Arkade VR: Rhythm of the Universe – Ionia é uma breve exploração musical
Muitos são os jogos em realidade virtual que propõem não uma jogatina frenética e complexa em termos de jogabilidade, mas sim uma experiência sensorial mais casual. Rhythm of the Universe: Ionia vai mais pela segunda opção, trazendo uma experiência mais contemplativa do que necessariamente imersiva, com conceitos interessantes, porém pouco aproveitados.
Desenvolvido pela ROTU, o game é basicamente uma experiência de pouco mais de uma hora de duração com algumas explorações básicas da realidade virtual. Felizmente, o breve tempo que passamos no mundo de Rhythm of the Universe: Ionia é interessante, principalmente pela mitologia e conceitos construídos na breve jogatina, que sempre giram em torno da musicalidade.
O Mundo de Ionia
Rhythm of the Universe: Ionia nos leva ao mundo que faz parte do título do game: Ionia. Uma mistura de fantasia com um leve toque de ficção científica faz com que o universo do game se torne algo realmente convidativo a se conhecer. Impossível não associar determinadas característica do ambiente e da filosofia ecológica do game com as que vimos no filme Avatar.
Em Ionia, estamos na pele de Allegro, um jovem mudo que acompanha sua irmã Allegra (é sério :D) a fim de salvar a criatura Harpa, um ser mítico que está ameaçado de extinção. Seguindo nossa irmã mais velha, fugimos do templo de nosso povo e começamos a vagar pelo fantástico mundo que dá nome ao jogo, entendendo um pouquinho mais de seu bioma e ecologia.
Considero o mundo do jogo e toda a mitologia criada ao seu redor o maior trunfo de Rhythm of the Universe: Ionia. Isso porque tanto o povo dos irmãos Allegro e Allegra como sua mitologia e ainda a fauna e a flora do planeta giram em torno de conceitos de música. A ideia em si é muito criativa e guia praticamente toda a jogatina, seja no enredo ou na pouca jogabilidade que o game proporciona.
Infelizmente, como dissemos na introdução dessa análise, o jogo é curto demais. E isso faz com que fiquemos meio órfãos do mundo de Ionia cedo demais, justamentequando ele ele começa a se mostrar mais interessante. Entretanto, o pouquíssimo que podemos ver do mundo retrata lugares incríveis, criaturas fantásticas e uma mitologia muito convidativa.
O problema do marketing
Importante fazer uma rápida pausa na apresentação do jogo aqui para comentar sobre algo que considero particularmente problemático em Rhythm of the Universe: Ionia. O marketing do jogo e como ele fora divulgado no geral não condiz muito com o conteúdo que temos em mãos e isso é bastante problemático.
Isso porque o game segue o padrão dos jogos clássicos dos anos 2000, com trailers cinemáticos incríveis e uma gameplay que se assemelha muito pouco ao que víamos nas apresentações. Isso por si só não seria um problema, se o game mostrasse a que veio nessas divulgações. Entretanto, tudo que é mostrado soa quase como fantasioso e exagerado se comparado ao que temos em mãos durante a jogatina.
Seja pelas cinemáticas de alto orçamento, o tom épico que a aventura insiste em apresentar, o gameplay imersivo ou o visual incrível da jogatina… Nada disso está presente na versão final do jogo. Mesmo que existam algumas semelhanças do material divulgado com o jogo final, a sensação que fica é a de que estamos jogando apenas uma demonstração do jogo, ou no máximo uma versão alfa, não seu produto final.
Pouca imersão para contemplar
Um dos pilares de Rhythm of the Universe: Ionia é a contemplação do mundo que dá nome ao jogo. Como citado anteriormente, o ambiente tem uma pegada que lembra bastante o planeta Pandora de Avatar, mas com o foco mais voltado na musicalidade. Deste modo, espécimes de criaturas incrivelmente peculiares de fauna e flora aparecem em alguns momentos específicos do jogo.
