Análise Arkade: Tekken 8 é o ápice de uma grande franquia
Sabia que a série Tekken entrou para o Livro dos Recordes como a franquia de videogame com “história mais longa, sem lacunas de desenvolvimento ou reboots”? Pois é, e Tekken 8 chega para dar continuidade às tretas entre os Mishima e os Kazama.
Uma treta absurda (mas divertida)
Quem jogou Tekken 7 deve se lembrar que o jogo parecia meio que concluir a história do clã Mishima — ou pelo menos de seu patriarca, Heihachi. O modo história do game anterior colocou até o Akuma na treta e, no geral, apresentou uma história interessante.
Tekken 8 chega para mostrar que aquilo definitivamente não era o fim. Sem Heihachi na jogada, seu herdeiro, Kazuya, assume o papel de vilão da história. Megalomaníaco, ele desperta seu demônio interior para subjulgar a humanidade… mas claro que, ao invés de simplesmete explodir tudo, ele resolve organizar uma nova edição do The King of Iron Fist Tournament, para que os maiores lutadores do mundo tenham a chance de desafiá-lo.
A trama, porém, vai muito além do torneio em si, e envolve o vilão dando um jeito de ficar ainda mais poderoso e demoníaco… e os esforços de velhos e novos lutadores da franquia para impedir seu plano maquiavélico. Nossa esperança reside em Jin Kazama, que precisa se reconectar com seu próprio demônio interior se quiser ter alguma chance contra Kazuya.
Com 15 capítulos repletos de cenas em CG mirabolantes, o modo História de Tekken 8 é ridículo — mas falo isso como um elogio! A história não tem medo de ser absurda e cafona. Clichês como “o poder da amizade” acontecem a rodo, e algumas cenas são tão exageradas que parecem saídas diretamente de um anime — ou de um jogo tipo Bayonetta.
Se não acredita em mim, veja Jin arremessando uma moto para derrubar um helicóptero (?!) neste trecho inicial da História:
Apesar de absurda, a trama do jogo é interessante, e deve agradar a quem está acompanhando a mais longa narrativa de um videogame. Sem contar que, uma grande revelação no final — e uma enigmática cena pós-créditos — deixam claro que essa história ainda está longe de acabar.
Um ponto positivo é como a trama incorpora bem boa parte do elenco de Tekken 8. Na minha análise de Tekken 7, apontei que sua história ignorava a maior parte dos personagens famosos (e ainda dava destaque para o “convidado” Akuma). Aqui, embora as estrelas sejam os rivais Jin e Kazuya, diversos outros rostos conhecidos como Paul, Raven, Xiaoyu, King, Law e Nina também têm relevância.
Também achei interessante a pluralidade de idiomas que é representada. Os personagens japoneses falam japonês, mas se um personagem é francês, ele fala francês, e um alemão fala (pelo menos um pouco de) alemão. No mínimo, há um sotaque carregado no inglês, caso do árabe Shaheen, por exemplo. Ok, nas cutscenes todo mundo é poliglota e conversa de boas mesmo com essa mistureba de idiomas, mas achei legal o respeito à nacionalidade de cada personagem.
Jogabilidade familiar, mas refinada
Tekken é uma série que sempre se manteve fiel ao seu estilo diferenciado de controle. Enquanto outras franquias igualmente relevantes apostam em “soco fraco, médio e forte” (caso de Street Fighter), ou “chute alto e chute baixo” (como em Mortal Kombat), a Bandai Namco segue firme no esquema “soco esquerdo/soco direito” e “chute esquerdo/chute direito”.
Esse mapeamento de botões uma das marcas registradas da franquia, e, ainda que abra brechas para um button mash quase desonesto com alguns personagens — quem nunca macetou os botões de chute com o capoeirista Eddy Gordo só para vê-lo rodopiando e fazendo miséria com o adversário? –, também consegue ser bastante profundo e estratégico nas mãos de jogadores experientes.
(Eddy, aliás, não está presente em Tekken 8… ainda. O brasileiro já está confirmado como primeiro lutador via DLC, e deve chegar ao game nos próximos meses).
Outra característica de Tekken é a escassez de magias e projéteis, bem como a recriação minuciosa de estilos de luta e movimentos menos comuns em videogames, como o drunken fist, o baguazhang e a própria capoeira. Tudo isso segue presente aqui. A plasticidade das lutas de Tekken 8 impressiona, e sem dúvida é um dos destaques do título.
