Análise Arkade: The Last of Us Part I, o questionável remake de um jogo excelente
No ano passado, quando começaram a rolar os rumores de um remake de The Last of Us, eu escrevi um editorial explicando as razões pelas quais este jogo NÃO precisava de um remake. Pois bem, como eu não apito nada na indústria, o remake está prestes a sair. Já joguei, e agora vou te contar se ele mudou a minha opinião nesta análise exclusiva!
A história a gente já conhece…
Mas não custa relembar: The Last of Us Part I nos apresenta a um mundo pós-apocalíptico onde um fungo (cordyceps) transformou boa parte da população humana em “zumbis”. Neste mundo, grupos de sobreviventes se viram como podem, e a hostilidade impera.
De início, acompanhamos a jornada de Joel e Tess, que acabam assumindo a missão de “contrabandear” uma garota para os Vagalumes, um grupo que acredita ser capaz de encontrar uma cura para a praga do cordyceps. A garota em questão é Ellie, uma adolescente rebelde, desbocada e muito cativante.
Juntos, Joel e Ellie vão cruzar um bom trecho dos Estados Unidos, enfrentando contaminados e milícias de sobreviventes enquanto vão criando uma conexão que praticamente lhes tranforma em pai e filha. Uma relação que, sem dúvida, é uma das mais lindas e bem construídas que os videogames já nos apresentaram.
Tá, mas e as novidades?
Para ser bem honesto contigo, não tem muitas novidades por aqui. The Last of Us Part I é um “Ctrl C + Ctrl V” do primeiro jogo, com a parte gráfica atualizada. Sim, ele está mais bonito do que nunca — e olha que ele já era lindo –, mas não tem praticamente nada de novo aqui em termos de gameplay, narrativa ou situações.
A jornada é a mesma: você vai passar pelos mesmos lugares, matar os mesmos inimigos e abrir as mesmas gavetas. Até o posicionamento dos itens e colecionáveis é exatamente o mesmo — incluindo as cartas e bilhetes que aprofundam a lore daquele mundo e os pingentes dos Vagalumes.
Por um lado, isso é bom: significa que o remake respeita o material original e mantém a essência da experiência intacta. Mais ou menos como o remake de Shadow of the Colossus, saca?
Por outro, não dá para evitar pensar que perdeu-se a chance de acrescentar algum frescor ao jogo. Nem estou falando de algo muito mirabolante, mas de coisas simples, tipo mexer no posicionamento dos inimigos, para dar novos sustos no jogador: colocar um clicker onde antes não havia nada, ou um baiacu em um momento que outrora era tranquilo. Elementos que tirariam o jogador veterano da sua zona de conforto.
Infelizmente, não há nada do tipo aqui: tanto a campanha principal de The Last of Us Part I quanto o DLC Left Behind (que está incluso no pacote) são exatamente como eram antes. Mais bonitos, rodando em resolução mais alta e com uma taxa de frames mais alta (e constante)… mas com nada de novo além disso. Ah, e é bom avisar os desavisados que o modo Factions, ue era a parcela multiplayer do game, foi simplesmente deixada de fora deste remake, que é 100% single player.
Então não tem nenhuma novidade, mesmo?
Para ser bem sicero, até tem algumas, mas elas são bem específicas, e não alteram em nada a jogatina. Por exemplo: agora, Joel pode quebrar os vidros de certos carros e janelas. Serve para alguma coisa? Não. Se tivessem pelo menos colocado recursos ou colecionáveis dentro dos carros, mas nem isso…
Outra novidade são as bancadas de melhorias de armas, ou, mais especificamente, as animações que rolam nessas bancadas. Agora, podemos ver melhor Joel modificando seus equipamentos. Ele até pega uma “bolsinha de costura” na hora de criar seus coldres. Um detalhe sutil, mas bem charmoso.
Os speedrunners de plantão vão gostar de saber que o jogo agora possui um modo speedrun, que deixa um cronômetro na tela para você ter mais controle sobre o seu desempenho. Já as pessoas que possuem algum tipo de limitação, vão poder curtir o jogo com a excelente variedade de recursos de acessibilidade que vimos em The Last of Us Part II.
E, claro, não podemos esquecer dos recursos do DualSense, que utiliza seus gatilhos adaptáveis e o feedback háptico para aumentar a imersão do jogador. Isso sem dúvida é algo que enriquece a experiência, pois você pode sentir a tensão da corda do arco antes de disparar, ou a vibração frenética do controle durante um confronto ou perseguição.
E já que estamos falando em detalhes, vale a pena ressaltar que o remake aproveita o SSD do Playstation 5 para rodar o jogo de forma praticamente instantânea. Você com certeza lembra que o loading inicial do jogo era bem demoradinho, naquela tela preta com os esporos flutuando, né? Pois bem, essa tela ainda vai aparecer no início das suas partidas, mas você não vai ficar nem 5 segundos olhando para ela. De resto, o jogo flui sem loadings ou telas de carregamento.
Pelo menos o jogo está mais bonito, né?
