Análise Arkade: Skully e a falta de equilíbrio entre carisma, desafio e frustração

15 de agosto de 2020
Análise Arkade: Skully e a falta de equilíbrio entre carisma, desafio e frustração

Skully é um jogo de plataforma 3D um pouco diferente. É comum no gênero termos personagens humanoides e animais antropomorfizados, mas aqui nosso protagonista é um crânio! E não falo de um esqueleto completo, mas só da cabeça, mesmo! Confira agora nossa análise de Skully!

O mais novo lançamento da Modus Games parte de uma premissa curiosa: controlamos um crânio que foi trazido de volta à vida (ou quase isso) por uma espécie de divindade elemental, que precisa de uma mãozinha para resolver alguns problemas familiares.

O sujeito faz isso reanimando um crânio em uma poça de lama com propriedades mágicas. Depois de”criar” este novo amigo ósseo, ele vai partir em uma jornada por uma terra selvagem, na esperança de fazer as pazes com seus irmãos, que são outras divindades elementais.

Análise Arkade: Skully e a falta de equilíbrio entre carisma, desafio e frustração

No papel de Skully, o crânio reanimado, nossa missão é rolar para lá e para cá, adquirindo novas habilidades que nos ajudem a superar obstáculos que envolvem tanto trechos de plataforma quanto puzzles, enquanto fazemos o possível para ajudar nosso amigo a se entender com sua família.

Rolando

Como não temos braços nem pernas, nossa mobilidade se limita ao básico que uma criatura redonda é capaz de fazer: rolar. Skully é um jogo de plataforma 3D dividido em fases, e boa parte delas envolve rolarmos em frente, evitando perigos e obstáculos.

O barro mágico é o que nos mantém vivos, então a água acaba tornando-se nossa maior inimiga em Skully, e deve ser evitada a todo custo: basta encostar em uma poça ou se deixar molhar por uns respingos para nosso protagonista fora dos padrões perder rapidamente toda sua barra de vida.

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Um típico momento de gameplay: plataformas e muita água

Em um jogo “normal” isso até seria simples, mas lembre-se que aqui controlamos um crânio rolante: o level design entrega rampas íngremes, plataformas inclinadas e outras formas de nos sacanear, complicando bastante o simples ato de ir e vir.

Sabe aquele jogos de equilíbrio, tipo Road to Ballhalla, nos quais controlamos uma bolinha e devemos evitar obstáculos e rolar por ambientes mega desafiadores? Skully é tipo isso, mas transformado em um jogo de plataforma 3D.

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Rampas inclinadas? Tem, também!

E vou te contar uma coisa: há uma razão para controlamos basicamente personagens humanoides e animais antropomorfizados nesse tipo de jogo. Ter pernas e pés faz toda a diferença! Os trechos de plataforma de Skully podem ir de desafiadores a frustrantes muito rapidamente, simplesmente porque é bem difícil manter o personagem estável, sem que ele role para onde não devia (geralmente água) e bote tudo a perder.

Some isso a um sistema de checkpoints bem irregular (que te obriga a rejogar trechos longos caso falhe), e o que temos é um jogo que pode acabar mais frustrando do que divertindo o jogador.

Golens de Barro

Falando em checkpoints, estes são representados por poças de lama. Conforme a aventura avança, vamos encontrar também algumas poças “especiais”, que nos permitem criar golens de barro, cada um com sua própria utilidade tanto na locomoção quanto na resolução de puzzles.

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Esse é o golem fortão

Há um lento e fortão capaz de derrubar certos tipos de paredes, um monstrinho pequeno e ágil capaz de correr e mover horizontalmente certos tipos de plataformas, e uma terceira criatura de barro, que pode dar pulos duplos e mover verticalmente algumas plataformas.

Em um primeiro momento, o jogo nos apresenta estes monstrinhos de forma isolada, para que possamos aprender as habilidades de cada um deles. Porém, conforme a campanha avança, vamos precisar combinar as habilidades deles, o que vai tornando os puzzles mais elaborados.

