Análise Arkade – Ender Lilies: Quietus of the Knights, um excelente mix de MetroidVania com Souls-Like
Os MetroidVanias estão mais em alta do que nunca nos últimos anos. O Souls-like é outro gênero que só ganhou força. Jogos que misturam as duas fórmulas podem ser muito bons — vide o incrível Hollow Knight. E agora temos um novo MetroidVania/Souls-like excelente: com vocês, Ender Lilies: Quietus of the Knights.
A criança & o cavaleiro negro
Ender Lilies é aquele tipo de jogo que parte de um clichê para ser o pontapé inicial de sua jornada, mas que vai ficando mais rico e interessante conforme a história avança.
Controlamos uma garotinha, branca e pura, que acorda no “País do Fim“, lugar desolado e sombrio, que foi assolado por uma Corrupção maligna, que chegou na forma de uma chuva mortal permanente, que transformou as pessoas em criaturas sinistras.
A garotinha é a descendente da sacerdotisa branca, e tem uma centelha de seu poder purificador, que é o que pode liberar as almas do tormento eterno da Corrupção. Porém, ela é uma criança indefesa, então, vai precisar de uma mãozinha para se virar em meio aos monstros.
Seu primeiro defensor será o espectro do Cavaleiro Negro, guerreiro que reconhece nela a essência da sacerdotisa branca, e vai ajudá-la em sua jornada purificadora. Conforme avançamos, poderemos “recrutar” outros espectros, e é aí que Ender Lilies apresenta o seu conceito mais interessante.
Combate espectral
Quem já jogou o excelente Devil May Cry V deve se lembrar do V, novo personagem que é um summoner: ele não entra diretamente em combate, mas evoca seus “amigos” demônios para lutarem em seu lutar.
Ender Lilies faz algo parecido: praticamente todo chefe e subchefe do jogo, depois de vencido e purificado, entra para o nosso time, podendo ser conjurado para ajudar tanto no combate quanto na exploração. Podemos deixar 6 espectros equipados simultaneamente, (em dois “packs” com 3 espectros cada, que podem ser alternados ao pressionar de um botão) cada um atrelado a um botão de ação.
O Cavaleiro Negro, nosso primeiro aliado, ataca com combos simples de espada. Como sua habilidade não tem cooldown, ele acaba sendo nossa melhor forma de ataque direto. Mas há dezenas de outros espectros, que possuem ataques à distância, habilidades de suporte, e muito mais.
O lance é que, ao contrário do V em Devil May Cry, Lily não pode ficar longe do combate, uma vez que os espectros aparecem no lugar onde ela está. Ou seja, para que os ataques curtos acertem os inimigos, ela precisa estar perto deles.
Lily é extremamente frágil — e os inimigos batem forte –, então isso agrega um fator de risco x recompensa aos combates, pois, para seus ataques serem efetivos, você precisa se colocar ao alcance dos adversários. Lily é capaz de pular, se esquivar e se curar, mas de resto, ela precisa de seus amigos espectrais para efetivamente causar dano nos inimigos.
A variedade de espectros que reunimos em nosso “exército” é o que dá um gostinho muito especial aos combates. Há espectros que servem como parry, outros explodem, alguns causam dano em área. Como boa parte deles têm cooldown ou algum outro tipo de limitação — os que atiram, por exemplo, tem um número limitado de projéteis para disparar –, há um fator estratégico atrelado ao seu uso no calor dos combates.
Todos os espectros que nos acompanham podem ser melhorados, ainda que o recurso necessário para fazer os upgrades seja bem escasso: há 3 tipos de pontos de experiência diferentes, e cada fantasma usa um tipo. Inevitavelmente vamos acumular mais companheiros do que pontos, então os nossos primeiros aliados invariavelmente serão os mais utilizados, pois teremos investido mais tempo (e pontos de upgrade) neles.
Por fim, vale ressaltar que, no melhor estilo Souls-like, “descansar” para salvar o jogo revive todos os inimigos das redondezas (menos os chefes). E nossa habilidade de cura é uma reza, que é um consumível, que deve ser “preenchido” nos checkpoints. Morrer nos leva de volta ao último checkpoint que encontramos, o que pode ser bem longe, então, a cautela se faz ainda mais necessária.
