Análise Arkade – Far Cry 3: Blood Dragon (PC, PS3, X360): psicodelia retrô bem-humorada

4 de maio de 2013

Análise Arkade - Far Cry 3: Blood Dragon (PC, PS3, X360): psicodelia retrô bem-humorada

Depois de nos aventurarmos por uma ilha paradisíaca repleta de mercenários, lunáticos e traficantes, chega a hora de viajarmos ao futuro, para uma ilha cheia de ciborgues, lasers e dragões de neon. Confira na sequência nossa análise de Far Cry 3: Blood Dragon!

História

Far Cry 3: Blood Dragon não é uma expansão de Far Cry 3. Sua história não tem nenhuma ligação com a história de Jason Brody, Vaas e Citra. O que temos aqui é um game totalmente novo, que aproveita a engine e as mecânicas de Far Cry 3 para nos levar por uma psicodélica viagem no tempo.

E a diversão que esta viagem proporciona depende muito de você jogador, do seu saudosismo e de sua bagagem cultural. Blood Dragon é uma verdadeira declaração de amor da Ubisoft à cultura pop dos anos anos 80 e 90, ou seja, para “entrar no clima” do game é essencial que você esteja familiarizado com esta temática.

Análise Arkade - Far Cry 3: Blood Dragon (PC, PS3, X360): psicodelia retrô bem-humorada

A trama do game se passa no “futuro” de 2007, época em que o mundo vive um verdadeiro caos pós-nuclear, fruto de uma guerra em que os Estados Unidos chegaram a bombardear o Canadá (?!). Neste cenário, assumimos o papel do sargento Rex “Power” Colt“metade homem, metade máquina, inteiro americano” – um badass que deve basicamente dizimar um exército de inimigos que são comandados por um general lunático que tem um plano megalomaníaco para destruir o mundo.

No site oficial do game, temos uma sinopse abreviada que resume muito bem de que se trata o game: “Kill the bad guys. Get the girl. Save the world”. Blood Dragon é exatamente isso. E se isso soa clichê para você, não se preocupe, pois o objetivo aqui é justamente este.

Se pararmos para pensar, esta ideia de “matar os caras maus, ganhar a garota e salvar o mundo” é o cerne de dezenas de filmes e games de ação e/ou ficção científica das décadas passadas. Misturando ação de primeira com tecnologia “futurista” e personagens totalmente estereotipados, o que temos aqui é um FPS que poderia muito bem ser um filme de ação do início dos anos 90.

Jogabilidade

Aqui é onde o nostálgico é deixado de lado em prol da modernidade. As mecânicas de jogo de Blood Dragon são essencialmente iguais às que vimos em Far Cry 3. O que nem de longe é algo ruim, visto que Far Cry 3 é um dos melhores shooters que saiu nos últimos tempos. Aliás, você pode ler a edição #56 das revista Arkade para saber tudo sobre o game.

Análise Arkade - Far Cry 3: Blood Dragon (PC, PS3, X360): psicodelia retrô bem-humorada

Praticamente tudo que Far Cry 3 trouxe de bom está de volta aqui: temos muitas armas e uma jogabilidade sólida e precisa que favorece a experimentação, permitindo que você escolha a maneira como quer jogar e adeque-se a diferentes situações. Os takedowns também estão de volta, mas contam com variações que os deixam ainda mais… “ninjas”.

O layout do controller também é o mesmo, mas mesmo assim temos um tutorial no início… e este é sem dúvida um dos tutoriais mais divertidos que já vimos! Sagazmente chamado “Navegação Militar para Idiotas”, ele mescla instruções óbvias – tipo “olhe ao redor para olhar ao redor” ou “correr é como andar, só que mais rápido” – com propagandas (patrocínio dos Lubrificantes Kobayashi) e comentários mal humorados do protagonista (“me deixe matar alguém!”).

