Análise Arkade: Grim Fandango Remastered traz de volta o mundo dos mortos com muita competência
Em meio a tantos remakes e remasterizações, eis que Grim Fandango aparece com todo seu bom humor e “terror”, apresentando um excelente jogo para uma geração que nunca pôde jogá-lo e trazendo muita nostalgia em alta definição para os veteranos.
Grim Fandango é injustiçado! É um dos grandes nomes dos videogames que não teve a devida justiça com seu legado. Podemos citar o seu “atraso”, sendo lançado em 1998, anos depois da “febre” dos clássicos da LucasArts como The Dig ou Day of the Tentacle, e podemos citar também o fato de que apenas os computadores tiveram acesso ao jogo em uma época aonde poucos lançamentos (e bons, vale ressaltar) perdiam espaço em meio a Playstations e Nintendos 64.
Mesmo assim, Manny Calavera alcançou uma legião de fãs, que o ajudam em suas investigações no Mundo dos Mortos até hoje, mesmo sem relançamentos nem nada do tipo. Depois de tanto tempo tendo que recorrer a fóruns e até ao submundo para manter a jogatina funcionando, agora é a vez dos veteranos terem acesso a uma versão repaginada e aos novatos finalmente terem acesso a uma história divertida e a um sistema de jogo que insiste em não envelhecer.
Primeiro de tudo, o visual
Sim, gostamos de gráficos de ontem e por isso só temos que agradecer ao trabalho da Double Fine. Aqui não temos invenções de moda. O foco em Grim Fandango se contenta apenas em pegar o clássico jogo e adaptá-lo para as telas de hoje e o trabalho está muito bem feito.
Não espere aqui uma remasterização com gráficos refeitos e tudo o mais que vemos por aí: em Grim Fandango, temos apenas novos efeitos de luz e sombra e personagens mais detalhados. É o suficiente. E como esse jogo foi trazido para aqueles que querem jogar o ontem — e de preferência, da maneira mais “ontem” possível — você ainda pode ir lá e “desligar” todo o trabalho de remasterização para curtí-lo da melhor maneira 1999.
Um problema aqui — e isso sim podia ser melhor lapidado — é em relação a proporção: o jogo continua em proporção 4:3 e mesmo com o “truque” de colocar o jogo em 16:9, dá pra ver que isso é um encaixe e não uma adaptação adequada. Isso é problema pois se você quer investigar algo bem no canto da tela, pode perder algum pedaço do ambiente pois a tela “continua” e as opções somem.
Mas o jogo nem precisa de tanta atualização: seus cenários coloridos que ilustram o mundo dos mortos foram diferentes em seu lançamento e são diferentes hoje. Sabe aquela conversa de “não mexer em time que está ganhando”? Pois bem, é exatamente isso que temos aqui. Bons visuais, mexidas necessárias, manutenção do clássico, feito. Para alguns isso pode soar até como um trabalho preguiçoso, mas tenho certeza de que tudo isso foi feito com muito cuidado, já que o público alvo iria chiar se o oposto fosse feito (refazer gráficos e cenários).
Não cansamos de apontar e clicar
Verdade seja dita: o gênero nunca morreu. Pode ter tirado um cochilo, mas dizer que está morto é exagero. Com a chegada dos tablets, apontar e clicar nunca foi tão legal e jogos como Clash of Clans ou mesmo o jogo de tablet dos Simpsons mostram muito bem isso.
E Grim Fandango nos traz de novo esse prazer, mas como era antigamente. Obviamente, neste ponto nada foi tocado, e tirando a movimentação de Manny que está notavelmente melhor, tudo está como era antes. Sua jogabilidade baseada no controle intuitivo e na investigação ainda diverte e continua nos fazendo sentir com o tempo bem aproveitado.
E “nada foi tocado” tanto, que este não é um jogo “leite com pera” e talvez jogadores mais acostumados com o “vá até aqui” e save points a todo momento dos jogos de hoje vão passar longe de Grim Fandango. O próprio jogo avisa no começo que seu progresso deve ser salvo manualmente e que não oferece suporte a salvamento automático.
