Análise Arkade: Super Meat Boy Forever muda a essência de um clássico indie

4 de janeiro de 2021
Análise Arkade: Super Meat Boy Forever muda a essência de um clássico indie

10 anos. Este é o tempo que levou para o Team Meat lançar a sequência de Super Meat Boy, um dos indie games que iniciou o “hype” dos jogos independentes e ajudou a consolidar a ideia de que estúdios pequenos podem lançar grandes jogos.

Aos 45 do segundo tempo, em 23 de dezembro de 2020, Super Meat Boy Forever foi lançado… e ele é um bocado diferente do primeiro game. Venha saber mais em nossa análise completa!

Salvando o bebê

No Super Meat Boy original, a namorada do nosso herói — sagazmente chamada de Bandage Girl — era sequestrada pelo maquiavélico Dr. Fetus, e nossa missão era superar os insanos desafios do game para salvá-la.

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No novo game, Super Meat Boy e Bandage Girl já tem um filho, Nugget, um simpático, fofo e inocente bebê… que é a presa perfeita para o Dr. Fetus, que vai fazer o possível para separar a criança de seus pais.

A história do jogo segue sendo simples e bobinha, mas tem esse conceito de ser uma evolução do conceito original: os personagens evoluíram, seguiram com as suas vidas… menos o Dr. Fetus, claro, que segue na fissura de raptar alguém da família, e vai colocar todo tipo de obstáculo no seu caminho para complicar a vida da gente!

Um jogo… diferente

Super Meat Boy ficou muito famoso por sua dificuldade hardcore. Ele é um jogo de plataforma 2D com gameplay muito bem calibrado, e seu implacável nível de desafio exige reflexos rápidos e “sangue no olho”. O jogador tinha total controle sobre o personagem, podendo correr, pular, deslizar e pular entre paredes, e por aí vai.

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Super Meat Boy Forever ainda é um jogo muito difícil… mas ele dá menos controle para o jogador. Na prática ele é um “auto runner”, no estilo da série Bit.Trip.Runner — e de centenas de jogos de celular, de Canabalt a Super Mario Run –, ou seja: o personagem corre automaticamente o tempo todo, e o nosso trabalho consiste em pular, deslizar, bater… enfim, evitar todo tipo de obstáculo para não morrer. Uma variação bem popular deste gênero é o “endless runner”, jogos nos quais seu objetivo é ir o mais longe que conseguir, superando seus próprios recordes.

Em Super Meat Boy Forever, você segue automaticamente para a direita, e só pode mudar de direção quando o jogo permite fazer isso (ou quando ricocheteia numa parede para o lado esquerdo, por exemplo). O level design faz um bom trabalho em nos manter “no caminho certo”, e quando precisamos virar, ele nos dá ferramentas que permitem isso — há até um power up que permite que seu golpe no ar “faça uma curva — ou exigem que você seja criativo para progredir.

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O “mundo das trevas” e as dezenas de personagens desbloqueáveis aumentam o fator replay

Outro ponto importante: embora ainda seja um jogo de fases, ele é um jogo parcialmente procedural. Explicando: cada mundo do jogo tem “pedaços” avulsos, que são combinados aleatoriamente a cada fase para criar algo único e novo. Há o mesmo número de fases para todo mundo, mas as fases não serão idênticas para todos (deu para entender?). É uma maneira interessante de explorar o level design procedural… mas, por outro lado, também tira o brilho do level design “feito à mão”, que era um dos grandes destaques do primeiro Super Meat Boy.

Vou deixar um breve vídeo de gameplay aqui para exemplificar isso, incluindo algumas falhas. Ao assistir o vídeo, tenha em mente que o ato de correr é automático, então o que o jogador precisa acertar é mais a questão de timing dos pulos, esquivas e ações. Os “cristais” coloridos devem ser coletados para mudar a direção do seu golpe, permitindo que você evite obstáculos e alcance outros lugares:

A forma como o jogo exige que você use todos os seus recursos para superar os obstáculos é um grande acerto: seu soco serve para bater em inimigos, mas também tem a função de “boost”, sendo útil especialmente no ar. A deslizada no chão evita obstáculos, mas também é um golpe rasteiro contra inimigos terrestres. Cada elemento conversa com os outros, e todos juntos criam uma mecânica que é simples em sua essência, mas densa em suas possibilidades.

