Análise Arkade: Shadow of the Beast é um remake cheio de sangue, brutalidade e ideias estranhas
Sangue e brutalidade te esperam neste remake de um jogo “cult” de 1989. É a nossa análise do novo Shadow of the Beast que está no ar!
Contextualizando
O Shadow of the Beast original é um jogo que foi lançado em 1989 para os computadores Amiga e posteriormente migrou também para consoles como o Mega Drive e o Super Nintendo. O game era todo side scroller e tinha efeitos de parallax interessantes para a época, ainda que sua jogabilidade meio dura tornasse-o mais difícil do que deveria.
Embora não possa ser colocado ao lado de “clássicos” mais relevantes, ele acabou se tornando cult com o passar dos anos… pelo menos cult o bastante para ganhar um remake, que chegou esta semana ao PS4, e é dele que nos vamos falar agora!
Uma história de vingança
Shadow of the Beast coloca o jogador literalmente no papel da “besta” do título: o protagonista, Aarbron, é uma fera guerreira de aparência horripilante, com dentes afiados, cabeça pontuda e pares de garras afiadas saltando para fora dos punhos.
Porém, ele nem sempre foi assim: Aarbron era um bebê humano normal, que foi transformado nesta fera assassina e desmemoriada por Maletoth, um mago sedento por poder que escravizou Aarbron somente para usá-lo como sua máquina de matar pessoal.
Tudo muda quando, em mais uma missão assassina de Maletoth, Aarrbron reencontra seu pai humano, o que lhe traz à mente tudo o que lhe aconteceu. Resignado, Aarbron decide se vingar do mago que arruinou sua vida e lhe transformou na criatura hedionda que ele é. Claro que centenas de monstros e desafios separam ele de seu alvo, e a melhor maneira de abrir caminho é na base da porrada.
Que fique claro: quase tudo isso é o que pode ser concluído pelo básico que a campanha nos oferece. A história do game em si parece oferecer muito mais complexidade, mas o jogo impõe “barreiras” que dificultam o pleno entendimento da trama. Já já falo mais sobre isso. Antes, vamos falar sobre o…
Gameplay brutal (e cheio de ritmo)
Este remake mantém o estilo side scroller do jogo original: tudo é mais profundo e tridimensional, e a câmera volta e meia se mexe um pouco para passar ao jogador certa ideia de dimensão ou distância, mas você está sempre “preso” ao plano 2D, podendo ir somente para a esquerda e para a direita.
Enquanto o game de 89 apresentava cenários grandes e labirínticos — com escadas, muitas escadas — o que temos aqui é algo mais linear, dividido em fases relativamente curtas. Claro que existem algumas rotas secretas que escondem segredos e há um leve sabor de MetroidVania em algumas fases, mas no geral o game é muito mais direto ao ponto, com mais ênfase nos combates do que na exploração.
Os combates, aliás, são um pouco diferentes do que estamos acostumados. Quando chega em uma área de confronto, barreiras te impedem de sair dali até que você derrote todos os inimigos (há um contador no canto inferior direito da tela). Conforme eles vão vindo pela esquerda e pela direita, você deve eliminá-los, de preferência sem tomar dano.
Parece simples, mas há um pouco mais de… timing envolvido. O combate multidirecional não oferece a fluidez de uma série Arkham da vida, de modo que você precisa caprichar no timing dos seus golpes para dar conta dos adversários sem que o seu combo seja quebrado. A maioria dos inimigos só precisa de um golpe para morrer, mas alguns têm escudos, carapaças ou são capazes de realizar esquivas e contra-ataques, o que exige abordagens diferenciadas.
Quanto mais você acerta o timing, mais seu multiplicador aumenta, o que afeta diretamente seu placar geral na fase e sua posição nas leaderboards. Aí embaixo você confere como funciona um combate típico de Shadow of the Beast:
https://youtu.be/0iCo93poEXE
O jogo aposta tanto no “ritmo” de seus combates que o principal golpe especial de Aarbron — o Ataque de Fúria — demanda um timing simplesmente perfeito para continuar rolando… o que se torna bem frustrante quando, por uma fração de segundo, você erra o timing e automaticamente encerra o golpe. Na prática, o que temos aqui é quase um jogo de ritmo disfarçado de hack n’ slash.
Confira no vídeo abaixo um pouco da “cadência” ritmada dos combates:
Reparou ali na mensagem “Com Atraso” que rolou depois de uns 5 ou 6 golpes? Pois é, foi um erro de cálculo e, como consequência, meu especial foi por terra. Claro que o combate continua rolando depois disso, mas mesmo na pancadaria comum você precisar estar atento ao timing dos seus ataques e das investidas dos inimigos para não se dar mal.
Ainda que a mecânica funcione, ela logo se torna um pouco repetitiva. Não existem combinações reais de golpes — como num God of War, por exemplo — somente golpes simples. Existem alguns especiais (o de “morder” inimigos para recuperar a energia é especialmente útil) e você descola até um “rifle” no decorrer do game, mas o grosso dos combates vai manter essa pegada dos vídeos acima.
Devorando as almas dos amigos
Shadow of the Beast não tem nenhum tipo de multiplayer, mas ele dribla isso oferecendo desafios que você pode fazer com seus amigos que também estejam jogando online. Enquanto você joga, pode encontrar marcações pelo cenário que indicam lugares por onde outros jogadores passaram. Ao interagir com essas marcas, você pode tanto enviar um presente para um amigo… quanto devorar brutalmente a alma dele!
