Análise Arkade: Stela traz uma jornada (estilo Limbo) por um mundo em decadência
Era uma vez uma produtora de games chamada Playdead. Ela produz poucos jogos, mas seu estilo é bastante característico, de modo que invariavelmente surgem “clones” de suas criações. Alguns bons, outros nem tanto.
Se a From Software iniciou o subgênero “Souls-like”, acho que seria justo rotular a Playdead como criadora do subgênero “Limbo-like”, aka jogos parecidos com Limbo tanto em sua temática quanto em sua jogabilidade.
Você sabe: jogos 2D (ou 2.5D, pegando carona em Inside) um tanto obscuros, onde controlamos um personagem indefeso que precisa fugir e se esconder, resolvendo alguns environmental puzzles aqui e ali.
Quem é Stela?
Stela é o mais novo jogo deste subgênero, e é produzido pela SkyBox Labs, co-produtora do vindouro Halo Infinite. O jogo não nos explica muita coisa, mas em sua breve duração (cerca de duas horas), consegue transportar o jogador para um mundo tão misterioso quanto hostil, enquanto obriga-o a seguir sempre em frente, com pouco tempo para respirar ou olhar para trás.
Stela parece ser uma humana que está testemunhando o fim de um outro mundo. Não falo de “Armageddon”, mas de algo substancialmente mais simples, mas nem por isso menos dramático.
Quem já leu “A Torre Negra” deve estar familiarizado com a expressão “o mundo seguiu adiante”. É mais ou menos isso o que está rolando aqui: o mundo do game seguiu adiante, e o que ficou para trás é ruína, fogo… e um punhado de monstros bizarros.
No papel de Stela, devemos seguir sempre em frente, nos escondendo de monstros variados e evitando armadilhas, enquanto atravessamos florestas em chamas, templos subterrâneos, planícies nevadas e muito mais.
Gameplay
Stela é um jogo mecanicamente simples; as ações que podemos fazer caberiam em um controle de Nintendinho. Podemos andar para a esquerda ou para a direita, pular e agarrar/arrastar coisas. A movimentação é 90% no plano 2D, embora ocasionalmente possamos usar degraus que estejam “no fundo” do cenário.
Dada esta simplicidade, o desafio está em sobreviver: mover-se no ritmo certo para não ser visto, chegar ao lugar certo para não ser flagrado dando bobeira, arrastar algo para o ponto certo a fim de criar um degrau ou criar uma passagem.
Tudo é simples e intuitivo, mas o jogo ganha pontos por seu timing implacável: você nunca está “tranquilo”, nem tem tempo para respirar. Há sempre algo te perseguindo, te vigiando, te espreitando das sombras. Como diz o ditado “jacaré que dorme vira bolsa”. Se não quiser virar bolsa, melhor não dormir no ponto.
Apesar desta dinâmica acelerada, Stela não é um jogo frenético, e estudar o cenário é parte da experiência. Na área de gelo, por exemplo, devemos espantar medonhas criaturas que rastejam sob a superfície tocando grandes gongos. Alguns deles estão destruídos, então você deve dar um jeito de fazê-lo soar “no improviso”. São puzzles simples, mas bem integrados ao ambiente e ao contexto do jogo.
Também há puzzles nos quais devemos rotacionar coisas para que revelem uma silhueta específica (pense naquelas esculturas/quadros de Resident Evil 7). A última área do jogo é a mais psicodélica, sendo quase um labirinto de passarelas e plataformas móveis que demandam uma ordem certa de ativação para serem superados.
No conjunto da obra, eu gostei da experiência de Stela. Ele é relativamente mais curto do que outros jogos do gênero — tipo Little Nightmares ou o próprio Inside — mas condensa bem um bom conteúdo em sua curta duração. Não há tempo para encheção de linguiça, a jornada de Stela é ágil e sem rodeios.
Audiovisual
Stela não vai ganhar nenhum prêmio de jogo mais bonito do ano, mas faz coisas interessantes dentro do que se propõe. A escala é o mais impressionante, e a forma cinematográfica com que a câmera ocasionalmente se afasta para nos mostrar como somos pequenos naquele mundo é bem impactante.
As animações da protagonista tem aquele aspecto realista de clássicos como Prince of Persia e Flashback, ainda que sua movimentação seja bem menos dura. É legal, faz Stela parecer real. O jogo aposta tanto nisso que de vez em quando saber a diferença entre saltar de um degrau ou descer devagar pela beirada pode salvar a sua vida. Esta preocupação com o impacto do peso da protagonista sobre uma superfície não é algo muito comum de se ver em games, e achei uma ótima sacada.
No mais, temos um jogo que não é escuro como Limbo ou Inside, mas sempre tem uma atmosfera carregada, quase opressiva. Há diferentes tipos de criaturas que nos perseguem no decorrer do jogo — de enxames de besouros a humanoides altos com uma vibe meio Slender Man, passando até por um bando de cobras gigantes. Este não é realmente um jogo de terror, mas ele sem dúvida brinca com conceitos bem perturbadores.
Stela é um jogo sem textos ou falas, que deixa com a trilha sonora e os efeitos sonoros a missão de ambientar o jogador. E ele faz isso muito bem, mesclando momentos quase mudos a trilhas crescentes e intensas que coroam os momentos mais intensos da campanha. O áudio faz um excelente trabalho em proporcionar imersão.
Conclusão
Como dito no início deste texto, eu realmente acho que Limbo criou um subgênero, e Stela é mais um bom representante deste subgênero. Se você vai gostar dele ou não, depende do quanto você gosta desse tipo de jogo. Eu particularmente acho bem legal, e por isso, gostei do que Stela entregou.
Entendo que a curta duração do game pode fazer alguns torcerem o nariz, mas eu não gosto de mensurar qualidade por número de horas jogadas — pelo contrário, acho que um jogo excelente de 2 horas pode ser muito mais satisfatório do que um jogo mediano que se arrasta por 40 horas.
De qualquer modo, se você curte “Limbo-likes” e está em busca de uma nova jornada tensa, obscura e intensa, Stela sem dúvida é uma boa opção. Não acrescenta nada realmente inovador à receita, mas faz o que se propõe com qualidade.
Stela está disponível para Apple Arcade e chega amanhã (17/10) ao Xbox One (versão analisada). No início do ano que vem, o game deve chegar aos PCs.