Ao mesmo tempo que a remasterização não traz uma seta de direção, nem um tutorial, nem nada. É tudo na base do “se vira”, tendo que passar muito tempo conversando e pesquisando seus itens para as próximas etapas.
Mesmo assim, se você não conhece Grim Fandango e se interessou por ele, hoje temos algo que não tínhamos na época de seu lançamento: Youtube. Neste ponto, a remasterização conta com diversos detonados e caso queira apenas aproveitar a “viagem”, nada lhe impede de assistir aos vídeos e conferir este excelente jogo. Meu conselho é: deixe o preconceito de lado, conheça um bom jogo e divirta-se.
E a dublagem, cara? Animal, né?
Sobre a dublagem, uma afirmação: deveria estar em qualquer curso de dublagem ou coisa do tipo, pelo menos quando o assunto é videogame. Não sei se estou ficando muito chato ou se é algo comum, mas as dublagens de hoje são muito chatas. Não existe mais aquela coisa de colocar vida no personagem, apenas se lê o texto e se interpreta sem o menor carisma e personalidade.
Coisa que por bem, não tem no mundo dos mortos. A dublagem clássica faz parte do jogo e é excelente! As falas com sotaque em espanhol carregado, a personalidade na voz de Manny e todos os outros e os diálogos estão acima da média e deveria ficar de lição pra tanta dublagem sem sal que tem por aí.
A trilha sonora é baseada em jazz, folk e lembra muito um jogo que chegou alguns anos depois: L.A. Noir. Embora ela também foi mantida como o original, também continua o problema dos cortes do nada das faixas, mas desta vez temos o próprio Tim Schafer comentando curiosidades e detalhes da produção do jogo, caso escolha a opção Comentários do Diretor. São os pequenos detalhes compensando os erros de maneira grandiosa.
A foice fica aonde ficava meu coração
Talvez o melhor elemento de Grim Fandango que nos traz a alegria de vê-lo de volta é a sua história. Alegria pois muitos de nós que agora estamos curtindo o jogo deixamos passar batido por muito tempo por não procurar encontrar maneiras de jogá-lo novamente. Até existia um macete para o Windows 7, mesmo assim não somos todos aqueles que perdem tempo na internet procurando soluções.
Por isso é muito divertido ver Calavera em seu trabalho de acolhimento de mortos, servindo os novos “moradores” com pacotes de viagens compatível com o que fizeram de bom — ou ruim — durante suas vidas. E se ver envolvido em falcatruas e até com tráfico de almas durante o decorrer da história, sempre insana e bem feita, com muitos toques de filmes policiais dos anos 50 em meio à maluquice entre os mortos.
É muito bom ver de novo a história se desenrolando de maneira totalmente maluca, surreal, mas que continua prendendo nossa atenção e nos motiva a aprofundar mais na exploração e no progresso do jogo.
Uma aula de como se fazer uma remasterização!
Trazer algo bom de volta e do jeito que o jogador quer. Já que as remasterizações são a tendência do momento, a receita para um bom jogo é acima de tudo, respeitar o fã que jogou anos atrás sua obra e trazer novos jogadores. Neste caso a balança vai ficar mais pesada no caso dos fãs, e os novatos podem se assustar demais com a falta de explicações e dicas, mas reforço o que disse antes, se é novo: dê uma chance ao jogo e vá nos detonados pelo menos para pegar o jeito.
A remasterização de Grim Fandango merece aplausos por ser exatamente o que deveria ser: simples, com seu visual apenas atualizado e trazendo a manutenção de todos os grandes elementos que desde 1999 fazem a alegria de muita gente. Mexer demais poderia acabar estragando. Já pensou em uma nova dublagem ou em novas animações? Melhor não né?
Por isso, os nossos elogios não são apenas pelo trabalho em si e sim para a Double Fine como empresa. Primeiro por trazer um excelente jogo que foi injustiçado devido ao ambiente dos jogos de PC em seu lançamento e depois pela boa intenção de relançar este e mais clássicos da LucasArts com o passar do tempo: Day of the Tentacle é só mais um bom exemplo do que a empresa está preparando. E você acha isso ruim? Mas é claro que não! Que venha mais!
Grim Fandango Remastered está disponível para computadores Windows, Mac e Linux, além do Playstation 4 e PS Vita.