Sem dúvida. A Naughty Dog recriou todo o jogo em cima da engine melhorada e otimizada de The Last of Us Part II, atualizando os modelos de personagens e tornando o mundo mais vívido e exuberante. Talvez seja impressão minha, mas acho que há até mais plantas e folhagens em alguns lugares, o que fortalece a sensação de abandono selvagem.
A Tess foi a que mais foi impactada pela “cirurgia plástica” da nova geração: seu rosto está bem diferente do que era. Alguns coadjuvantes, como Bill ou Henry, mantiveram seus traços mais semelhantes aos originais. A mudança da Tess causa algum estranhamento inicial, mas logo a gente se acostuma.
Podendo entregar sua obra prima em um hardware mais moderno, os habilidosos artistas da Naughty Dog sem dúvida se esforçaram para deixar o mundo do jogo ainda mais belo. A paleta de cores está mais viva, há mais elementos destrutíveis nos cenários, e os reflexos em poças d’água estão incrivelmente realistas. Bombas de fumaça e explosões também estão muito mais legais. É verdade que as diferenças mais significativas estão nos pequenos detalhes, mas isso sem dúvida contribui muito com o resultado final.
Já falamos da velocidade de loading no SSD e do bom uso do DualSense, mas não podemos deixar de falar de outras questões técnicas importantes. É possível optar por um modo gráifico (que foca no 4K) ou um modo desempenho (que prioriza o framerate). Independente da sua escolha, o jogo está lindo e roda mais liso do que nunca.
Precisava de um remake?
Olha… sinceramente, minha resposta ainda é não. The Last of Us não precisava de um remake. E os motivos ainda são os mesmos que eu mencionei lá naquele artigo do ano passado.
Para começar, ainda é um jogo super recente, e que não ficou “preso” em uma plataforma antiga. É possível jogá-lo no PS3, no PS4 e no PS5. Remakes deveriam ser, antes de mais nada, um exercício de preservação de jogos que, por alguma razão, tornaram-se inacessíveis com o passar do tempo. Não é o caso aqui.
Além disso, o jogo ainda é bem atual, e não envelheceu mal. Suas mecânicas talvez pareçam um pouco duras, mas ele ainda é perfeitamente jogável — e o remake nem faz grandes esforços para melhorar o core do gameplay. O feeling ainda é o mesmo.
E, embora o remake esteja indiscutivelmente mais bonito e rode muito melhor, o primeiro The Last of Us ainda é um jogo incrível visualmente — especialmente em sua versão remasterizada. O salto gráfico do PS3 para o PS5 é muito menor do que aquele que houve do PS1 para o PS3 — onde a diferença era gritante. Antigamente, os personagens eram apenas amontoados disformes de polígonos. Hoje em dia, o que muda são detalhes, texturas.
Por fim, a razão que mais me incomoda é: enquanto refazia seu próprio jogo, a talentosa equipe da Naughty Dog poderia estar criando algo novo! Deixar um estúdio deste porte cuidando de um remake é um desserviço, pois limita a criatividade de uma empresa que entregou alguns dos melhores jogos da família Playstation. Se era pra ter um remake tão fiel ao jogo original, que deixassem nas mãos da BluePoint, que é especialista nesse tipo de trabalho!
Quando a gente para pra analisar, percebe que a Naughty Dog está há 15 anos trabalhando basicamente com duas IPs: Uncharted e The Last of Us. São grandes franquias, jogos incríveis, e tal… mas que tal dar espaço (e dinheiro) para ela criar algo novo, original, sair da zona de conforto?
Conclusão
The Last of Us Part I é um jogo incrível… simplesmente porque o The Last of Us original já era um jogo incrível. Os méritos técnicos deste remake simplesmente não conseguem elevar muito o patamar de uma obra que já estava bem acima da média na época em que foi lançada.
Entendo que esta vai passar a ser a “versão definitiva” do jogo — e sem dúvida os PC gamers vão amar quando este reemake chegar aos PCs… mas esta acaba sendo a única razão pela qual este remake se justifica: chegar a mais pessoas, em uma nova plataforma.
Acho que um jogo deste porte deixar de ser exclusivo é uma coisa boa, mas quando o “melhor” argumento para defender sua existência é uma questão puramente mercadológica — que nada tem a ver com a preservação do jogo, ou com criar uma experiência realmente nova e diferente (como Resident Evil 2 Remake faz) — algo me parece bem errado.
Dito isso — e sei que vou cair em contradição — The Last of Us Part I ainda é um jogaço, e revisitá-lo no Playstation 5, em sua “melhor versão”, sem dúvida valeu a pena. ¯\_(ツ)_/¯
The Last of Us Part I será lançado na próxima sexta, 2 de setembro, exclusivamente para Playstation 5 (futuramente o jogo também chegará aos PCs). O game está 100% localizado para o nosso idioma, e traz diversas opções de acessibilidade.
Agradecemos aos camaradas da Sony Playstation por nos disponibilizarem uma cópia antecipada do jogo para este review.