Isso faz com que o jogo vá além do básico dos “auto runners”, acrescentando diferentes temperos à receita: há tubos por onde podemos passar, guindastes nos quais podemos nos pendurar, plataformas que se desfazem assim que passamos e habilidades que nos teleportam alguns (poucos) centímetros para a frente. Cada mundo do jogo tem algum gimmick específico que transforma levemente a experiência de jogo, e é meticulosamente salpicada pelas fases, para ser usada na hora exata.

Precisava mudar?

Ainda que o fato de Super Meat Boy Forever ser um “auto runner” não seja necessariamente um problema, não se pode negar que parte da identidade de Super Meat Boy foi perdida nesta transição. O feeling de jogar não é mais o mesmo, uma vez que não temos total controle sobre o personagem.

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Esse sangue todo quer dizer que eu morri várias vezes aqui…

Pessoalmente, achei um baita retrocesso. Já existem diversos jogos do tipo no mercado (muitos deles gratuitos), mas jogos de plataforma 2D com o nível de desafio e a excelência de level design que Super Meat Boy apresentava são bem menos numerosos. Ele ainda é muito desafiador, e seu level design ainda é muito bom… mas nada parece tão único nem tão criativo quanto era em 2010.

E, convenhamos, mesmo jogos do tipo “auto runner” já deixaram de ser novidade há uns bons anos. Super Meat Boy Forever passou tanto tempo em desenvolvimento que aparentemente quis surfar em uma onda que já não tem mais a mesma força. Jetpack Joyride — talvez um dos primeiros fenômenos do gênero endless runner, também está completando uma década de vida em 2021.

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Essa boss battle parece aquela luta de Matrix Reloaded

Não me entenda mal: se você curte um jogo 2D com desafio de alto nível, Super Meat Boy Forever ainda entrega isso… mas de um jeito um pouco diferente, que talvez incomode alguns jogadores. Me incomodou, e eu achei a mudança de estilo bastante questionável.

Audiovisual

Mantendo o visual fofinho e sangrento que é característico da franquia, Super Meat Boy Forever é um deleite para olhos e ouvidos. O visual cartunesco 2D é muito bonito, e as divertidas cutscenes animadas que desenvolvem a história são muito legais.

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A trilha sonora do game é bem variada, e mantém um bom nível de qualidade: cada mundo tem uma música que combina com o seu estilo. Os efeitos sonoros também são ótimos, muitos deles bastante familiares para quem veio do primeiro jogo.

A cópia de review que recebemos foi a de Nintendo Switch, e o jogo roda muito bem no console híbrido da Nintendo, seja acoplado ao dock ou em modo portátil. Como este é o tipo de jogo que combina com partidas rápidas, o Switch é uma ótima plataforma para curtir o game daquele jeito: antes de dormir, no intervalo do almoço e (quem nunca?) no banheiro.

Conclusão

Super Meat Boy Forever claramente foi produzido com muito carinho e cuidado, pois é um jogo muito bem resolvido tecnicamente, e há muita criatividade em suas mecânicas. Porém, ele faz tudo isso mudando bastante de sua essência, e abrindo mão de sua própria identidade.

Análise Arkade: Super Meat Boy Forever muda a essência de um clássico indie

Quando se fala em “plataforma 2D harcore”, o primeiro Super Meat Boy ainda é uma das maiores (e melhores) referências. Mas quando o assunto é auto runner, há diversos jogos bons no mercado. A própria série Bit.Trip.Runner é um grande exemplo: o jogo não só é extremamente desafiador, como ainda traz um componente rítmico que é muito bem-vindo.

Enfim, o fato é que eu gostei de Super Meat Boy Forever, mas ele não é a sequência que eu gostaria para o jogo de 2010. Acredito que esse sentimento será bem comum entre os fãs mais ardorosos, mas isso não quer dizer que o jogo oferece uma experiência ruim. Ele só é… diferente. Talvez até demais.

Super Meat Boy Forever foi lançado em 23 de dezembro de 2020 para PC e Nintendo Switch (versão analisada). Em breve ele deve chegar ao Playstation e ao Xbox.

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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