Análise Arkade – O faroeste estiloso de Call of Juarez: Gunslinger (PC, Playstation 3, XBOX 360)
A série Call of Juarez retorna às origens com Gunslinger, sua mais recente sequência que traz de volta a poeira e o chumbo grosso do faroeste americano. Confira agora nossa análise deste estiloso shooter.
Produzido pela polonesa Techland, e distribuído pela Ubisoft, Call of Juarez: Gunslinger acaba de chegar às lojas virtuais. O game está disponível apenas na forma digital para PC, XBOX 360 e Playstation 3 através do Steam, XBOX Live e PSN, por R$ 29,99/1200 MS Points/U$ 15 .
Este novo título da franquia Call of Juarez coloca os jogadores no papel de Silas Greaves, um justiceiro e caçador de recompensas que cruza o caminho de personagens lendários do velho oeste americano em busca de vingança contra um malfeitor.
Durante o que parecia ser apenas uma pausa em suas andanças, o já “aposentado” Greaves chega à cidadezinha de Abilene, no Kansas, onde ele invariavelmente acaba sentado na mesa de um saloon, rodeado de ouvintes curiosos para conhecer suas histórias.
É baseado nesta prosa entre Silas e os frequentadores do bar que o game se desenrola: cada missão do jogo é um capítulo narrado pelo pistoleiro, desde as suas origens trágicas até o momento em que ele se torna um caçador de recompensas e as confusões em que ele se mete a partir de então.
Essa saga por justiça remonta à uma época clássica da história americana, em um país vasto onde o governo e os homens comuns dividiam involuntariamente a tarefa de cuidar da lei (ou desafiá-la). Em 99% dos casos, isso significava muito chumbo e tiroteios.
Como era de se esperar, as referências à cultura western são abundantes em Gunslinger. Durante sua caçada, o protagonista acaba enfrentando figuras icônicas do faroeste, como os bandidos Jesse James, Butch Cassidy e Sundance Kid, e vivenciando diversos eventos que marcavam aquela época, como roubos à trens em movimento, tiroteios em ranchos e assaltos a bancos.
Esta rica história é contada de forma extremamente estilosa. O jogo apresenta gráficos cell-shaded à la Borderlands, com animações e cutscenes cartunizadas que lembram HQs. Tudo em Gunslinger tem um visual arrojado, desde o menu inicial até os créditos.
O game em si – um shooter em primeira pessoa -, faz jus a esse estilo: por breves instantes, o sangue cartunizado jorra em câmera lenta quando acertamos um tiro na testa do inimigo, acompanhado de um whoosh e do score que premia o disparo certeiro. Silas assopra a fumaça e gira o revólver, e o tiroteio continua, para mais momentos estilosos.
O som é ótimo, desde o recarregar das armas até os zunir das balas cortando o ar ao redor do protagonista. A música também acompanha muito bem a levada de Gunslinger, e chega a momentos acima da média em vários trechos do game.
A boa surpresa é a atuação dos dubladores do game. As vozes de Silas e seus ouvintes (que por sinal participam ativamente da narrativa) são muito bem interpretadas, dando vida ao sotaque ríspido e cheio de jargões do velho oeste.
Servindo de palco para tudo isso, os mapas trazem uma boa dose de capricho e até de variedade, afinal, nem só de desertos, saloons e cidades fantasma viviam os intrépidos aventureiros do meio-oeste americano: o game varia a ambientação e nos leva também à montanhas mais ao norte para lutar contra os pele-vermelhas e aos pântanos para confrontar bandidos fugitivos em cemitérios alagados.
Talvez o único ponto realmente negativo na apresentação seja o design esquecível dos inimigos: os modelos dos bandidos são muito repetitivos e algumas de suas animações são fracas comparadas a games recentes.
Call of Juarez: Gunslinger tem basicamente a mesma jogabilidade de um shooter como Call of Duty: ele se resume a correr, mirar e atirar. Esconda-se atrás de barris, caixas e carroças, mate todos os inimigos e finalmente avance. O game é bem linear, e conta com os mesmos controles da grande maioria dos FPS atuais.
Para quebrar a repetitividade dessa fórmula, o game apresenta também um lado mais arcade. O jogador ganha pontos por acertar headshots, matar inimigos através de paredes de madeira ou explodir barris de pólvora, mandando todo mundo pelos ares.
Para completar, várias kills em sequência se encaixam em combos que tornam a experiência mais divertida.
Além deste sistema de pontuação – que não é necessariamente inovador, mas vem bem a calhar -, duas habilidades principais de Silas entram em jogo para tornar os tiroteios mais legais: a barra Concentration e o Sense of Death.
