Análise Arkade: Another Crab’s Treasure é um inusitado e divertido Souls-like submarino
Os Souls-like, apesar de terem seus próprios mundos e estéticas, normalmente possuem um elemento em comum em termos de enredo, mas principalmente em forma visual: Um mundo decaído e um poderoso reino medieval em colapso, e uma atmosfera sombria. E então, temos Another Crab’s Treasure, um Souls-like com uma estética totalmente oposta a isso, mas que mantém as características citadas!
Vamos então conversar sobre esse game, que sem dúvida alguma é uma das grandes surpresas de 2024!
Explorando o fundo do mar em busca de sua casa
Another Crab’s Treasure começa de forma bem leve. Acompanhamos o pequeno caranguejo-eremita chamado Kril, que vivia em sua tranquila solidão numa praia, longe de tudo e de todos. Até que, sem mais nem menos, um tubarão de brinquedo aparece, rouba a sua concha e diz que, se o pequeno Kril a quiser de volta, deverá pagar a taxa de proteção para a Duquesa, uma autoproclamada monarca que surgiu e decidiu que era a soberana de tudo.
Sem ter o que fazer e desprotegido sem a sua concha, o pequeno Kril desce até o fundo do mar em busca de de sua casa, descobrindo que o mundo no fundo do mar está muito diferente do que deveria ser, por dois motivos: O primeiro é que muitos animais, especialmente caranguejos, parecem estar sofrendo de alguma doença, que os torna violentos e incapazes de pensar direito. E o segundo é que todas as criaturas do fundo do mar agora cultuam o lixo, acumulando-o e considerando-o como riqueza.
Assim, a aventura de Kril para recuperar sua concha começa de forma simples, mas logo se transforma numa verdadeira jornada que envolverá todos os habitantes da região em que se encontra, com o início de uma busca por um tesouro lendário, além do crescente mistério e perigo do “grude”, uma gosma escura que está corrompendo as criaturas submarinas e transformando-as em monstros violentos.
E não apenas isso, mas o game explora temas como a poluição dos oceanos, principalmente a proliferação de microplásticos, de forma bem interessante, além de explorar temas como morte e até senso de pertencimento conforme a aventura avança. O que começa como um game bonitinho e engraçado fica profundo bem rápido!
Um “Souls-lite” submarino
Como já falei em várias outras reviews, fazer um Souls-like é algo que na maioria das vezes acaba não dando muito certo, pois muitos estúdios tentam simplesmente copiar o estilo da Fromsoftware e adicionar recursos que resultam num nível de dificuldade artificial, que independe da habilidade do jogador, baseando-se somente em mecânicas, muitas vezes quebradas.
Another Crab’s Treasure, felizmente, não é um desses games. Ele aproveita as bases desse subgênero e constrói algo próprio e que funciona, o que deixa tudo muito mais envolvente e divertido. Para começar, não existe barra de stamina aqui, você pode correr e atacar livremente. O game puxa inspiração direta de Dark Souls e não esconde isso, mas seu gameplay puxa bastante de Sekiro, o que cria um resultado interessante.
Você possui apenas uma arma no game, um garfo, que pode ser melhorado através de um ferreiro. Esse garfo possui combos padrões, com você podendo aumentar o número de ataques (falarei disso mais tarde), mas mantendo-se no mesmo estilo. A grande diferença aqui é o uso de conchas diferentes. Talvez você já tenha visto fotos ou vídeos sobre isso, mas os caranguejos-eremitas possuem partes traseiras maleáveis, sendo seus pontos de maior vulnerabilidade. Assim, eles utilizam conchas como forma de proteção, trocando-as conforme crescem. E, em tempos recentes, alguns chegaram até a usar lixo dos mares e praias como conchas.
Kril faz a mesma coisa, você pode utilizar vários tipos de lixos que encontrar como conchas, que servem efetivamente como escudos, e com cada uma possuindo uma habilidade diferente. As conchas possuem durabilidade, assim, se você usá-las para defender ataques, não sofrerá danos, mas a resistência da concha diminuirá até que ela quebre.
As habilidades especiais variam bastante, permitindo muitas estratégias diferentes. Por exemplo, usar uma casca de coco como concha permite que você gire como o Sonic e dispare a toda velocidade para frente, atropelando inimigos. Usar a habilidade de um potinho de leite fermentado recupera sua vida gradativamente. Um copinho de dose tem baixíssima resistência, mas você pode ativar uma habilidade que cria espinhos de vidro que, quando atingidos, causam dano a inimigos. Latas de refrigerante criam bolhas que perseguem e causam dano em inimigos, e por aí vai.
E, por fim, há a evolução de Kril, que acontece de três formas: A primeira é usando microplásticos como as “almas” de Dark Souls. Elas são usadas para comprar itens e para subir de nível, melhorando os status do caranguejinho. Aliás, se você morrer, todos os seus microplásticos ficarão no local de sua morte, junto de sua última concha. Se você morrer antes de recuperá-los, os perderá para sempre. E a segunda forma é usando cristais de Umami, que você encontra pelos cenários e ao matar inimigos com olhos brilhantes. Esses cristais são usados para desbloquear habilidades novas e ataques especiais, quase da mesma forma que em Sekiro. É possível desbloquear mais ataques com seu garfo, habilidades como parry, esquiva e riposte e por aí vai.