Para apimentar as lutas, temos o Heat Mode — um medidor azul que fica abaixo da barra de vida e, quando ativado, potencializa seus ataques e possui nuances que podem virar a mesa em um round complicado. Além disso, temos as Rage Arts, que são os golpes supremos de cada personagem e só podem ser utilizados uma vez por round, quando estamos com a vida “no vermelho”.
Mecanicamente, Tekken 8 é muito familiar, mas está claro que o gameplay foi refinado ao extremo: está mais “macio” e responsivo do que nunca. O game acabou de sair, mas já está sendo abraçado pela comunidade competitiva, e tenho certeza de que veremos muitas partidas memoráveis nas próximas edições do EVO.
Tekken 8: Acessibilidade feita do jeito certo
Ainda falando da jogabilidade, vamos falar de acessibilidade. Em minha análise de Street Fighter 6, eu meio que “critiquei” a forma com que o estilo de controle Moderno “substitui” o jeito clássico de se jogar Street Fighter, jogando para escanteio os comandos clássicos, como o lendário “meia lua + soco”.
Verdade seja dita, praticamente todo jogo de luta dos últimos anos tem algum modo de controle facilitado ou acessível. E isso é ótimo, afinal, é bom que jogadores com alguma tipo de restruição motora possam se divertir e jogar bonito.
Porém, em geral, eu não curto a forma arbitrária como esses controles são implementados. A gente sempre precisa escolher entre um e outro, o que acaba mudando muito a vibe do jogo. Em alguns casos — como no Street Fighter 6 –, as mecânicas clássicas são ignoradas, e um jogo que costumava ser técnico acaba tornando-se simples até demais. Com isso, sinto que “a essência” do gameplay acaba se perdendo.
Tekken 8, felizmente, aposta em uma abordagem de acessibilidade muito interessante e menos intrusiva. E o mais legal: o novo padrão de controle é acionado a qualquer momento com o pressionar de um botão. Não é necessário escolher um padrão em detrimento de outro. Na verdade, os dois estilos de controle meio que acabam se complementando.
O padrão de botões tradicional de Tekken segue o mesmo: no PS5, △ e ▢ correspondem aos socos, O e X são os botões de chute. Porém, o L1 aciona o modo facilitado. Aí não tem mais essas regras. O △ , por exemplo, vira um botão de launcher (para iniciar air combos), e uma sequência de ▢, ▢ , ▢ cria combos incríveis, com direito a finalizações especiais e tudo.
O mais legal é que, como Tekken 8 é um jogo bastante técnico, essa facilidade de alternar entre os dois tipos de controle permite que você crie seus próprios combos, começando com o layout tradicional e mudando para o mais acessível. Não consigo conceber a “bruxaria” de programação que os produtores criaram para isso funcionar de forma tão fluida, mas o resultado é incrível. Espero que a acessibilidade de Tekken 8 sirva de referência para outros fighting games no futuro.
Customização e Modos de jogo
Tekken 8 é um jogo de luta bastante recheado de conteúdo. Além do Modo História que já discutimos acima, ele tem histórias individuais dos personagens, com direito a cutscene de encerramento, e tudo. Vale ressaltar, queo game já chega com um elenco respeitável de 32 lutadores. A maior parte deles são veteranos da série, com alguns vindos dos jogos mais recentes. Os personagens 100% novos são 3: Azucena, Reina e Victor.
O Arcade Battle é aquele hub online que diversos jogos de luta já trazem, e tira proveito de um netcode com rollback para garantir uma jogatina estável. Favor não confundir com o Arcade Quest, que é um modo de jogo single player onde você cria e customiza seu avatar para enfrentar uma série de batalhas, com direito a historinha e tudo.
Falei da customização ali em cima, e olha: se você gosta de criar personagens malucos, Tekken 8 é o seu jogo. O sistema de personalização é muito robusto, com toneladas de opções de trajes e acessórios. E, quanto mais você joga, mais libera conteúdos para customizar ainda mais seu lutador. A comunidade já está reproduzindo diversos personagens famosos no jogo, olha só:
Uma novidade muito interessante é o modo Super Ghost Battle, que funciona como um modo de treinamento intensivo que derruba as barreiras entre online e offline.
