Além do Review Arkade: 99Vidas O Jogo é uma declaração de amor aos beat ‘em ups de antigamente
Em pleno ano de 2016/2017, eis que chega um jogo que parece saído diretamente dos anos 90. E o que é melhor: um jogo 100% brasileiro! Vamos falar um pouco sobre as referências e homenagens de 99Vidas O Jogo ao universo dos games?
Antes de mais nada…
Gostaria de relembrar aos interessados que já temos um review “tradicional” do game, feito com base na versão PC, que foi lançada no finalzinho do ano passado. Esta semana tivemos a oportunidade de rejogar o game na família Playstation — ele é crossbuy PS4, PS3 e Vita — e este texto não é um simples review, mas um artigo mais carregado de “feeling”, afinal, este é o intuito da Além do Review.
Então, se quiser conferir nosso review “tradicional” de 99Vidas O Jogo é só clicar aqui. Pode ir lá, eu espero. 🙂
Um jogo cheio de referências…
Esta semana eu tive a oportunidade de bater um papo com o Marivaldo Cabral, CEO e produtor da QUByte Interactive, que é a responsável pelo jogo. Na entrevista, eu perguntei ao Cabral quais eram seus beat ‘em ups favoritos e quais foram os games do gênero que mais influenciaram o 99Vidas.
Segundo ele, “a maior inspiração para o 99Vidas é sem dúvida Streets of Rage e também o Scott Pilgrim Vs. The World“. Aliás, este é apenas um trechinho de um papo muito bacana sobre a produção do game e a indústria brasileira de jogos, se quiser ler tudo, clica aqui e boa leitura.
Pois bem, eu também adoro estes dois jogos, e é fácil notar que há muito deles aqui, e não falo apenas do visual e do gênero “briga de rua”, mas de diversos elementos audiovisuais que tornam este jogo uma verdadeira carta de amor aos beat ‘em up de antigamente. O visual fala por si só: uma pixel art estilosa e colorida da melhor qualidade, animações divertidas e um capricho em cada detalhe que não deve nada aos jogos gringos.
Para começar, temos um chefe que, ao irritar-se, assume a forma de um grandalhão com visual 8-bit que é uma óbvia referência ao Abobo, vilão clássico da série Double Dragon. Há ainda a clássica fase de elevador — indispensável neste tipo de jogo — e muitas referências a games como Mega Man, California Games, Battletoads, Final Fight, Mortal Kombat e muitos outros. Não vou entregar tudo aqui, pois identificar as referências faz parte da diversão nostálgica que o game entrega.
E também cheio de “brasileirices”
Mas essas referências qualquer gamer que se preza vai pegar enquanto joga. É naa “brasileirice” que 99Vidas se destaca, especialmente para nós, brasileiros, que sabemos como é a vida por aqui. O início da primeira fase já deixa bem claro o capricho dos desenvolvedores, que recriaram uma típica rua de subúrbio brasileira, com direito a chinelos de dedo pendurados em fios de luz e locadoras de games no background!
Assista nosso gameplay abaixo, onde temos a intro + a primeira fase completa + uma fase bônus, confira:
Quando entramos em uma dessas locadoras, vemos mais um pouquinho desse nosso Brasil simples e querido nos pequenos detalhes do cenário: há canos pingando e tomadas em curto-circuito, detalhes que são tão típicos de uma locadora pequena, de bairro, daquele tipo onde falta grana, mas sobra diversão. E por falar em falta de grana, ao final de uma fase os heróis entram em um ônibus para seguir adiante!
A cultura brasileira está evidente em diversos momentos do jogo também nos diálogos: há legendas em português (claro) e os personagens usam termos como “arriégua”, “dá carrinho não” e “é nóis”, só para citar alguns. Inimigos tem apelidos jocosos como “Cheiroso” e “Tetinha“, algo que provavelmente é piada interna do podcast, mas que remete direto ao bullying que todos nós conhecemos na escola. Em diálogos com chefes, rolam piadas e referências gamers, e há até um pouco de metalinguagem, quando os heróis percebem “o tipo de jogo” no qual eles estão:
E isso é só uma palhinha do humor e das referências presentes aqui. Quem acompanha o podcast 99Vidas sem dúvida vai identificar dezenas de piadas internas e referências às histórias que os caras contam por lá, o que aumenta ainda mais o apelo do game junto aos fãs.
Música, nostalgia…
O Cabral disse que Streets of Rage foi uma das maiores influências do game, e ele não estava brincando: o clássico da Sega é um dos games mais fáceis de identificar referências aqui, e a música é uma das que fica mais evidente. As batidas eletrônicas marcantes de Yuzo Koshiro são homenageadas o tempo todo, em melodias que reiventam elementos que soam familiares, mas estão inseridos em composições novas e originais muito boas.
