Análise Arkade: American Fugitive é tipo um GTA de cidade pequena
Prepare-se para cometer pequenos crimes e fugir da polícia em alta velocidade com American Fugitive, uma espécie de “GTA de cidade pequena” que chegou recentemente aos PCs e consoles, confira nossa análise!
Vida bandida
American Fugitive nos apresenta a Will Riley, sujeito que começa o jogo sendo acusado do assassinato do próprio pai. Ele vai parar atrás das grades, mas, depois de passar um tempo lá, resolve que não vai deixar isso barato: ele precisa provar sua inocência e se vingar do verdadeiro assassino.
Após uma fuga no melhor estilo Um Sonho de Liberdade, estamos livres para explorar uma (nem tão) pacata cidadezinha interiorana dos Estados Unidos. Will vai entrar em contato com velhos conhecidos e conhecer novas pessoas que irão querer explorar seus talentos escusos em troca de informações e pistas sobre o caso de seu pai.
“Talentos escusos”? Pois é: acontece que Will nunca foi realmente um bom moço, tendo considerável experiência em atividades como roubos, furtos e invasões. Mas, isso não faz dele um assassino, e se ele vai ter que voltar à sua vida bandida para solucionar o assassinato do pai e limpar o próprio nome, que assim seja.
Claro que o fato de sermos foragidos não ajuda muito: a lei é bastante rigorosa por ali, e qualquer pequena infração que você cometa diante de alguma testemunha será denunciada, e não vai demorar para a polícia estar na sua cola. É, vida de fugitivo não é fácil.
Crimes de cidade pequena
Ao bater o olho em American Fugitive, é bem difícil não pensarmos nos primórdios da série GTA, ou mesmo no ótimo GTA Chinatown Wars do Nintendo DS. O jogo claramente é uma homenagem não só à série da Rockstar, mas aos filmes de “polícia e ladrão” que eram sucesso nos anos 80 e 90. Acompanhamos a ação sempre de cima, e as interações com menus e diálogos são apresentadas em janelas.
Como dito no primeiro parágrafo desta análise, American Fugitive é meio que um “GTA de cidade pequena”, então espere por missões, crimes e situações um pouco mais… modestos. Nada de grandes golpes milionários e assaltos a bancos, aqui vamos passar a maior parte do tempo roubando carros, surrupiando provas, documentos e pistas, revendendo muamba roubada para levantar uma grana, e por aí vai.
No início do game, boa parte das missões envolve ajudar nosso cunhado — que é um ex-detento — a importunar uma gangue de valentões da cidade. Isso rende missões hilárias como roubar a camionete de um deles e pintá-la de rosa, por exemplo, ou guinchar o caixa eletrônico “batizado” que eles usam para suas ações ilícitas. Com o passar das horas, conhecemos novos “amigos”, que nos passarão algumas demandas sérias, outras absurdas, mas tudo coerente com o contexto do jogo.
Aqui não há o excesso de sidemissions e coisas aleatórias que vemos em jogos de grande orçamento. Tal qual o recente Shakedown Hawaii — que, não por acaso, também parece um GTA das antigas — aqui são as missões principais ditam o ritmo do jogo, e os poucos objetivos secundários envolvem colecionar coisas ou participar de corridas e outros “eventos”.
Ou seja, American Fugitive oferece a liberdade de um legítimo sandbox, mas seu mundinho é muito mais contido — ainda que tenha ciclo de dia e noite, mudanças de clima, e tudo mais. É possível perpetrar o caos ali, mas nunca é algo extremamente explosivo e pirotécnico.
O fato de vermos tudo de cima reforça a sensação de que estamos interagindo com um diorama, uma maquete. Isso não desmerece o jogo — pelo contrário, esteticamente ele é bem charmoso –, e mostra que os desenvolvedores foram prudentes e não tentaram “dar um passo maior do que a perna” e fazer um jogo com escopo muito grande que poderia deixar a desejar em termos de gameplay.
Indo direto ao ponto: mecanicamente, American Fugitive funciona muito bem. Suas mecânicas são simples de aprender, misturando elementos de corrida e twin stick shooter que já vimos em dezenas de outros jogos. Furtividade também é um fator a ser levado em conta, e mesmo quando entra em uma loja pela porta da frente (sem estar realmente invadindo-a) você pode decidir se vai assaltá-la e render o balconista… ou simplesmente fazer suas compras e sair como um “cidadão de bem”.
Fuga e Resistência
Uma coisa um pouco pentelha é que em American Fugitive qualquer barbeiragenzinha vira um crime em potencial: esbarrou em uma caixa de correio? Atropelou um poste de luz? Derrubou uma cerca? Pode ter certeza que, se houve testemunhas, a polícia será alertada e você será perseguido, com alertas sobre a cor do seu carro ou mesmo informações sobre a sua roupa ajudando os policiais a te localizarem.
O jogo tem um ranking de procurado que funciona exatamente como o de GTA: quanto mais estrelas no marcador, mais tiras na sua cola, e quanto mais você foge e toca o terror, mais policiais entrarão na perseguição. Também como em GTA, você pode tentar detonar as viaturas durante a perseguição, ou mesmo tentar despistá-las na manha.
