Análise Arkade: Thumper é ritmo, adrenalina e intensidade!
O gênero de jogos de ritmo sempre foi marcado pela noção de que a música é fator fundamental. Seja pelos jogos de dança, que se tornaram muito populares em shopping centers nos anos 1990 e nas salas de casa nos anos 2000 com o advento e a popularização dos controles por sensor de movimento; seja pelos jogos baseados em bandas e instrumentos musicais, notadamente a partir da febre Guitar Hero e similares que foram surgindo até saturarem o mercado; pouco se ousou em termos estéticos e mesmo de jogabilidade dentro desse seguimento.
Hoje, ainda que ambas as vertentes continuem recebendo novos títulos e mantendo um público bastante sólido, estão longe do auge de sua popularidade e de repercussão. Também pudera: se analisarmos friamente o primeiro e o último título das franquias mais longevas, quase não se nota diferenças realmente significativas. A inovação que marcou o surgimento destes jogos também os tornou reféns de suas próprias definições e repetições.
Esta introdução só nos dá uma perspectiva pela qual Thumper, jogo independente produzido pela Drool e que chega em 2016, surge como um fato novo, uma experiência inovadora dentro de um gênero estático há anos e que consegue não só se apropriar de seus principais conceitos como também fugir de seus clichês paradigmáticos e se tornar uma experiência imersiva única.
Começando pelo começo
Thumper está, portanto, dentro do gênero rítmico. E ao mesmo tempo é algo completamente novo. Conceitualmente, o jogador assume um besouro futurista guiado em um trilho e que, dentro de um universo absolutamente abstrato, deve superar obstáculos ao ritmo de uma batida eletrônica pesada e completamente inebriante. Ainda que beba de outras fontes, e facilmente se pode reconhecer influências de jogos como Amplitude, tudo aqui parece trazer um saudável frescor.
Quando se pensa em um jogo de trilho, não é difícil de lembrar de experiências mais clássicas como as fases de cavernas de Donkey Kong ou a icônica fase das motos de Battleatoads, ou ainda alguns dos mais conhecidos infinity runs disponíveis até mesmo de forma gratuita nos diferentes sistemas atuais. Fazendo um esforço, dá até para lembrarmos do Hugo, jogado pelo telefone em programas de televisão. De certa forma, a relação existe e é bastante clara, mas novamente não é suficiente para entender a proposta desse jogo.
Mais do que um jogo de gênero, portanto, é fundamental entender Thumper como uma proposta de experiência que busca nas mais diversas fontes referências e conceitos, sem se limitar a repetir modelos. Uma proposta inovadora que não se arrisca tanto, mas que consegue trazer uma sensação de já vi e ainda não vi algo parecido. Talvez seja a melhor sensação que um jogo queira causar.
Audiovisual
Thumper é visualmente muito bem conceituado. Consegue trazer uma sensação futurista e ao mesmo tempo completamente clean. Trabalha com sistemas de reflexo metálico tal como parecia ser o sonho dos desenvolvedores quando o 3D surgiu já no final dos 16 bits e, principalmente, na geração seguinte. Ao mesmo tempo, foge de uma estética Transformers onde parece que quando mais peças independentes, melhor. Ao contrário. Tudo parece muito mais próximo do visual limpo do T-1000 de O Exterminador do Futuro 2 – O Julgamento Final.
Ao mesmo tempo, esse visual modernista e conceitual nos remete a coisas como Tron: O Legado. Há um trabalho totalmente psicodélico na ambientação que flerta com um surrealismo um tanto quanto hipnotizador. Os movimentos fluidos do ambiente e a construção em tempo real de túneis, passagens e obstáculos remete a uma aventura espacial, mas não um realista como em Star Wars, mas próximo das sensações do trecho final de 2001 – Uma Odisséia no Espaço.
Agora perceba: comecei o texto falando sobre Thumper poder ser tratado como um jogo de ritmo. Pois bem… dentro de toda essa referenciação transcendental, o jogo se pauta quase que instintivamente pelas batidas metálicas fortes de precursão, um ritmo eletrônico que está lá não só como ambientação, mas sim marcando a ação e, muitas vezes, a reação do jogador. A música abstrata não lhe convida a acompanhá-la como em jogos musicais convencionais. Ela quase que o seduz instintivamente.
Toda essa sinergia estética tem um certo custo. O jogo acaba se tornando intenso demais, principalmente por conta da dificuldade elevada e crescente. É nítido que o game exige bastante e acaba se tornando um tanto quanto cansativo por sempre elevar o jogador a um estado catártico que, inevitavelmente, carrega na adrenalina e a mantém em níveis altos o tempo todo, sem muito espaço para relaxamento, a não ser pelos parcos espaços de descanso dentro das fases que só alimentam esse estado de tensão.
