Faz nove anos desde que Roberto Gómez Bolaños, o Chaves, partiu desta vida para se tornar eterno.
O mais irônico é que a notícia veio, para nós brasileiros, exatamente quando o SBT exibia, como sempre fez por mais de 30 anos, um episódio do Chaves. Roberto Gómez Bolaños, que fez muito sucesso no Brasil como Chaves e Chapolin, havia nos deixado, aos 85 anos de vida, em exatos nove anos atrás. Ele já estava sofrendo muito, por isso, a sua passagem significou, para muita gente, um merecido descanso, por tudo o que fez.
Apesar de Bolaños ter se consagrado (com razão) no Brasil com Chaves e Chapolin, a sua obra é muito maior do que estes dois icônicos personagens. Apenas em Chaves, já podemos observar a sua genialidade, onde construiu um universo único, com pessoas humildes, cada uma com a sua visão de mundo e a sua maneira em sobreviver aos golpes que a vida lhes deram (deixando-os viúvos, solitários, órfãos ou o que fossem), onde mesmo em meio a tanta confusão, conseguem ter amizade e um mínimo de harmonia, quando o episódio permite, claro.
Em Chaves, todos são “órfãos”, afinal. O garoto que não tem pai e nem mãe convive com um garoto que perdeu o pai que “descansa em pança”, e uma garota que perdeu a mãe logo quando nasceu. Interage com um senhor viúvo que faz de tudo para sobreviver, e com uma senhora viúva que perdeu o marido “da alta” e tem que conviver com a “gentalha”. Ainda temos a senhora que nunca se casou, e demonstra angústia por isso, e o senhor rico, que tem dinheiro, mas não a esposa, que apesar de amada, vive ocupada em seus trabalhos. Nas ausências, eles se completam, e isso é só uma demonstração da genialidade de Bolaños.
Podemos citar também o herói que tem medo, mas luta contra ele. Chapolin não tem como maiores vilões o Racha Cuca, o Quase Nada, ou o Tripa Seca. Mas sim o medo, que sempre aparece em sua frente e sempre é derrotado em sua astúcia. Ou Chompiras (Chaveco, para nós), um ex-ladrão (que abdicou da sua vida de roubos em um episódio inesquecível) que mesmo sendo um “zé ninguém”, nos oferece histórias e lições incríveis, com seus amigos Botijão e Chimoltrúfia, interpretada por Florinda Mesa e que é uma das coisas mais geniais que passou pela mente deste gênio.
Praticamente todos os personagens de Bolanõs, com poucas exceções, não tem muito dinheiro. São muito pobres ou, no mínimo, conseguem apenas sobreviver. Mas todos eles, do nobre herói, até a velha valentona, passando pelo velho lobo do mar e o nosso amigo carteiro que evita a fadiga, possuem algo em comum: são ricos em seus corações. Até mesmo contrariados com as dificuldades de viverem juntos, dividem o nada que possuem, e mesmo com as diferenças, um cuida do outro.
Afinal, as pessoas de bom coração devem ajudar seus semelhantes. A vingança nunca é plena, mata a alma e a envenena. Se quisermos ser alguém na vida, que devoremos os livros. E podemos, sem nenhum centavo no bolso, mantermos um sorriso franco e espontâneo.
Bolaños foi um gênio, da mesa quadrada e de todas as mesas. Mais do que as piadas que a gente ri um milhão de vezes delas, e da oportunidade de atuar com atores da mais alta qualidade quando o assunto é fazer rir, o mestre Chespirito, que ganhou este apelido por agir como Shakespeare, foi um gênio do roteiro. Um gênio da construção de personagens. E um gênio na arte de embutir valores, sejam eles diretos ou subliminares, em suas histórias.
Por isso, como um fã não só de Chaves e Chapolin, mas de toda a obra de Bolaños, se eu tivesse um pedido para você que está aqui, celebrando a vida e a obra desta pessoa magnífica, te convidaria a sair da vila e conhecer mais e melhor tudo o que ele construiu. Só de televisão, são 25 anos de muita coisa boa, de ótimas histórias e ótimos personagens. Bolaños também fez história no cinema e teatros mexicanos, e sua biografia, Foi Sem Querer Querendo (que eu recomendo, e muito) só comprovam o quão necessária foi a sua passagem, para o mundo da arte e do entretenimento.
Obrigado por tudo, mestre. Você pode ter certeza que o mundo ficou muito melhor com a sua inteligência, compartilhada com todos nós em formas de ótimas histórias, ótimos personagens e muitas boas risadas. Você “não faz falta”, pois apesar de estar descansando, você continua conosco todos os dias, pois um gênio, quando parte desse mundo, se torna eterno.