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Outro golem, movendo uma plataforma

Como Skully pode criar mais de um golem ao mesmo tempo — e “entrar” e “sair” do corpo deles — logo estaremos mantendo plataformas horizontais em uma posição com um monstrinho, enquanto manipulamos plataformas verticais com outro, para que possamos derrubar uma parede com o terceiro e só então podermos progredir. Parece um pouco trabalhoso (de fato é), e acho que aí reside o principal problema de Skully: ele simplesmente não é divertido.

Fator diversão

Ok, nem todo jogo precisa ser “divertido” — e há ótimos exemplos de jogos que fazem a gente passar raiva, ou nos deixam emocionalmente devastados, mas aqui temos um jogo de plataforma, gênero que nos entregou mascotes lendários como Sonic, Crash Bandicoot, Super Mario e Rayman. Cada um destes jogos é desafiador à sua maneira, mas eles também são divertidos, estimulantes.

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Trechos como esse podem se tornar bem frustrantes

Skully falha nesse ponto: seu maior diferencial — o fato do personagem rolar — acaba virando seu maior problema, pois torna seus trechos de plataforma frustrantes. Para piorar, toda essa logística de alternar entre os golens para resolver um puzzle simples sempre parece trabalhoso demais. O resultado é um jogo que tem carisma, mas não consegue realmente cativar o jogador.

Acho que Knack, jogo da Sony que iniciou a geração, sofre do mesmo problema: tem carisma, esforça-se para ser criativo, mas parece que sempre falta alguma coisa. Lá a questão nem era a dificuldade, mas em Skully isso se sobressai, especialmente por quão frustrante ele pode se tornar.

Audiovisual

Skully não é um jogo de alto orçamento, mas também está longe da simplicidade experimental dos indies: temos aqui um jogo muito bem resolvido esteticamente, com uma direção de arte interessante e gráficos 3D bem bonitos, ainda que se tornem um tanto repetitivos ao longo da campanha.

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A água é particularmente bonita… e letal

Skully não fala, mas lembra das divindades elementais que mencionei lá em cima? Elas conversam bastante, e o ótimo trabalho de dublagem concede muita personalidade a cara uma delas. Só é bizarro que durante o gameplay a gente nunca veja estes personagens: ouvimos elas discutindo, mas são só vozes, os personagens mesmo só aparecem nas breves cutscenes parcialmente estáticas que desenvolvem a história.

A trilha sonora de Skully também é simpática, mas não memorável: são músicas instrumentais com uma pegada meio tribal — estilo Donkey Kong, mas sem a mesma qualidade. Ah, e o jogo possui legendas e menus em português brasileiro.

Conclusão

Eu realmente queria ter gostado de Skully. Gosto de jogos de plataforma 3D e valorizo muito aqueles que tentam ser criativos, trazendo mecânicas e personagens diferenciados — como Snake Pass, por exemplo, onde devemos literalmente rastejar pelo chão como uma cobra, e que constrói todas as suas mecânicas em torno disso.

Análise Arkade: Skully e a falta de equilíbrio entre carisma, desafio e frustração
Eu queria ter gostado mais de você, Skully

Porém, cada vez que estes jogos que tentam inovar falha de alguma maneira, eles também mostram porque os clássicos do gênero se tornaram clássicos: não basta ter carisma, a experiência precisa ser gostosa de jogar para manter o jogador interessado, e o delicado equilíbrio entre desafio e diversão contribui muito com isso.

Quando se tem só desafio, sem diversão, o que sobra? Fazendo uma metáfora com a situação do protagonista, sobra apenas uma casca vazia, um crânio que foi reanimado, mas que na verdade é só barro, e se esvai na primeira poça de água.

Skully está disponível para PC, Playstation 4, Xbox One e Nintendo Switch.

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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