Bobby Kotick, CEO da Activision Blizzard, faz pedido de desculpas, mas a situação se agrava ainda mais
O processo movido pelo estado da Califórnia contra a Activision Blizzard após dois anos de investigação de casos de assédio, abusos, racismo e proteção de nomes que incentivam um ambiente tóxico nos estúdios, levou os funcionários da companhia a enfim se abrirem a respeitos desses terríveis casos.
Muitos funcionários e ex-funcionários vieram a público comentar sobre suas infelizes experiências. E uma carta endereçada à alta cúpula da Activision Blizzard foi divulgada ao público, inicialmente contando com cerca de 800 assinaturas, mas agora superando o número de 2500 assinaturas de funcionários descontentes, com um grande grupo de funcionários organizando uma greve e passeata para exigir seus direitos, que aconteceu ontem.
Em todo esse meio tempo, grandes nomes da empresa enviaram e-mails para seus funcionários comentando os casos, com J. Allen Brack – presidente da Blizzard, e Rob Kostich – presidente da Activision, se posicionando em favor dos funcionários. Porém, Frances Townsend – diretora de Conformidade da Activision Blizzard, ignorou o assunto e enviou um e-mail criticando o processo, considerando as denúncias e alegações como “mentira”.
Porém, Bobby Kotick, o CEO da Activision Blizzard e o maior nome de todos dentro da companhia, não havia feito nenhum comentário ou declaração sobre o caso até então. Bobby Kotick recentemente esteve envolvido numa imensa controvérsia por conta da insana quantidade de dinheiro que é pago dentro da companhia. Há alguns meses, seu salário, que era de 1,5 milhão de dólares, foi diminuído para 850 mil, porém os acionistas da companhia concordaram em aumentar os bônus anuais do CEO, o que permite que ele embolse um valor de dezenas de milhões de dólares anualmente.
Enquanto isso, a Activision Blizzard ainda sente os reflexos de uma mudança interna de filosofia, que resultou na demissão repentina de centenas de funcionários em 2019 por razões de “corte de custos”. Além das denúncias do processo atual, em que é detalhado que funcionárias mulheres, negras, membros da comunidade LGBT+ e outros grupos marginalizados recebem como pagamento valores muito menores que funcionários homens dentro da companhia.
E agora, Bobby Kotick finalmente se pronunciou sobre o caso com um e-mail enviado para todos os seus funcionários. Mas é importante destacar que a resposta de Kotick só veio horas depois dos funcionários da companhia anunciarem a greve que aconteceu ontem.
No extenso e-mail enviado, que você pode ler na íntegra (em inglês) CLICANDO AQUI, o CEO reconhece que a resposta inicial da Activision Blizzard, bem como a de Frances Townsend ao processo e aos funcionários foi completamente inadequada. Ele se compromete a ajudar os funcionários em restruturar a companhia de forma a torná-la mais inclusiva e amigável com aqueles que sofreram de uma forma ou outra.
Ele cita cinco medidas que serão adotadas para a criação de um ambiente mais saudável, além de anunciar a contratação da firma de advocacia WilmerHale para investigar as políticas internas da empresa para identificar pontos que necessitam de mudança imediata.
As cinco medidas propostas são:
- Suporte a Empregados. Através da continuidade das investigações de cada alegação levantada, além da promessa de que ele não hesitará em tomar as ações necessárias para alcançar a melhoria desejada. Além da alocação de empregados sênior e recursos para os departamentos de Conformidade e Relações de Funcionários.
- Sessões de Escuta. A companhia oferecerá um espaço seguro, gerenciado por uma companhia de terceiros para que os funcionários possam falar abertamente sobre críticas e sugestões de melhorias.
- Mudanças de Pessoal. Segundo Kotick, uma avaliação dos gerentes e líderes da companhia já está sendo feita, tendo objetivo de identificar e demitir aqueles cujo comportamento esteja contra as ações de combater as ações de criação de um ambiente seguro.
- Práticas de Contratação. A gerência e o setor de Recursos Humanos recebeu a ordem de garantir que os processos seletivos de novos funcionários abriguem a diversidade em todos os cargos abertos. Além de novas políticas que serão impostas para garantir que os contratadores estejam cumprindo essa nova diretiva.
- Mudanças in-game. Conteúdos impróprios dentro dos games da empresa, que foram identificados por funcionário e por jogadores da comunidade serão removidos.
