Análise Arkade: Late Shift é um interessante filme interativo para assistir (e jogar)
Após o sucesso dos games da Quantic Dream e da Telltale, o gênero dos jogos que contam com forte foco no enredo, com decisões importantes fazendo parte do gameplay, voltaram a ter destaque. E é da Suíça que chega mais uma boa opção para o gênero, Late Shift, um filme interativo que conta uma história intrigante sobre um grande crime, com a opção do jogador tomar decisões e direcionar os acontecimentos.
Uma noite alucinante
Produzido pela CtrlMovie, dirigido por Tobias Weber e com cenas filmadas em Londres, a proposta de Late Shift é a de ser um filme jogável, e contar uma história na qual o jogador é quem decide o rumo dos eventos. Mais ou menos como eram os bons e velhos games em FMV de antigamente, lembra?
Controlamos Matt, um jovem vigia de estacionamento que acaba se envolvendo em um assalto, que logo se torna a noite mais alucinante de sua vida: perseguições em alta velocidade, acidentes espetaculares, tiroteios e até mafiosos chineses, tudo isso vai rolar, e é você quem deve guiar os rumos que a história toma.
Mecânicas simples para “curtir o filme”
Antes de falar do jogo propriamente dito, vamos comentar um pouco sobre as mecânicas que ele oferece para que você possa “jogar o filme”. Ele é bem simples de ser jogado, mais até que outros games do gênero — como Heavy Rain ou Beyond Two Souls. Aqui o negócio é ser rápido para decidir o que fazer, já que a pressão da ação é constante e não te deixa “parar pra pensar”.
Ao invés de exigir do jogador várias ações e decisões durante a partida, Late Shift nos deixa assistir ao desenrolar da trama, pedindo apenas decisões pontuais que acabam por direcionar os passos seguintes e consequentemente, direcionar o jogador para um dos sete finais que a história oferece.
Investigar um barulho suspeito ou deixar para lá? Falar com a polícia ou tentar resolver tudo por conta? Incriminar outra pessoa ou levar a culpa sozinho? Algumas decisões são cruéis, as consequências delas são imediatas, e a trama vai se tornando mais e mais imprevisível.
Passamos mais tempo assistindo do que “jogando”, porém as decisões são, em sua maioria, bem dramáticas, e a história, por mais viajada que seja de vez em quando, se mantém interessante e te instiga a continuar. O tempo para se decidir é bem limitado e o arrependimento pode bater a todo momento. A proposta do jogo é a de um filme interativo, então, não há muito a ser feito, e a proposta aqui é algo mais focado no “VAI LOGO, DECIDE AÍ RAPAZ, QUE A GENTE NÃO TEM TEMPO!”.
“Gráficos”
Late Shift não tem gráficos em 3D, pois é um filme, e como tal, conta com elementos como atores, fotografia, edição e produção para apresentar seus eventos. Filmado em HD pelas ruas de Londres, no geral ele faz um trabalho bem cinematográfico, e não deve muito para boas séries de TV. O esforço para se filmar várias cenas e manter uma continuidade, aliás, já é algo muito interessante, pois tudo fica bem encaixado e não parece um amontoado de cenas desconexas enfiadas no game, como era comum em muito FMV sem vergonha dos anos 90.
A história do jogo acontece durante a noite e nesse quesito, a fotografia é bem caprichada. Os cenários transmitem o brilho das regiões mais ricas de Londres e o clima escuro traz mais tensão para a proposta de seu enredo. E o principal: não se sente nenhum loading entre a decisão tomada e a cena seguinte, é tudo muito fluido. Suas decisões moldam a história de forma dinâmica, e o jogo respeita a proposta e “pensa rápido” para te entregar a próxima cena.
E a história, como é?
Mirabolante e meio viajada em alguns pontos, mas interessante no contexto geral. O game até apareceu no BIG Festival do ano passado concorrendo ao prêmio de melhor narrativa e merecia ter levado o caneco, pois é bem escrita e (principalmente) bem amarrada.
O enredo traz grandes consequências para respostas simples, porém algumas situações da história parecem um tanto confusas e até forçadas, talvez para deixar a adrenalina sempre em alta. O protagonista meio sem sal acaba “jogando contra” a dramaticidade proposta. Matt não gera muita empatia, de modo que acabamos seguindo em frente mais pela trama como um todo do que pelo personagem em si. O restante do elenco tem seus altos e baixos, mas no geral é esforçado.
Vale ressaltar que — infelizmente — o game/filme não teve nenhum tipo de tradução para o nosso idioma: diálogos, legendas, menus, tudo está em inglês. Logo, é fundamental que o seu inglês esteja em dia se não quiser ficar perdido na história e nos acontecimentos.
Conclusão
Late Shift é um projeto ambicioso e corajoso, que mistura duas mídias — cinema e videogame — de formas bem interessantes. É mais para assistir do que para jogar? É, mas o peso das suas decisões molda a história de formas imprevisíveis, e quando você acabar subitamente encontrando um “final ruim”, vai querer jogar de novo e tentar chegar a um desfecho mais digno.
Considerando que os jogos em FMV são um gênero quase extinto do mundo dos games, é legal vermos que ainda existem empresas dispostas a manter viva este tipo de experiência. Aliás, a distribuidora Wales Interactive lançou no ano passado um outro jogo em FMV que vale a pena dar uma olhada, The Bunker, leia nossa análise aqui.
Recomendo Late Shift para gamers de mente aberta e saudosistas dos jogos em FMV de antigamente. Se você não se importa de passar mais tempo assistindo do que jogando — e mesmo quando “joga”, tem uma interação mínima –, aqui há uma boa história (e muitos finais) esperando por você.
Late Shift foi lançado de forma episódica para iOS no ano passado. Esta semana — mais precisamente no dia 18 de abril — ele foi lançado de forma completa para PC, Playstation 4 e Xbox One.