Explicando: aqui também há aquele manjado esquema de trocar a cor do carro para dar um perdido nos guardas, mas o jogo vai um pouco além: se sua roupa entrou na denúncia, você pode trocar de roupa para tentar escapar — pode até botar um vestido! Se nem isso funcionar, você pode pegar a rabeira do trem e torcer para a poeira baixar.
Essas táticas rendem algumas situações absurdamente hilárias: se você conseguir escapar da linha de visão dos policiais por alguns segundos, pode simplesmente esconder seu carro no mato, invadir o quintal de uma casa e afanar uma nova muda de roupa do varal. Afinal, se eles estavam procurando um cara de jeans e camisa branca, vão ignorar um sujeito de jeans e camisa verde. É tão estúpido quanto trocar a cor do carro, e igualmente funcional.
Conforme cumpre objetivos, você acumula dinheiro e pontos de experiência para fazer upgrades. Coisas como gastar menos stamina ao correr, mais chance de sucesso de fuga e mais espaço de inventário são algumas das coisas úteis que talvez valham a pena desbloquear, mas há upgrades ainda mais específicos, como receber uma caixa de provisões sempre que for apanhado e precisar dar uma fugidinha do xadrez (quando você morre fora de uma missão, é preso, e foge da cadeia novamente para prosseguir com a trama).
Criatividade X Orçamento
American Fugitive é um jogo bem bonito: seu visual é um 3D bem feitinho, que recebeu uma camada de cel-shading para ganhar uma cara meio que de história em quadrinhos. A ação é sempre vista de cima, mas com uma leve inclinação que nos permite ver o real volume das coisas, de modo que não pareça 2D. Pense em algo como Fear Effect Sedna e vai ter uma boa ideia do que esperar. Como já dito, parece uma grande maquete interativa.
O jogo claramente teve um orçamento modesto, mas fez um bom uso dele: o gameplay é fluido e responsivo, e dirigir pela cidade é um prazer, especialmente sem a polícia na nossa cola. Não há vozes — os diálogos rolam em caixas de texto com pequenas animações — e o jogo mascara algumas de suas limitações de formas bem criativas.
Por exemplo: ao invés de modelar o interior de cada uma das dezenas de casas e estabelecimentos da cidade, o jogo apresenta um mini-game onde invadimos “a planta” da casa, gastando um número X de segundos para vasculhar cada cômodo — e tendo que ponderar até que ponto é viável explorar antes de atrair a polícia. Ao final de cada ciclo desses, vemos os itens “roubáveis” presentes naquele ambiente e podemos decidir se levaremos ou não.
Tipo o vídeo abaixo: depois de descolar um uniforme de policial, a missão era infiltrar-se na delegacia para surrupiar uma pasta sobre o caso de Riley. Clique no play abaixo para entender como funciona a mecânica de “invasão” do game:
Sempre que a história vai para um ambiente interno, é usado este artifício. Para aumentar suas chances de sucesso, você pode sondar pelas janelas antes de invadir, e usar um pé de cabra para arrombar uma porta talvez faça menos barulho do que quebrar uma vidraça na base da tijolada. Há um fator estratégico envolvido que torna crimes e invasões muito menos explosivos e mais planejados.
Embora eu goste dessa abordagem e respeite a criatividade dos envolvidos, não se pode negar que a repetição tende por tornar certos procedimentos um pouco maçantes. Parece que American Fugitive é vítima de seu próprio escopo: ele nunca “decola”, mantendo o gameplay e as missões sempre em um mesmo patamar. Isso não é realmente um problema, mas faltam momentos de clímax para fazer o gráfico de empolgação do jogador subir.
Apesar disso, em termos técnicos, o jogo é muito bem resolvido, e rodou sem engasgos na plataforma em que testei (Xbox One X). Ah, e todos os menus e diálogos estão em português brasileiro, um baita adianto para ninguém ficar perdido.
Conclusão
American Fugitive é um jogo muito competente no que se propõe, e claramente foi feito com carinho e dedicação. Seu escopo limitado tende a torná-lo um pouco repetitivo, mas acho que isso foi mais fruto de prudência (e orçamento) do que falta de habilidade em produzir algo maior, mais ambicioso.
Para um jogo que trata de crimes e fugas, ele é um pouco “contido demais” — mais explosões e tiroteios sem dúvida seriam bem-vindos para tornar as coisa mais interessantes. Espero muito que as vendas estejam indo bem, e que o pessoal da Fallen Tree Games possa trabalhar em uma sequência maior e mais arrojada.
O que temos aqui é o tipo de jogo que fica entre o moderado e o bom, mas que pode melhorar muito se tiver um budget maior, que permita ao time de produção ousar mais. Torço para vermos um American Fugitive 2, pois a receita apresentada aqui funciona, e mostra que há muito espaço para crescer e evoluir.
American Fugitive está disponível para PC, Playstation 4, Xbox One e Nintendo Switch.