Devorar a alma de outro jogador é basicamente um QTE button mash frenético, onde você deve apertar o botão certo repetidas vezes para desmembrar o pobre coitado. Tipo assim, ó:
Quando você devora a alma de um amigo, ele recebe uma notificação, e pode tentar dar o troco, devorando a sua alma mais rápido, o que pode gerar disputas bacanas. Na prática não é nada de mais, mas pode lhe render umas Pedras Sombrias, itens que criam um clone sombrio seu para te ajudar nos combates mais intensos.
As ideias estranhas
Lembra que eu falei lá em cima que o jogo coloca umas “barreiras” para você simplesmente não entender direito o que está rolando. Para começar, a história de verdade rola em separado, e para poder acompanhar a narrativa você precisa encontrar (e destruir) orbes que estão escondidos pelo cenário.
Nem sempre é fácil encontrar estes orbes, e quando encontrá-los, você precisa gastar um golpe especial, que é a única coisa que destrói as esferas. Ou seja, um golpe que seria super útil em batalha precisa ser guardado simplesmente para esses “segredos”. E quando você não encontra as orbes, partes da história ficam bloqueadas até que você as encontre.
E o mais curioso é que estas cenas de história não são incorporadas à campanha, na forma de cutscenes, nem nada do tipo. Elas ficam suspensas em uma espécie de timeline no mapa, de modo que, conforme destrava as orbes, você precisa ir lá e selecionar cada uma delas para ver mais um pedacinho da história. Ou seja, a história ganha profundidade “fora” do jogo em si.
Essa não é a única ideia bizarra aplicada no game: o mundo de Shadow of the Beast é composto por personagens de várias espécies, e cada uma fala um idioma específico. Até aí tudo bem. O problema é que você precisa COMPRAR (usando pontos de XP) legendas para cada idioma para entender o que os personagens falam. E cada legenda custa 2 milhões de pontos de XP!
Ou seja, na sua primeira jogada, você não vai entender nada do que nenhum personagem fala, pois as legendas serão caracteres ininteligíveis. Ok, eles não são de falar muito, mas ainda assim essa é uma forma estúpida de incentivar o fator replay só para rever cutscenes legendadas. E eu te falei que você deve comprar cada idioma separadamente? Pois é, prepare-se para gastar 10 milhões de pontos de XP em legendas se quiser ver (e entender) todas as cutscenes.
Audiovisual
Se tem algo que a Heavy Spectrum acertou a mão, é no visual deste remake. O Shadow of the Beast original era cheio de monstros e cenários estranhos, e o novo game mantém essa “estranheza”, mas dá uma repaginada visual em tudo, tornando o universo do game muito mais coeso e interessante.
Mesmo se tornando bem escuro em algumas fases, os cenários são bem variados, indo de desertos à templos, cemitérios e mangues. Como já dito, a câmera geralmente dá uma afastada quando você se aproxima de lugares bacanas, para que você possa absorver toda a magnitude dos cenários (e ver como o personagem é insignificante).
As animações do protagonista são bem fluidas, ainda que o jogo mantenha um pouco da “dureza” do gameplay do original. Na hora dos combates, é tanto sangue que ele até espirra na tela ocasionalmente, e não faltam decapitações e desmembramentos.
O jogo é cheio de efeitos bacanas de partículas (destaque para o teletransporte) e de iluminação dinâmica que enriquecem muito o visual do game. Temos alguns chefes gigantes aqui e ali e em um deles o jogo vira praticamente um “shooter de navinha”, com Aarbron usando um jetpack e tendo que se desviar dos tiros inimigos:
A trilha sonora é meio tímida e inconstante, ainda que a música tema seja muito boa. A história das orbes é narrada de forma bem envolvente, e de resto, só o que você vai ouvir são os estalidos e grunhidos dos inimigos, bem como som de ossos quebrando e sangue espirrando.
Um detalhe que achei muito interessante é o mapa, que tem uma estética bem parecida com a da clássica abertura de Game of Thrones:
Saudosismo
Os saudosistas de plantão vão gostar de saber que há muito conteúdo do game antigo para ser destravado: você pode destravar o game completo para jogar, e também pode gastar um pouco a mais para poder jogá-lo com vidas infinitas (o que é recomendado, pois o jogo clássico é bem difícil).
Joguei um pouco do clássico nesta versão “emulada” pelo remake:
Também é possível visualizar a arte de capa, ouvir a trilha sonora (que é muito boa, até melhor que a nova) e assistir a um pequeno documentário sobre a relevância do Shadow of the Beast original para a época. Ah e você pode jogar o jogo novo com a trilha sonora do antigo, o que é bem legal!
Conclusão
Shadow of the Beast é um remake que respeita a história e o universo do jogo original, mas expande-o bastante em praticamente todos os aspectos, e muda drasticamente o gameplay, tornando-o muito mais violento e visceral.
Assim como o jogo original — que não era nenhuma obra de arte mas acabou se tornando “cult” o bastante para ganhar um remake — esta versão 2016 está longe de ser especialmente memorável, mas entrega exploração e brutalidade com um gostinho de nostalgia, o que deve agradar tanto os fãs quanto a molecada que adora ver sangue espirrando na tela.
Shadow of the Beast foi lançado no dia 17 de maio, exclusivamente para o PS4.