O modo Concentration é basicamente um bullet time que permite a Silas escolher seus alvos com maior precisão: o jogo entra em slow motion e os inimigos ficam destacados, dando tempo para registrar belos combos. Também não é nenhuma grande novidade em shooters, mas funciona muito bem, simulando a destreza e rapidez no gatilho dos heróis de faroeste.
A segunda habilidade, Sense of Death, é um recurso salvador que permite que o protagonista literalmente desvie de uma bala se sua vida estiver em risco: o tempo fica mais lento, e um quick time event permite que o jogador se esquive do projétil durante a batalha.
Essa animação só acontece quando Silas está prestes a morrer, e leva um tempo para ela poder ser usada novamente. Isso leva os combates ao limite, sem estragar o equilíbrio de dificuldade do game.
Gunslinger traz ainda um excelente sistema de level up. Conforme o jogador ganha pontos, ele pode usá-los para comprar novas habilidades que melhoram tudo no personagem e nas armas.
Existem três grupos de skills, cada uma voltada para um estilo de jogo diferente: Gunslinger (para os ‘desperados’ que curtem usar dois revólveres ao mesmo tempo), Ranger (para combates à distância) e Trapper (para tiroteios em ambientes fechados).
Cada uma dessas três especializações tem outras 14 habilidades únicas, o que nos deixa com um leque de 42 habilidades divertidas e úteis, e você pode ter todas elas se conseguir pontos suficientes, o que torna o jogo recompensador e abre novas possibilidades na hora dos tiroteios.
Os upgrades vão desde os tradicionais “recarregar a arma mais rápido” ou “aumentar a capacidade de munição”, até a chance de usar duas escopetas serradas ao mesmo tempo ou a habilidade de devolver a dinamite que os inimigos arremessam em você, para retaliações gloriosas no meio do fogo cruzado.
Os mapas e espaços onde os combates se desenrolam são, na maioria, bem desenhados: os cenários trazem ambientações legais inspiradas nos westerns, e oferecem desafios interessantes, como inimigos surgindo do alto de rochas e telhados, por exemplo.
O ponto negativo vai para alguns problemas de movimentação nesses mapas. Como o próprio Silas diz em um momento do game: “That goddamned swamp was a goddamned maze and I had no goddamned idea where I was”, ou “Aquele maldito pântano era um maldito labirinto e eu não fazia a maldita ideia de onde eu estava”, no nosso bom e velho português.
No geral, não há problemas em encontrar o caminho durante as missões (até porque rotas alternativas praticamente não existem, e o game tem um sistema que indica o objetivo na tela), mas é possível se confundir entre o que pode ser explorado e o que não pode, e é aqui que entra o problema.
Obstáculos pequenos – e obviamente transponíveis – como caixas e rochas menores, podem bloquear a passagem do jogador que tentar improvisar um ponto estratégico durante os combates (um problema que, vale ressaltar, não é exclusivo de Call of Juarez: Gunslinger).
Estas barreiras às vezes são intencionais (para forçar o jogador a “andar na linha”), outras involuntárias, e em ambos os casos são frustrantes, mesmo sabendo-se que o objetivo do game não é a exploração.
Ao final de cada missão, Silas precisará enfrentar seus maiores inimigos em boss fights ou duelos. Os boss fights não são extraordinários, mas oferecem combates bastante desafiadores e divertidos.
Já nos duelos, o protagonista fica frente a frente com um rival para um legítimo showdown de vida ou morte. O sistema envolve manter a mira no desafiante sem deixar que ela oscile muito, enquanto se ajusta a mão que vai puxar o revólver (isso aumenta a velocidade na hora de sacar a arma e atirar).
O conceito é bacana, mas na prática não é tão satisfatório como poderia se esperar, em parte porque a princípio o jogador precisa ficar de olho na interface, ao invés de se sentir realmente parte da situação tensa que o duelo representa.
Todas estas funções se amarram para que Gunslinger conte sua história, algo que ele consegue fazer de uma forma pouco comum, em se tratando de um gênero que geralmente deixa a trama em segundo plano para favorecer a ação.
O desenrolar da campanha é completamente focado na narrativa de Silas Greaves, e isso fica bem claro durante todo o game: a partir do momento em que o caçador de recompensas senta na mesa do saloon de Abilene e começa a contar sua saga aos presentes, o voice over do personagem passa a dominar cada cena.