Um mundo para se perder (literalmente)
MetroidVanias têm, em sua essência, uma característica de “ir e vir”. A gente passa várias vezes pelos mesmos lugares, e vai ganhando habilidades que nos permitem explorar ainda mais. Ender Lilies faz tudo isso, mas é um jogo que definitivamente não pega o jogador pela mão.
Seu mapa é amplo, expansivo e cheio de possibilidades, mas nunca há um lugar específico para irmos. Como nossa função é purificar aquele mundo, qualquer lugar que a gente vá, vai haver algum ser corrompido esperando para ser purificado. Claro que há uma ideia de “seguir em frente” intrínseca à experiência… mas o caminho para frente precisa ser descoberto.
O lance é seguir explorando, dando cabo dos bosses e aumentando nosso exército espectral. Até porque, diversos fantasmas são úteis também fora dos combates: um deles pode destruir certas barreiras vermelhas, outro nos permite mergulhar (o que abre muitas novas possibilidades de exploração), e por aí vai.
Sem indicações claras, nem missões definidas, é normal a gente ficar perdido em Ender Lilies. O mapa do jogo é praticamente um fluxograma, mas ele não mostra quantas saídas ou segredos existem em cada sala. Quase todos os subchefes são opcionais: ficam em caminhos sem saída, que você só vai encontrar explorando, e podem passar batido se você não for “curioso”.
Confesso que o excesso de tempo que passei perdido me deixou um pouco de saco cheio em alguns momentos. Eu queria poder colocar “pins” no mapa, ou qualquer coisa que me ajudasse a me localizar. Invariavelmente eu encontrava novos lugares para explorar, mas sinto que perdi muito tempo vagando a esmo, sem saber para onde ir — felizmente, há um sistema de fast travel entre os checkpoints que agiliza (um pouco) as coisas.
Audiovisual
Ender Lilies é um jogo belíssimo. Sua estética gótica/dark fantasy não é nada inovadora no mundo dos games, mas é muito bem executada. As animações não são particularmente fluidas, mas tudo é harmonioso dentro da proposta do jogo.
O design dos monstros corrompidos é um show à parte: o character design é muito criativo, com criaturas que misturam características de animais, plantas, fungos e insetos. E muitos dos chefes sofrem mutações ao longo dos combates, ficando ainda mais escabrosos. A própria Lily, que está absorvendo a Corrupção do mundo, vai ficando mais bizarra conforme purifica o mundo.
A trilha sonora do jogo é melancólica, com muitas melodias de piano que contribuem com a atmosfera lúgubre do game. Senti falta de vozes, gritos, falas ou qualquer outra coisa do tipo: salvo os sons de projéteis, feitiços e ataques (que não se destacam), Ender Lilies é um jogo muito silencioso, na maior parte do tempo.
Vale ressaltar que, embora seja um jogo indie de um estúdio japonês, Ender Lilies está 100% localizado para o nosso idioma, com menus e legendas em português brasileiro. Isso comprova que uma empresa só não localiza seus jogos por falta de vontade, mesmo (cof, Nintendo, cof).
Conclusão
Ender Lilies é um jogo incrível. Ainda que não seja particularmente inovador — até porque não esconde suas inspirações em Hollow Knight e Dark Souls –, ele traz uma mecânica de combate muito interessante, e faz tudo o que se propõe a fazer com muita competência.
Pessoalmente, gostaria que ele desse indicações mais claras do que devemos fazer ou para onde ir. Meu tempo para games anda curto ultimamente, e quando passo 1/3 desse tempo perdido, sinto que não estou aproveitando bem a experiência. Mas, isso é questão de gosto, e sei que muita gente vai gostar de “se perder” no mundo gótico do game.
Quem gosta de MetroidVanias sem dúvida está bem servido nos últimos anos, e esse é mais um jogo que merece entrar para a wishlist. Sua história é singela, seu mundo é grandioso, e seu sistema de combate é ótimo. Tem tudo para estar entre os melhores indies de 2021.
Ender Lilies: Quietus of the Knights já está disponível para PC, Xbox One e Xbox Series (versão analisada) e Nintendo Switch. Esta semana, ele chega ao Playstation 4.