Porém toda essa contemplação deixa um pouco a desejar. Seja pelo visual levemente borrado do jogo no PlayStation VR, seja pela opacidade dos cenários em si. Poucos são os elementos que ajudam na imersão naquele mundo. Tal qual jogos de realidade virtual lançados há quatro ou cinco anos, a sensação que nós temos é de estarmos atrás de uma vitrine, olhando algo que não podemos tocar.
Isso é sentido por exemplo na movimentação que, mesmo que não seja obrigatoriamente por teleporte, possui quase nenhuma interação com o solo. Para você ter uma ideia, nem escadas podemos descer enquanto nos locomovemos, sendo obrigatório o uso do teleporte nesses casos.
A ausência do corpo nem seria um problema em si, caso tivéssemos mecânicas mais imersivas que nos fizessem ignorar tal ausência. É algo que outro jogo lançado esse ano fez muito bem: o brilhante Fracked. Infelizmente, as mecânicas que Rhythm of the Universe: Ionia apresenta não são suficientes para causar tal imersão, mesmo que sejam interessantes em sua proposta.
Conceitos que valeriam a pena
Ao ver toda essa análise de Rhythm of the Universe: Ionia, você pode pensar que o jogo é uma bomba completa. Entretanto, ele apresenta várias propostas interessantes ao longo de seu curtíssimo tempo de duração. Escalar cipós na pele de Allegro é interessante, bem como as interações com todos os instrumentos musicais com os quais esbarramos pela curta jornada.
E falando de música em si, existem alguns momentos do jogo em que esse elemento é muito bem utilizado. Por exemplo: para encontrar determinadas tabuletas e resolver um puzzle, precisamos nos atentar aos ouvidos antes de buscar contexto visual. A localização espacial dos sons dentro do jogo é a coisa mais próxima de uma imersão que temos aqui, o que é sim um ponto positivo.
Além disso, todo o conceito de misturar musicalidade com criaturas, magias e puzzles é por si só um baita acerto. Uma pena que todos esses conceitos e mecânicas são breves demais para podermos apreciá-los como eles mereceriam. Existem mecânicas que utilizamos apenas uma vez, por algo que não dura nem 5 minutos. Enquanto isso, escalar cipós e vinhas é uma mecânica constante, mas que pouco tem a ver de fato com a proposta original do jogo.
Fica assim um gosto meio amargo na boca a respeito de toda a experiência breve que Rhythm of the Universe: Ionia nos traz. É possível ver boas ideias nele, mas a sensação que temos ao jogá-lo é a de que algo deu errado no processo de desenvolvimento: muitas coisas foram cortadas, encurtadas (ou talvez removidas), sabe-se lá por qual motivo. É como ver as migalhas de algo que deveria ser uma bela flor, mas que por algum motivo foi destroçada por alguma coisa.
Curiosamente, há alguns anos tivemos outro jogo com temática musical que sofreu do mesmo problema: em 2017, Beat the Game trazia um ambiente interessante, criaturas exóticas, atividades musicais… e também durava pouco mais de uma hora.
Um jogo com gosto de demo
Rhythm of the Universe: Ionia é uma mistura de sentimentos que vai passar batido da memória da maioria dos jogadores. Com um valor não tão baixo assim, a jogatina não se sustenta principalmente por sua curtíssima duração. Para não dizer que o jogo é uma oportunidade completamente perdida, talvez ele chamasse atenção se tivesse sido lançado cinco anos atrás, época em que a própria indústria ainda estava aprendendo a lidar com o VR.
Digo isso porque suas mecânicas simples e musicais, seu mundo exótico e convidativo e sua curta duração fariam dele um excelente jogo de entrada para a realidade virtual.
Entretanto, agora em 2021, temos vários outros títulos que fazem essa introdução de modo muito mais imersivo e divertido — e, claro, oferecem experiências mais densas. Quem sabe um dia possamos revisitar o mundo de Ionia com uma nova perspectiva, pois ele possui elementos verdadeiramente cativantes.
Rhythm of the Universe: Ionia foi lançado inicialmente no dia 23 de setembro de 2021 para PC (via SteamVR) e Quest 2, chegando ao PlayStation VR um pouco depois, no dia 15 de novembro. Para esta análise, testamos o game no PSVR rodando no PlayStation 4.