O fato dos podcasters terem emprestados suas vozes para seus respectivos personagens também é muito bacana, e eles soltam bordões que serão facilmente reconhecíveis pelos fãs. Caso você jogue no PS4, só recomendo que abaixe um pouco o volume do alto-falante, pois as vozes que saem dali são bem altas. De resto, os sons de gritos, socos e pontapés é exagerado e old school como tem de ser!
E pancadaria
Não há muito o que falar do gameplay em si, que é imediatamente familiar para qualquer pessoa que já jogou um beat ‘em up na vida: temos botões de soco e chute que podem ser combinados para formar combos, bem como agarrões e ataques especiais — por serem “Os Guardiões das 99Vidas“, os protagonistas têm poderes elementais. Também temos uma lojinha onde pode-se comprar novos ataques e power ups.
Acho que o gameplay tem alguns probleminhas pentelhos, como o fato de sermos praticamente “obrigados” a usar um especial que consome um pouco de vida para escapar de combos inimigos. Há duas batalhas contra chefes que são meio chatinhas, mas no geral o game flui numa boa, as mecânicas são simples e totalmente familiares.
Falando nisso, a dificuldade também é condizente com os games de antigamente, e passar pelas 6 fases (+ 2 fases bônus) é bem mais desafiador do que parece. Curiosamente, em um jogo chamado 99Vidas não temos 99 vidas, mas apenas 5 — e é claro que rola uma piadinha com isso já no início da campanha. Também não há continues, mas felizmente é possível comprar mais vidas, e também pode-se escolher as fases, depois que você já acessou-as pelo menos uma vez.
Multiplayer e extras
Jogar “de galera” é algo inerente ao gênero — quem não lembra dos saudosos arcades para 4 players de jogos como Tartarugas Ninja e Cadillacs & Dinosaurs — e a QUByte nos trouxe multiplayer para até 4 jogadores tanto local quanto online. Começar uma partida online é um pouco estranho: não há como simplesmente convidar amigos, é preciso criar uma sala (com senha, se preferir) para que eles entrem, e, em caso de Game Over, o jogo simplesmente desconecta todo mundo. Mas, fora isso, a jogatina em grupo rola de boa tanto online quanto offline.
Um detalhe curioso é que existem até troféus para situações específicas que só quem realmente é fã vai sacar. Por exemplo, você ganha um troféu se zerar o game jogando em co-op com um casal… mas tem que ser o casal MESMO, o personagem e sua respectiva companheira da vida real. Eu e um colega zeramos o game jogando de Izzy e Hanna… mas a Hanna não é a namorada/noiva/esposa do Izzy na vida real, então a gente não ganhou o troféu. Foi meio triste, mas se você conhece os respectivos cônjuges de cada personagem, vai se sair melhor que a gente.
Além da campanha propriamente dita, temos outros modos de jogo: o Sobreviva é aquele famoso “sobreviva o máximo que puder”, e há também um modo Versus para quem quiser sair na mão com os amigos. Há um total de 11 personagens jogáveis, e destravar todos dá um bocado de trabalho. Vale lembrar que os fãs e backers do projeto contribuíram com artes que ilustram uma simpática galeria, que também conta com artes conceituais.
Conclusão
Admito que, como fã de games, sinto uma pontinha de “inveja branca” dos caras do 99Vidas. Imagina que louco: você é fã de games e acaba se tornando um personagem do seu próprio game?! E o fato do jogo ser 100% brasileiro e ter este nível de qualidade só aumenta ainda mais seu valor, e mostra que há, sim, bons jogos nacionais despontando no mercado.
É engraçado ver reclamações de coisas tipo “muitos inimigos iguais na tela” quando esta é uma característica tão essencial dos jogos dos anos 80 e 90. Ok, naquela época o reaproveitamento de skins era para economizar espaço na memória limitada dos cartuchos, mas aqui o repeteco é condizente com a proposta de um jogo que se esforça para ser uma grande homenagem aos beat ‘em ups que tanto amamos.
Se você curte o podcast 99Vidas, nem preciso dizer que o jogo tem tudo para te agradar. Mas mesmo quem cresceu jogando fliperama, Mega Drive e Super Nintendo e nem sabe quem são Bruno, Jurandir, Evandro e Izzy vai poder se divertir aqui. 99Vidas O Jogo é, antes de mais nada, um beat ‘em up “de raiz” que tem muita qualidade. E ainda faz isso com um “jeitinho brasileiro” que é raro de se ver por aí.
99Vidas O Jogo está disponível para PC, PS4, PS3 e PS Vita. Aproveite e leia nossa entrevista com o produtor do game!