade deveriam ser chamados para participar de um projeto como esse. Aí sim, teríamos um remaster que honraria seu legado.
Christian Whitehead é um exemplo da união entre marcas e fãs. Passou de desenvolvedor de fan-games baseados em Sonic para o responsável por portar, com muita qualidade, os games clássicos de Sonic para iOS e Android. Seu trabalho foi tão reconhecido, que participaria, posteriormente, de Sonic Mania, elogiado game do ouriço azul que o trouxe de volta a seus dias de glória.
Mas o que temos aqui, infelizmente, é um produto apressado e que não condiz com o legado de três dos games mais influentes da história dos games. E que é vendido a preço cheio, que no Brasil, é impraticável. Como no Xbox o GTA San Andreas está no Game Pass, ao menos desta forma é adequado para matar a saudade do game, relevando seus problemas.
Mas, infelizmente, ainda mais se tratando de alguém que não gosta de falar “compre este ou não compre aquele game”, não consigo recomendar, de nenhuma forma, esta trilogia. Não a este preço. Costumo, em meu trabalho, trazer minhas opiniões para que você, ao ler, tome sua decisão. Mas, com a trilogia remasterizada do GTA, infelizmente, não seria honesto recomendar o game a você. Não neste estado. E não a este preço.
GTA segue sendo uma das séries mais importantes e influentes do mundo dos games. E os jogos que temos aqui, comprovam suas qualidades — e inclusive evidenciam a evolução da Rockstar como contadora de histórias. Porém, estes clássicos mereciam um relançamento à altura de sua importância.
GTA The Trilogy The Definitive Edition está disponível para PC, Playstation 4 e 5, Xbox One, Xbox Series X|S e Nintendo Switch. No Xbox, GTA San Andreas está no Game Pass.