Análise Arkade: Twin Mirror, o novo thriller investigativo dos produtores de Life is Strange

8 de dezembro de 2020
Análise Arkade: Twin Mirror, o novo thriller investigativo dos produtores de Life is Strange

Como milhares de outras pessoas, eu me tornei fã da Dontnod Entertainment lá em 2015, quando ela lançou a obra-prima que foi a primeira temporada de Life is Srange.

De lá para cá, eu sigo acompanhando de perto os novos projetos da empresa, mas parece que ela nunca mais encontrou o tom certo. Vampyr foi um jogo ambicioso com uma história meia-boca, e Life is Strange 2 simplesmente deixou de lado tudo o que a primeira temporada construiu para contar uma história nova — que teve lá seus tropeços.

Essa inconstância em termos de qualidade me deixava bastante cético em relação a Twin Mirror… e a fraca campanha de marketing do jogo não me ajudava a ter certeza do que esperar. Mas, uma coisa muito me animava: parecia que a Dontnod enfim estava criando um adventure com uma pegada mais adulta, sem tratar de dramas colegiais ou crianças em fuga.

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Nada contra esses temas; eu só queria ver que tipo de história a empresa era capaz de contar, se não ficasse tão presa em núcleos de personagens infanto-juvenis. Se Life is Strange tratou de temas absurdamente pesados — como violência doméstica e suicídio — tendo adolescentes como protagonistas, o que eles poderiam fazer com personagens adultos?

De volta para casa

Twin Mirror nos apresenta ao jornalista investigativo Samuel Higgs (Sam), sujeito que passou boa parte da vida na pequena Basswood. Mas sua vida por ali não estava das melhores: a garota que ele gostava não quis se casar com ele. Para piorar, uma matéria dele no jornal fechou a mina da cidade, que era fonte de emprego e renda para boa tarde da população local.

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Reencontrar a ex que te deu um fora nunca é legal…

Ele deixou a cidade sem olhar para trás, e tocou sua vida (de um jeito meio torto) em outro lugar. Porém, quando seu velho amigo Nick morre, Sam acaba sendo “obrigado” a retornar à cidade para prestar suas últimas homenagens ao amigo, sendo recebido calorosamente por uns, e com desgosto por outros.

Joan, a filha de Nick, acredita que a morte do pai não foi um acidente, e sem ter quem a quem recorrer, pede que Sam a ajude a investigar o caso. Embora não tivesse planos de se envolver, Sam vai acabar colocando seu faro investigativo para trabalhar, e invariavelmente vai descobrir alguns podres que a fachada de cidade pequena tentam ocultar.

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Como dizer “não” para uma garotinha?

Um detalhe interessante é que Sam não está realmente sozinho nessa. Acho que não é spoiler dizer isso — afinal, está no trailer do jogo: há um “outro sujeito” ajudando Sam nessa história. Não vou entrar em detalhes sobre quem ele, mas é fato que ele é uma peça importante na história.

Investigação

Twin Mirror é um adventure com uma forte pegada investigativa. Este não é um jogo de ação: nosso trabalho é conversar com pessoas e buscar pistas que nos ajudem a solucionar uma série de mistérios que, interligados, tem relação com a morte de Nick.

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Embora não seja um jogo episódico (como boa parte dos adventures recentes), a história do jogo é dividida em “cenas” que são como partes independentes de uma história maior: você faz tudo o que tiver em uma cena, para só então ganhar acesso à próxima. Há uma cena no bar, outra que nos permite conhecer o comércio de Basswood, outra em uma cabana de pesca… Você só passa por esses lugares uma vez, quando a narrativa permite que você faça isso.

Nas conversas, podemos escolher certas opções de diálogos que podem (ou não) ser úteis em nossa investigação. Também devemos explorar certos lugares em busca de pistas, e em um ou dois momentos, o jogo consegue ser bem criativo, com puzzles simples, mas que estão bem contextualizados no universo do jogo, e demandam atenção do jogador.

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Nosso trabalho envolve conversar…
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E encontrar pistas

Faz falta algo como uma “visão de detetive” para facilitar a vida da gente. Não quero que o jogo me dê as pistas de bandeja, mas algumas delas são muito pequenas, e podem acabar passando batidas — tipo cacos de vidro pelo chão, ou um arranhão em uma poltrona. O jogo ainda te obriga a centralizar um cursor (que nem sempre é visível) nos objetos para examiná-los, e esta ação simples pode dar mais trabalho do que deveria.