Funciona assim: vamos dizer que você está apanhando muito do Kazuya nas partidas online. No Super Ghost Battle, o jogo vai lhe permitir baixar dados de jogo de bons jogadores de Kazuya. Assim, você poderá praticar contra um Kazuya que emula o estilo de jogo dos seus rivais, podendo experimentar táticas variadas para virar o jogo. Uma adesão muito interessante que, espero, seja “copiada” por outros jogos.
Tekken 8 também possui um acervo absurdo de conteúdos sobre a franquia como um todo. Todas as músicas dos jogos anteriores estão aqui. E há muitos vídeos e artes conceituais desbloqueáveis. Ah, e por último, mas não menos importante, o “vôlei de praia” Tekken Ball Mode está de volta, e funciona tão bem quanto nos tempos do saudoso Tekken 3.
Audiovisual
Tekken 8 é o primeiro jogo de luta a utilizar a Unreal Engine 5. E, ouso dizer, ele faz um ótimo uso do motor gráfico. Visualmente, Tekken 8 é deslumbrante e, por ser exclusivo da nova geração (PS5, Xbox Series e PC), está livre das amarras e limitações técnicas que seus principais concorrentes apresentam.
Não que Street Fighter 6 ou Mortal Kombat 1 sejam feios — longe disso. Mas Tekken 8 tem mais “cara” de nova geração. Há muito mais detalhes, mais partículas, mais elementos na tela. E os produtores tiram proveito do potencial da engine, colocando roupas e tecidos extravagantes nos personagens. Certos lutadores chegam com visuais repaginados — caso de Paul, que abandonou seu icônico moicano — mas todos estão incrivelmente modelados, com uma riqueza absurda de detalhes.
Os cenários também são incríveis, com muita coisa acontecendo enquanto a porradaria come solta. O piso de vidro rachando ou as pedras voando com o impacto dos golpes são detalhes extremamente charmosos, que deixam a pancadaria muito mais “crocante”.
Mais do que um jogo bonito, Tekken 8 é bem animado e fluido. No PS5, roda liso em 60 fps, sem engasgos ou travadinhas. Os loadings existem, mas são super rápidos. Numa partida Versus local, escolhidos os personagens, não se passam nem 5 segundos para a luta começar.
Tão impactante quanto o visual e a parte técnica de Tekken 8 é seu departamento sonoro. E “impactante” aqui é a palavra, pois os sons de pancadaria são altos e satisfatórios. Você realmente sente o impacto, o poder dos personagens, a cada golpe.
A trilha sonora segue sendo boa e muito variada — e a presença de TODAS as músicas da franquia, que podem ser colocadas para tocar aleatoriamente durante a jogatina — agrega ainda mais valor ao acervo. As dublagens são boas, e novamente ressalto a pluralidade de idiomas que o jogo abraça, especialmente nas (muitas) cutscenes do modo história.
Conclusão
Tekken 8 é um pacote completo. Um jogo de luta robusto, com muitos modos de jogo, audiovisual espetacular e jogabilidade impecável. Sua história é pura galhofa, mas nem considero isso um problema. E, a forma como o jogo incorpora seu estilo de controle acessível é simplesmente genial — mais um avanço que espero ver a indústria replicando daqui para a frente.
Se há um ponto “negativo” a ser apontado, é a ausência de alguns personagens icônicos, mas talvez essa nem seja uma queixa justa. Em uma série tão longa, com tantos lutadores emblemáticos, é simplesmente impossível agradar a todos. Pessoalmente, sinto falta de Eddy Gordo (que vem aí) e de Lei Wulong. E, claro, a ausência de Heihachi faz sentido na trama, mas ele é uma figura que sem dúvida faz falta.
Tekken 8 está sendo apontado como o melhor game da franquia, e isso não é exagero. Em todos os aspectos, ele representa o ápice de uma série que sempre foi muito consistente. Quem gosta do universo de Tekken e acompanha a série desde os anos 90 tem toneladas de conteúdo (de qualidade) para se manter entretido por muuuito tempo.
Tekken 8 está disponível para PC, Playstation 5 (versão analisada) e Xbox Series X|S. O game possui menus e legendas em português brasileiro.