Por ser “metade homem, metade máquina” nosso protagonista pode correr sem se cansar, mergulhar sem precisar respirar, cair de qualquer altura sem se machucar, e por aí vai. Ele também possui um arsenal completíssimo, e isso tudo já de início, sem nenhum tipo de upgrade, ou seja, já de cara temos um personagem que é uma legítima máquina de matar.

Análise Arkade - Far Cry 3: Blood Dragon (PC, PS3, X360): psicodelia retrô bem-humorada

Apesar disso, nosso bravo Colt conta com um olho biônico que substitui a câmera fotográfica de Far Cry 3, permitindo que o jogador inspecione os arredores e marque seus alvos. Para distrair soldados inimigos, saem as pedras e entram dados de RPG (?!), que junto com armas como o icônico arco-e-flecha (agora com um estiloso acabamento em neon), permite que o jogador adote uma postura stealth, mesmo que para nosso personagem overpowered, isso seja mais uma questão de estilo do que uma necessidade.

As missões principais são recheadas de clichês e referências a filmes de ação e à cultura pop em geral, com muitas explosões, bombardeios, mísseis que precisam ser desativados e bases inimigas cheias de computadores com luzes piscantes.

Só para você ter uma ideia, o início da primeira missão é absurdamente igual a uma cena do clássico Predador (até na trilha sonora), enquanto uma missão de caça opcional nos leva para os esgotos (onde temos muitas caixas de pizza espalhadas pelo chão) para caçar tartarugas (?!). Em outro momento, precisamos atear fogo em ovos de dragões utilizando um lança-chamas, uma cena que vai ser especialmente familiar para quem assistiu Aliens: O Oitavo Passageiro (até os ovos são parecidos).

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Por ser um título bem menor que o Far Cry 3 original, não espere por tanta variedade de missões como no game do ano passado. O que temos aqui é um apanhado de missões bastante focadas na ação, todas com muita matança, muitas explosões e muitos tiroteios de armas laser. O jogo pode parecer repetitivo se visto desta forma, mas o fato de não ser tão longo quanto Far Cry 3 (sua campanha dura umas 8 horas) não deixa que ele fique excessivamente repetitivo.

Novidades

Além da óbvia mudança no visual e na temática (falaremos mais sobre isso em breve), Blood Dragon possui outras novidades que o diferenciam do game original. A começar pelos dragões. Estas imensas criaturas parecem dinossauros com detalhes em neon, podem soltar jatos de energia pela boca e pelos olhos, e colocaram ciborgues no topo de sua dieta.

Felizmente, estes dragões enxergam muito mal, de modo que eles utilizam basicamente a audição e o olfato para caçar. Deste modo, você pode mover-se de maneira silenciosa perto deles sem virar o prato do dia. Eles apreciam especialmente o coração cibernético dos ciborgues, que você pode arrancar de suas vítimas e usar de isca para atrair os monstros.

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Outra novidade muito bem executada se faz presente nas animações do protagonista. Como badass que é, Rex Colt tem maneirismos e ações muito bacanas. Cada troca de arma possui uma animação estilosa, e a simples maneira com que ele maneja uma arma mostram que ele é bom no que faz e sabe disso (o jeito como ele empunha e recarrega a escopeta é muito legal). Quando precisa se curar e não tem seringas, Rex também conta com animações bacanas, fazendo exercícios para o punho ou consertando seu braço mecânico. Isso para não mencionar o fato de que há um botão específico para mostrar o dedo do meio para os inimigos!

Temos ainda novidades que trazem certo frescor a elementos já conhecidos por quem jogou Far Cry 3. As bases inimigas por exemplo, estão de volta, e podem ser invadidas tanto do jeito tradicional (desativando alarmes e/ou matando todo mundo) quanto de novas maneiras: que tal desativar o escudo de energia que protege uma base e atrair um dragão para dentro dela, deixando que ele faça o “trabalho sujo” para você?