Another Crab’s Treasure, por ser um Souls-like, obviamente demanda habilidade, pois é um game difícil. E lutar contra dois ou mais inimigos ao mesmo tempo é bem perigoso. Mas o game é fácil de aprender e bem amigável graças ao uso das diferentes conchas, que estão espalhadas por todos os lados.
E não há como escrever uma análise de um Souls-like sem falar de sua dificuldade. Felizmente, o game não possui dificuldade artificial. O jogador não vai morrer por conta de mecânicas mal construídas ou limitações intencionais. Os inimigos são inteligentes, e não vão simplesmente correr para frente só para serem atacados. Eles flanqueiam e identificam quando o jogador usa um item de cura, aproveitando esses momentos para atacar.
A maioria dos inimigos é resistente a golpes, isso significa que, se um inimigo é do mesmo tamanho ou um pouquinho maior que Kril, será bem difícil quebrar suas posturas e cancelar suas ações com seus ataques. Mas é possível fazer isso ao usar ataques fortes ou, dependendo do inimigo, usar seu anzol para remover suas armaduras.
Quase que um Souls-like do Bob Esponja
Another Crab’s Treasure tem um visual fortemente inspirado em desenhos animados, principalmente Bob Esponja, o que é bem visível em seus cenários e nas cores usadas, que são bem vivas e intensas. Inclusive, o game presta homenagem diretamente a Bob Esponja, Dark Souls e outras obras, como Cult of the Lamb, com skins diferentes para Kril. Você pode encontrar enquanto joga skins do Sr. Siriguejo, do Solaire, e até do Cordeiro!
Em termos de cenários, o game lembra um pouquinho de Dark Souls II e Elden Ring. A maior parte das diferentes áreas do game são lineares, com diversos atalhos que você pode desbloquear enquanto explora. Mas há uma área central aberta e enorme, que lembra vagamente a parte aberta da DLC Crown of the Ivory King de Dark Souls 2.
O game possui um menu de mapa, que infelizmente é mais ilustrativo do que uma ferramenta em si, o que é uma pena, pois em alguns trechos, especialmente na área central aberta, seria muito bom poder se localizar com maior precisão. Ou mesmo poder visualizar o mapa todo, mesmo que ele não seja 100% uma ferramenta de localização.
Um ponto negativo do game, e um presente em muitos outros games de “mundo aberto”, é que há algumas áreas em que não há uma limitação visual de bordas de mapa. Em certos trechos, temos pedras que podemos subir, até mesmo subindo montanhas, mas que não podemos escalar pois essas áreas estão fora do mapa e não são acessíveis. Há ainda certos trechos com caminhos totalmente abertos, mas que quando nos aproximamos, se transformam numa parede levemente brilhante indicando que o mapa termina ali. Pessoalmente, eu gosto de explorar os mapas dos games que eu jogo, principalmente em Souls-like, em que muitas vezes há algum item importante muito bem escondido em áreas de difícil acesso. Por conta disso, os pontos do cenário sem uma clara identificação de não serem acessíveis sempre são convidativas a se explorar.
O game possui mapas muito bem construídos, cheios de biomas diferentes, com cidades inteiras construídas com lixo, florestas de algas infestadas pelo “grude” e até mesmo áreas industriais altamente poluídas. E mesmo assim, a lembrança de um episódio do Bob Esponja fica na mente enquanto se joga, o que é algo bem divertido, principalmente quando o game passa por alguns momentos genuinamente sombrios e inesperados!
Na parte sonora, Another Crab’s Treasure é muito bom. O game mistura diferentes estilos musicais, obviamente adicionando alguns “temas de praia” que casam perfeitamente com a estética, com cada cenário tento sua própria música tema, e com diferentes músicas para os momentos de batalha, principalmente contra chefões.
E o melhor de tudo, o game possui localização em português brasileiro! Sua dublagem é em inglês, mas todos os menus, textos e legendas estão localizados de forma perfeita para nosso idioma!
Conclusão
Another Crab’s Treasure é um Souls-like muito divertido e envolvente, e que entende que não basta simplesmente adicionar uma barra de stamina, rolamento e inimigos difíceis que você tem um bom game. O que vemos aqui é um estilo próprio muito bem construído, que não esconde suas inspirações e não tenta imitá-las.
Esse game foi um hit tão grande a ponto de surpreender seus próprios criadores, que jamais esperavam pelo sucesso que o game fosse fazer. E esse sucesso é merecido, pois o que temos aqui é um game desafiador, divertido e bastante carismático! Se você gosta de Souls-like, com certeza gostará de Another Crab’s Treasure. E se você não tem experiência com o gênero, esse talvez seja uma boa porta de entrada!
Another Crab’s Treasure foi lançado no dia 24 de abril com versões para PC, Playstation 5, Xbox Series X e Nintendo Switch.
