Análise Arkade: explorando o casarão assombrado de Perception
Desde que Perception foi anunciado, ele chamou nossa atenção, e falamos muito dele aqui na Arkade, afinal, não é sempre que um game nos coloca na pele de uma pessoa cega. Mas e aí, será que o jogo é bom? Vamos descobrir!
Contextualizando
Para quem não lembra, Perception é uma obra do The Deep Ends Games, estúdio formado por Bill Gardner e outros veteranos que saíram da Irrational Games — isso mesmo, a produtora da emblemática série BioShock. A proposta diferenciada do game e o currículo da equipe sem dúvida aumentam consideravelmente o hype pelo game, que inclusive apareceu em nosso Top 10 Indie Games Para Ficar de Olho em 2017.
Um casarão assombrado
Pois bem, agora que o jogo já foi devidamente lançado, pudemos acompanhar a intrépida Cassie em sua jornada de pesadelo por um casarão que guarda mistérios e segredos pra lá de sinistros. A jovem foi levada até lá por conta de estranhos sonhos que tem alguma ligação com o passado do lugar.
Confira abaixo o comecinho do jogo e a chegada de Cassie ao casarão:
Apesar de cega, Cassie é muito corajosa, e possui uma audição privilegiada, no melhor estilo Demolidor: ela utiliza ondas sonoras para “mapear” ambientes, obstáculos e objetos — a famosa ecolocalização, também utilizada por morcegos, golfinhos e outros animais.
Tipo assim ó:
E é assim, munida de sua bengala, seu celular — que possui um app que descreve objetos, algo que existe de verdade para auxiliar pessoas com deficiência visual — e este seu “superpoder” auditivo, que ela irá se aventurar por um casarão pra lá de sinistro, habitado por uma “presença” misteriosa que não está muito a fim de ver seus segredos sendo desenterrados.
Tateando às cegas
Na maior parte do tempo, Perception se comporta como um típico walking simulator: exploramos os cômodos da mansão em busca de itens e pistas que possam ser úteis para Cassie elucidar os mistérios que andam lhe tirando o sono. Porém, o grande diferencial aqui é a cegueira da protagonista, o que torna as coisas muito mais tensas.
A forma mais efetiva de “enxergar” os arredores é dando uma pancada com a bengala. Há um botão específico para isso, e as ondas sonoras resultantes se propagam e dão um bom vislumbre do ambiente. Porém, não é recomendável que você abuse deste recurso, pois suas bengaladas também atraem “a presença”, e você definitivamente vai querer se manter longe desta coisa sempre que possível — lembrando que é possível se esconder caso ela apareça… desde que haja algum esconderijo por perto.
Felizmente, existem formas engenhosas de contornar isso: elementos como aparelhos de som, gravadores e tubulações vazando emitem ruídos que nos ajudam a enxergar pelo menos um pouquinho. Nas áreas externas da casa, o vento soprando também ajuda muito. Os próprios passos de Cassie emitem curtos lampejos de visibilidade, mas isso varia muito conforme o tipo de piso — madeira faz bem mais barulho do que carpete, por exemplo.
Para não deixar as coisas MUITO complicadas para o jogador, os desenvolvedores também implementaram uma espécie de “sexto sentido”ao jogo: ao manter um botão pressionado, seu próximo objetivo ilumina-se na tela, seja ele um objeto ou uma porta. Você não tem como saber o que há entre você e o objetivo (paredes, escadas, portas fechadas), mas isso nos dá pelo menos um norte, e quebra um bom galho especialmente quando temos que passar por áreas que já visitamos antes.
Casarão mutante
Os pesadelos que levam Cassie ao casarão onde se passa o game têm relação com alguns objetos específicos, que ela terá de encontrar lá. Cada um destes itens está relacionado a um dos habitantes passados da mansão, de modo que cada capítulo do game é “tematizado” em um desses itens e na pessoa a quem ele era ligado.
Isso significa que a aventura vira meio que uma viagem no tempo psicodélica, pois cada objeto teve o seu momento em uma época diferente, chegando ao ponto de voltarmos mais de 100 anos no tempo. A estrutura da casa como um todo se modifica entre um capítulo e outro, o que é muito interessante até por quebrar a rotina de passarmos pelos mesmos lugares o tempo todo. Quer dizer, passaremos pelo mesmos lugares, mas eles não necessariamente estarão iguais.
Isso também abre espaço para algumas situações um tanto… inusitadas: em um dos capítulos, a casa passa a ser habitada por bonecas, que patrulham os corredores portando armas de fogo (?!) e podem te matar com um tiro. Esta é a parte mais estranha e chatinha do jogo, que vira quase um jogo de stealth, no qual devemos evitar a todo custo que as bonecas nos vejam. É um trecho bem esquisito, e definitivamente parece deslocado do restante.
Audiovisual
Considerando que temos uma protagonista cega, não espere por um jogo com muito apelo visual. O que temos no jogo são basicamente 2 cores: o azul das ondas sonoras que mapeiam os ambientes e o verde que destaca pontos de interesse pelo cenário (escadas, passagens e esconderijos, por exemplo). Fora isso, quando não houver nenhuma fonte de som disponível, prepare-se para ficar olhando para uma tela preta.
Para compensar a falta de visual, o game entrega um departamento sonoro impecável, na medida para deixar o jogador tenso e aumentar sua imersão. Com um bom equipamento de som, você realmente irá se se sentir “dentro” do jogo, pois a distribuição espacial dos efeitos realmente condiz com o que é mostrado — ou talvez seja melhor dizer “com o que não é mostrado” — na tela.
De portas batendo ao ruído do vento, passando pelos pavorosos sons de insetos caminhando que rolam sempre que você usa demais sua bengala — para indicar que a casa está ouvindo você — o áudio é a estrela do jogo. Não há muitas músicas aqui, mas ocasionalmente rolam aqueles acordes agudos de violino típicos de filmes de terror para aumentar a tensão. Ah, e vale ressaltar que o jogo está 100% legendado em português brasileiro!
Conclusão
Perception não é necessariamente um “jogo de terror”, pelo menos não se comparado a títulos como Amnesia, Outlast e Resident Evil. Ele é menos focado no terror em si e mais na tensão, que é potencializada pelo fato de nunca podermos ver realmente o que está ao nosso redor, o que é mais perturbador do que parece.
Considerando o quanto o pessoal reclama da “falta de inovação” da indústria, jogos que fogem do básico sempre são bem-vindos. Eu confesso que esperava mais de Perception, mas no geral ele oferece uma experiência bem interessante, tensa e diferente. Acho até que ele poderia funcionar em VR, tecnologia que é a menina-dos-olhos da indústria atualmente.
Se você quer experimentar um jogo assustador por uma nova perspectiva, dê uma chance a Perception. Mas faça isso sozinho, no escuro, e com um bom par de fones de ouvido.
Perception foi lançado em 30 de maio, com versões para PC, Playstation 4 e Xbox One.