Assim, que fique claro: Thumper é antes de mais nada um deleite audiovisual, feito para sistemas de som potentes e para se jogar em uma sala escura. Tem um visual incrivelmente moderno sem firulas e uma violência estética, se assim podemos chamar, que premia o jogador que se propõe a altos níveis de tensão, mas que deve ser apreciado moderadamente. Uma viagem alucinante que consegue flutuar entre o conceitual e o físico, entre o sofisticado e o simples. As vezes, você pode até ter um barato mental, se é que isso existe.
Jogabilidade
Em termos de controle, Thumper não poderia ser mais simples. Como dito, a experiência se baseia nesse besouro mecânico em alta velocidade em um trilho, cuja ação do jogador se resume em reagir a certos eventos ritmados, bem como realizar manobras para evitar ou se aproveitar de obstáculos que surgem no caminho até que, enfim, poderá encontrar o grande chefe final da fase. Aliás, aproveitando a oportunidade, o jogo é dividido em 9 fases, cada qual responsável por apresentar uma nova funcionalidade que será o tema principal dela e que será incorporado às fases seguintes.
Portanto, a dificuldade do jogo cresce a medida em que se avança dentro dos setores de cada fase – são 23 em cada uma delas – de duas maneiras: a primeira é que há o aumento gradativo e constante de eventos, como curvas, obstáculos, saltos e desvios; e a segunda é que essa variedade vai agregando cada nova funcionalidade apresentada em um ritmo cada vez mais intenso. Thumper não cria aqueles momentos de relaxamento, nem permite que o jogador se sinta confortável demais. Mesmo o elemento mais simples aprendido na primeira fase pode acabar com a jornada num piscar de olhos.
Nesse ponto há a possibilidade de uma certa frustração, já que a curva de aprendizagem exigida pelo jogo é algo bastante íngreme: cresce rapidamente e as vezes exageradamente a ponto de criar um abismo entre o domínio em uma fase e o fracasso na fase seguinte. A recompensa ao esforço e a aprendizagem é quase que ignorada quando o jogo está o tempo todo, de forma violenta e impactante, lembrando que a cada curva tudo pode acabar.
Obviamente que a possibilidade de voltar e jogar novamente cada uma das fases vencidas é um elemento fundamental para que o jogador possa se aprimorar, além de buscar sempre a excelência, a superação de pontuação e a perfeição do ranking S de cada setor. Mesmo assim, alguns saltos são grandes demais e podem desmotivar, principalmente pela forma como o jogo exige do jogador a ponto da exaustão física e mental.
A questão fundamental é que aqui há o ápice do conceito básico dos níveis de dificuldade da teoria dos jogos: fácil de aprender, difícil de dominar. cada movimento parece fácil quando apresentado, algo divertido a ser explorado. Menos de 15 segundos depois, aquilo já pode se mostrar o novo pesadelo do jogador quando em conjunto com tantas outras respostas rápidas a serem dadas. Desafiador, com certeza. Exigente até demais. Veja o gameplay da primeira fase que gravamos pra ter uma noção:
Conclusão
Thumper é daqueles jogos conceituais e abstratos que nos lembram da essência clássica dos games de ritmo, que exigem ação rápida, instinto de sobrevivência, necessidade de superação de limitações e de obstáculos, busca pela perfeição e aquela pitada de engajamento pela experiência. Um jogo que abusa de elementos de ação e de uma estética psicodélica e que mantém um nível alto e constante de tensão.
Se há algo a se apontar como problema é que o jogo acaba se tornando longo demais exatamente pela sua proposta mais conceitual. A experiência deixa de ter aquela sensação de unicidade quando parece se estender demais, exigindo do jogador um nível de desgaste que em nada perderia com um jogo mais curto e objetivo, já que ele acaba exigindo muitas vezes a mesma coisa. Há ainda alguns probleminhas que poderiam ser evitados pelo excesso, como o jogador perder a referência visual dos obstáculos por uma fração de segundos quando atingido, mas é algo que em nada influencia na experiência.
Disponível para PCs e Playstation 4, o jogo parece ter um potencial ainda mais alucinógeno para o PSVR e o Rift. Para quem tem estômago fraco, talvez não seja uma boa pedida. Para os demais, a recomendação é para jamais tentar aproveitar Thumper com som baixo ou com muito movimento a volta. É algo a ser apreciado com o máximo de atenção visual e sonora, quando então o jogador poderá sentir a força do ritmo e a sinergia visual.
Thumper foi lançado no dia 10 de outubro.