A resposta de Kotick, apesar de positiva, não foi bem aceita pelo corpo de funcionários da Activision Blizzard, por ignorar diversos pontos chave levantados durante o anúncio da greve que ocorreu ontem. Em outras palavras, segundo os funcionários as exigência principais, que já são de conhecimento de Kotick, não foram abordadas nessas cinco diretivas.
E esses pontos chave levantados pelos funcionários são:
- O fim da arbitragem forçada para todos os empregados. Em todos os contratos, atuais e futuros. Uma cláusula de arbitragem em um contrato, de forma simplificada, significa que um funcionário é obrigado a acatar uma decisão definida por um árbitro (alguém mais alto na hierarquia que foi escolhido) em casos de conflito. Isso protege os abusadores, pois cai sobre eles as decisões sobre os funcionários e sobre as vítimas.
- Participação dos trabalhadores na supervisão de contratação e promoção de políticas. Formação de uma organização de funcionários para Diversidade, Equidade & Inclusão, para participar de todas as etapas de processos seletivos. Dessa forma garantindo que mulheres, mulheres negras, mulheres transgênero, não-binários e de outros grupos marginalizados sejam contratados com chances justas em comparação a candidatos homens. Que é o contrário do que acontece atualmente.
- A necessidade de maior transparência de pagamento para garantir igualdade. Publicação de dados de compensação relativa (incluindo participação nos lucros), taxas de promoção e faixas de salário para todos os gêneros e etnias dentro da companhia.
- Escolha feita pelos funcionários de um grupo de terceiros para realizar a auditoria de Recursos Humanos e outros processos da companhia. Dar o poder à organização de Diversidade, Equidade & Inclusão de contratar uma empresa de terceiros para realizar auditorias nos diferentes processos da companhia, incluindo da equipe executiva.
Após essa resposta de Kotick, que aconteceu horas após a divulgação das quatro exigências listadas acima, os funcionários agradeceram pelo CEO reconhecer os terríveis problemas atuais, mas reiteraram que ele falhou em abordar os pontos mais críticos da questão. E prometeram continuar com seus protestos até que a Activision Blizzard volte a ser um local saudável.
Porém, após isso novas evidências da cultura de masculinidade tóxica dentro da companhia veio a tona, com várias screenshots mostrando diversos funcionários da Blizzard em uma situação registrada durante a BlizzCon 2013.
Nesse ano, durante a conferência, vários funcionários homens da Blizzard, incluindo Alex Afrasiabi, cujo nome consta no processo do estado da Califórnia, se reuniram num quarto de hotel que ficou internamente conhecido como a “Suíte Cosby“, em referência ao ex-comediante americano Bill Cosby, condenado à prisão por diversos casos de estupro.
Essa reunião foi registrada em fotos, que mostram o grupo no quarto segurando um quadro com a foto de Cosby, além de outras fotos mostrando uma enorme quantidade de bebidas alcoólicas e screenshots de conversas via chat entre o grupo, em que fazem diversos comentários sexistas sobre mulheres envolvidas na BlizzCon 2013.
As alegações de estupro cometidos por Bill Cosby já eram conhecidas em 2013, de forma que as pessoas na foto sabiam o que isso significava. E após a divulgação dessas imagens, Afrasiabi deletou muitos posts e fotos de suas redes sociais, além de diminuir sua presença online.
Outras pessoas vistas na foto, que trabalham em outros estúdios atualmente, como a Riot Games, divulgaram pedidos de desculpas sobre a ocasião, com menções de que a “Suíte Cosby” era um local de descanso e descontração durante a BlizzCon 2013, e onde aconteciam networkings com pessoas que queriam fazer negócios com a Blizzard, mas reconhecendo que a referência ao ex-comediante foi de “Muito mal gosto”.
Mais e mais informações e denúncias surgem em relação a esse caso. Aliado as respostas insatisfatórias dos líderes da Activision Blizzard e a promessa de seus funcionários de continuarem a protestar e interromper seus trabalhos até que a justiça seja feita para as vítimas e para os funcionários de uma empresa. Enquanto isso, o processo segue, com todas essas novas informações e protestos sendo integrados a ele.
(Via: Game Informer, PC Gamer, Gamasutra, Kotaku, VG24/7, Eurogamer)