As missões de caça também estão de volta, mas a bela fauna de Rook Island foi substituída por animais cromados, com olhos brilhantes, linhas em neon e enxertos cibernéticos. Outros desafios opcionais envolvem o resgate de cientistas companheiros da Dra. Elizabeth Darling (uma cientista sexy com um corte de cabelo dos anos 80) e a busca por televisores, arquivos e fitas VHS, tudo isso espalhado por uma ilha que não é enorme como a de Far Cry 3, mas geralmente oferece o mesmo grau de liberdade.

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O sistema de evolução também é uma versão simplificada do que vimos em Far Cry 3. Aqui, temos uma árvore de evolução linear e totalmente automatizada: cada vez que subimos de nível, algo novo é automaticamente liberado, e isso pode ser tanto um quadrante a mais na barra de energia quanto uma nova habilidade passiva para Rex. Não temos a mesma profundidade de Far Cry 3, aqui tudo é pensado para facilitar a vida do jogador e mantê-lo envolvido pela ação explosiva e pela nostalgia.

Visual + Som = Nostalgia

O esforço nostálgico da Ubisoft fica evidente desde o primeiro momento do jogo e merece respeito. Mal o game começa e já parece que ele está rodando diretamente de uma fita VHS (velha e mal gravada), e isso é apenas o começo desta viagem no tempo.

As “cutscenes” são apresentadas na forma de animações parcialmente estáticas (que geralmente ocupam só um terço da tela) e parecem saídas diretamente de um jogo da geração 16 bits.

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Enquanto Far Cry 3 era colorido e ensolarado, com águas cristalinas e campos verdejantes, Blood Dagon é escuro, mas sua escuridão é pontuada com fosforescentes tons de verde, roxo, laranja, azul e cor-de-rosa.

Existe neon em praticamente todos os cantos: nos cenários, nos animais, no traje dos inimigos, no visor das armas. Blood Dragon imagina o “futuro” de 2007 com a mente de um nerd dos anos 80, e faz isso muito bem. Ao mesmo tempo que algumas coisas realmente parecem futuristas, há toda uma aura de breguice multicolorida que não deixa o jogador levar aquilo a sério. Afinal, este não é o futuro de Crysis, é o futuro de Blood Dragon.

Esta paleta de tons escuros manchado de neon berrante vai testar o contraste do seu televisor e possivelmente até cansar um pouco a sua vista. O game ainda conta com um efeito de scanlines permanente, e todos os menus são extremamente simples – letras verdes em telas pretas – , simulando o prompt de comando de um PC velho.

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Para casar com tudo isso, temos um departamento de áudio caprichado. A trilha sonora – assinada por um artista retrô que utiliza o apropriado pseudônimo PowerGlove – é incrível (entenda isso do jeito mais cafona possível), com batidas “eletrizantes” que misturam tecladinhos e baterias com toneladas de sintetizadores.

As dublagens também cumprem seu papel na hora de criar uma atmosfera absurda. O protagonista Rex Colt é (muito bem) dublado por Michael Biehn, ator que participou de alguns filmes clássicos aos quais Blood Dragon presta homenagem, como O Exterminador do Futuro e Aliens. Suas piadas e frases de efeito são tão autenticamente malvadas e forçadas que ele parece uma cria do próprio Duke Nukem.

E conforme você joga, mais referências vão surgindo: jogadores com mais de 20 e poucos anos sem dúvida irão encontrar dezenas de outros easter eggs aqui e ali. É a cultura pop dos anos 80 e 90 salpicada em nomes de armas, títulos de missões, diálogos, conquistas/troféus e diversos outros momentos do jogo.

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Temos coisas óbvias como O Exterminador do Futuro, Duro de Matar, Fuga de Nova York e Aliens, mas algumas referências são bem mais sutis. Nem vamos listá-las aqui, pois identificá-las no decorrer da aventura corresponde a uma grande parte da diversão que Far Cry 3: Blood Dragon oferece. E não pense que o jogo vai te ajudar: a Ubisoft levou sua piada tão a sério que em nenhum momento somos avisados das referências. Elas simplesmente estão lá, esperando para serem descobertas.