Silas descreve suas ações na forma de um “meio monólogo, meio conversa”. As pessoas que estão no bar também participam da narração, se impressionando e às vezes até questionando a veracidade dos feitos narrados pelo pistoleiro.
O interessante é que a partir de um determinado momento, a narrativa literalmente toma conta do game: a história contada por Silas deixa de ser apenas uma explicação dos fatos e passa a interferir diretamente nas fases.
O protagonista pode lembrar, enquanto conta a história, que havia uma ponte ao lado do desfiladeiro em que ele estava. Essa ponte literalmente se materializa no cenário, permitindo ao jogador prosseguir com a missão. Um recurso narrativo muito interessante – quando bem empregado.
Silas também tem um lado cômico, e por vezes confunde lenda com realidade causando situações autenticamente engraçadas in-game. Em um exemplo, Silas conta que estava cercado por dezenas de índios furiosos, colocando o jogador em uma situação bem complicada e o obrigando a se esconder atrás de uma pedra.
Um dos ouvintes pergunta se ele tinha certeza da quantidade de inimigos, o que faz Silas se lembrar de que na verdade eram apenas dois ou três.
Quando o jogador sai do abrigo, as dezenas de índios sumiram dando lugar para um ou outro inimigo mal armado. Também no velho-oeste existiam as “histórias de pescador”, e isso é explorado de maneira bem divertida no game.
Apesar de dar um tom legal à narrativa em muitos momentos – e proporcionar boas risadas com essas sacadas -, o voice over interminável de Silas às vezes acaba exagerando na dose: tanta “falação” tende a desviar a atenção do jogador, e isso prejudica a concentração e a imersão nas missões, especialmente para quem precisa das legendas para acompanhar o que está rolando (o game tem legendas em português).
Isso se combina com alguns trechos que fazem o jogador voltar ao início da fase – porque o narrador se lembrou de novos detalhes – para quebrar um pouco o ritmo do game. De qualquer forma, fica o ponto positivo pelo fato do jogo desenvolver os personagens através apenas do diálogo, sem que nenhum deles (fora o próprio Silas) apareça in-game.
Para todo efeito, a história de Call of Juarez: Gunslinger, é descontraída e voltada à ação, deixando o melodrama de lado. Em determinado ponto da campanha, o game até tenta mostrar uma abordagem mais séria, mas o gelo é logo quebrado pelo fato do narrador começar a cantar (?!)… e ser rapidamente taxado como louco pelos ouvintes.
Ao término do rompante de vingança e caçadas de Silas, o game oferece um final interessante, bem amarrado com o roteiro, e até certo ponto surpreendente. Há inclusive duas opções de final, mas elas não envolvem progressão de escolhas ou algo do tipo, e estão ali apenas para mostrar lados diferentes da conclusão.
Terminada a campanha – que dura algo entre 5 e 8 horas dependendo da dificuldade -, Gunslinger mostra que ainda tem cartas na manga para aumentar a sua vida útil. Após zerar o game, é destravado o modo True West – mais desafiador -, e é possível recomeçar o singleplayer com todas as habilidades e armas liberadas na primeira jogatina.
Além disso, o game conta com dois modos adicionais: Arcade e Duel Challenge. No modo Arcade, o jogador enfrenta hordas de inimigos prontos para virar peneiras e render scores e combos. É uma forma divertida e mais casual de voltar ao game e se passa em diferentes cenários.
É realmente uma pena que estes mapas não tenham um modo cooperativo, pois descer chumbo em malfeitores com um amigo é algo que funcionaria muito bem aqui.
O modo Duel Challenge, por sua vez, permite aos jogadores tentarem novamente os duelos da campanha contra os maiores vilões do jogo. Como explicamos, ele não é tão inspirador, mas este modo pode criar maior interesse nele, e quem sabe render divertidos desafios ao jogador que “pegar as manhas” do sistema.
Apesar de não ter nenhum tipo de multiplayer, Gunslinger conta com um sistema de leaderboards nos modos Arcade e Duel Challenge, para quem quiser comparar seu score e tentar chegar ao topo da lista. Na versão PC, o game conta ainda com suporte para controller através do Steam Big Picture, uma boa pedida para quem quer ter uma experiência de console na tela grande.
Call of Juarez: Gunslinger pode não ter a grandiosidade de um Red Dead Redemption, mas este não é seu objetivo. O game oferece uma história simples, contada de um jeito diferenciado, muitos bandidos para matar e uma boa dose de cultura western. Estes alvos ele acerta em cheio, e ainda assopra a fumaça e gira o revólver, para mostrar que tem estilo.