Palácio Mental

A maior parte de Twin Mirror se passa em Basswood, mas há uma parte importante do jogo que acontece no “Palácio Mental” de Sam. Quem joga videogame talvez já conheça o termo de Persona 5, mas ele é um conceito real, que diz respeito a um método para aprimorar a observação e a memorização.

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Sam em seu Palácio Mental revivendo uma memória

O que acontece é que, depois que Sam recolhe todas as pistas em uma cena, ele vai organizar tudo de um jeito que faça sentido em sua mente. É meio que uma “reconstituição” mental dos acontecimentos. Já vimos Murdered: Soul Suspect e até mesmo a série Batman Arkham apresentar conceitos semelhantes.

É no Palácio Mental de Sam que ele realmente desvenda os mistérios que cercam a morte de seu amigo. Conforme a história se desenrola, este recurso acaba virando quase um super poder: Sam poderá antever situações em sua mente, para agir da melhor maneira possível no mundo real — mais ou menos como naquele Sherlock Holmes do Robert Downey Jr.

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Sim, é possível jogar Pac-Man no game! 😀

É um pouco exagerado? Até é, mas funciona dentro da proposta do game. A Dontnod claramente tem uma queda por super poderes, e já que ela não consegue apresentar uma história “pé no chão”, pelo menos devemos dar o crédito de que ela sabe colocar isso de maneiras criativas em seus jogos.

Audiovisual

Para acompanhar a história mais madura, Twin Mirror traz também um visual mais realista, menos estilizado. O mundo do jogo é bonito, mas apático, cinzento, e o Palácio Mental impressiona com seu visual de vidro quebrado, cheio de fragmentos de lugares e memórias espalhados.

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Explorando Basswood

Os personagens, ainda que não sejam fotorrealistas como The Last of Us Part II, por exemplo, claramente são uma evolução do que vimos nos jogos anteriores da empresa. Por um lado, isso deixa o tom do jogo mais sóbrio. Por outro, fica evidente que falta alguma coisa: as expressões faciais simplesmente não são boas o bastante para corroborar com a tensão de certos diálogos ou situações. Não sei se é falta de orçamento ou talento, mas é fato que parte da carga dramática se perde em meio a expressões “toscas” e sincronia labial zoada.

Fora isso, o jogo tem um problema bem claro com sombras e texturas: mover a câmera faz com as sombras e texturas “pisquem”, de um jeito que não estraga o jogo, mas fica bem feio. E falo isso tendo jogado no Xbox One X, que é uma plataforma capaz de rodar jogos bem mais exigentes.

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Apesar destes tropeços, as dublagens do jogo são muito boas, e a Dontnod — como sempre — faz um ótimo uso da trilha sonora para conceituar o mundo do game. Ah, e vale ressaltar que o jogo tem menus e legendas em português brasileiro, então ninguém fica boiando na história!

Conclusão

Sendo bem honesto, eu queria ter gostado mais de Twin Mirror. No geral, achei ele um jogo ok, mas que não se destaca, nem surpreende, e mesmo uma de suas grandes revelações tem um gostinho de “sério que é só isso?” Acredito que fiz o melhor final possível baseado nas decisões que tomei, mas mesmo assim a história não me empolgou, e, no geral, foi um tanto previsível.

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Acho que o sucesso da primeira temporada de Life is Strange criou um problema e tanto para a Dontnod: na minha opinião, eles simplesmente não conseguiram criar nada tão bom quanto aquele jogo. E nem acho que foi o caso de “expectativas altas demais”, pois eu realmente não estava esperando tanto assim deste game.

No fim das contas, Twin Mirror é um thriller investigativo um tanto raso. Ele parte de uma premissa interessante, mas sofre com problemas técnicos e uma jogabilidade um pouco desajeitada. Seu maior problema,contudo, é sua história, que não foi boa nem surpreendente o bastante para ser memorável.

Twin Mirror foi lançado no início de dezembro, e está disponível para PC, Playstation 4 e Xbox One. O game possui menus e legendas em português brasileiro.

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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