A coragem da Ubisoft

A Ubisoft é uma produtora que vem conquistando cada vez mais espaço no mercado, e não é para menos: ela é uma empresa que parece não ter medo de ousar, pois virou de pernas para o ar um de seus maiores sucessos recentes apenas em prol da nostalgia e da diversão.

Blood Dragon é praticamente um mod oficial de Far Cry 3, e são pouquíssimas as empresas que tem coragem de alterar tão drasticamente suas franquias de sucesso. Repare que, enquanto outras empresas lançam apenas mapas e arenas multiplayer para seus shooters consagrados, a Ubisoft se deu ao trabalho de criar um jogo totalmente novo. Você imagina a Activision fazendo algo assim com Call of Duty, ou a EA com Battlefield? O máximo que elas fazem é meter uns zumbis aqui e ali, e olhe lá.

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E isso não é tudo, pois estamos falando de um título (pasme!) totalmente single player, sem absolutamente nenhum elemento multiplayer. Se para muitas empresas lançar um jogo sem multiplayer hoje em dia é inconcebível, imagine só fazer isso ao mesmo tempo em que transforma um game de sucesso em uma viagem psicodélica de neon?

E não é só por isso que Blood Dragon é ousado: muito de seu humor sarcástico tira um sarro de convenções que já são praticamente universais no mundo dos games. Frequentemente Rex questiona com ironia o fato de ter que abandonar sua missão de salvar o mundo para coletar tranqueiras aleatórias (no caso, televisores ou fitas VHS). Ora, mas coletar coisas não é o que fazemos em quase todo jogo desde que os videogames foram inventados?

As conversas que Rex e Darling mantém pelo comunicador também são ótimas, envolvendo críticas sociais exageradas e comentários jocosos sobre diversos assuntos, até mesmo sobre a violência nos videogames. Nas palavras da Dra. Darling: “nenhum estudo conseguiu provar a correlação entre videogames e violência. Na verdade, qualquer um que pensa que videogames nos fazem mal é um babaca de m*rda”. Alguém aí discorda dela?

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Outro ponto que recebe suas alfinetadas é o patriotismo norte-americano, que no game é exagerado a tal ponto que (conscientemente) extrapola os níveis do ridículo. Considerando que tudo isso vem de uma produtora francesa, deve haver algo mais do que humor nestas piadas…

O já mencionado tutorial pode até parecer engraçadinho, mas se pararmos para pensar, será que ele não é uma crítica à facilidade dos jogos atuais, que “pegam o jogador pela mão” desde o início e não nos deixam correr riscos? Em dado momento, o tutorial até nos oferece o “pacote premium” (ironia com os famigerados DLCs?), que promete fazer nada menos que jogar o game pela gente!

Fica a dúvida se estes momentos devem ser encarados realmente como crítica ou apenas humor nonsense (ou ambas as coisas), mas, independente do real objetivo, uma coisa é fato: Far Cry 3: Blood Dragon mostra que a Ubisoft tem culhões para fugir das tendências, abusar da criatividade e confiar na inteligência do público. Nem todas as piadas funcionam (as das telas de loading forçam a barra), mas no geral, o bom humor do game oferece boas risadas… e muito mais nas entrelinhas.

Conclusão

É difícil dizer o que um gamer mais jovem vai achar deste jogo, visto que, para quem não possui certa bagagem cultural (e certa idade), Blood Dragon sem dúvida pode parecer estranho – talvez até um pouco bobo – com seu visual carregado, sua trilha sonora fora de moda, sua história clichê e seus personagens estereotipados.

Porém, se você vivenciou as décadas de 80 e 90, assistiu a alguns bons filmes de ação e ficção científica e – acima de tudo – gosta de se divertir jogando videogames, com certeza vai encontrar muita diversão com Blood Dragon.

E o melhor é que tudo isso custa somente 15 dólares/30 reais/1200 MS Points, e chegou totalmente legendado em português nas redes PSN, Steam e Xbox Live!

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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