CEO da Activision Blizzard volta a se pronunciar. E surge um novo processo contra a companhia
O CEO da Activision Blizzard, Bobby Kotick, voltou a comentar sobre a situação dentro do estúdio e as ações de seus funcionários contra a cultura de sexismo existente dentro do estúdio, durante uma reunião com investidores que aconteceu ontem.
Em um longo discurso, em que ele e outros líderes da companhia estiveram presentes, ao falar com acionistas, Kotick começa deixando claro que “não há lugar em nossa companhia em que discriminação, assédio ou tratamento desigual de qualquer forma será tolerada. Em nenhum lugar”.
Ele continua agradecendo a todos os funcionários e ex-funcionários que vieram a público denunciar e protestar contra os casos, comprometendo-se com os acionistas em não permitir que esses comportamentos existam na companhia, garantindo que “Nós seremos a companhia que dará o exemplo quanto a isso em nossa indústria”.
Em seguida, os novos líderes da Blizzard são reapresentados. Jen Oneal, a primeira mulher na liderança do estúdio em sua história, e Mike Ybarra. Após isso, Kotick comprometeu-se em investigar toda e qualquer alegação e reclamação que os líderes da companhia receberem. Tomando ações decisivas assim que forem informados de má conduta, adicionando pessoal e recursos extras para esse trabalho, garantindo que “As pessoas serão responsabilizadas por seus atos“.
“Esse compromisso significa que nós não vamos apenas demitir funcionários quando for apropriado, mas também demitiremos qualquer gerente ou líder que se descubra que impediram a integridade de nossos processo de avaliação de alegações, e vamos impor as consequências apropriadas“.
Ontem, inclusive, foi divulgado na mídia que Jesse Meschuk, que era vice-presidente sênior do setor de Recursos Humanos da companhia, não está mais em seu cargo. Os funcionários que denunciaram as ações dos líderes do estúdio condenaram o setor de RH por proteger abusadores denunciados.
Relatos de funcionários contam que, ao denunciar casos de abuso, incluindo chefes gritando e impedindo que uma funcionária mulher saísse da sala de reuniões ou de usar o telefone, e outro em que houve abuso físico, foram desacreditados pelo RH, com as vítimas que fizeram as denúncias sofrendo represálias, não recebendo projetos e nem mesmo tendo seus nomes considerados em promoção mesmo três anos após a denúncia.
No entanto, não se sabe se Meschuck deixou o cargo por vontade própria, como aconteceu com o ex-presidente da Blizzard, J. Allen Brack, ou se foi demitido. Vale mencionar a ordem dos acontecimentos: A saída de Meschuck foi noticiada antes do novo discurso de Kotick, que aconteceu durante a noite de ontem.
Kotick continua mencionando o compromisso de tornar a seleção de candidatos para todas as posições da companhia diversificada, adicionando recursos para que a diversificação realmente ocorra.
O assunto então entra num ponto polêmico e muito levantado pelos funcionários descontentes: Ele menciona que a companhia tem empregado mudanças significativas nos últimos anos para mudar sua cultura negativa, para que seja mais diversa e com um ambiente que valorize as denúncias de falta de conduta, a qualquer momento. Isso, além de programas de denúncias de violações, reforço de canais para que os funcionários possam expressar suas preocupações de forma confidencial e sem medo de retaliação.
Com isso, outro ponto largamente criticado é abordado: a questão de salários. Kotick disse que a equipe de liderança se sente orgulhosa em pagar seus funcionários de forma justa e competitiva em trabalhos iguais ou similares. Além de mencionar que há uma análise regular de compensações para garantir a igualdade de pagamento.
Ele segue comentando que a companhia vem tomando várias ações para garantir que os pagamentos sejam feitos de forma não-discriminatória e baseadas em performance, cargo e experiência. Mencionando que treinamentos contra a discriminação são conduzidos para todos os funcionários envolvidos no processo de compensação.
A reunião continua com os nomes citados reiterando os pontos descritos e se comprometendo em melhorar o ambiente da Activision Blizzard e tomar atitudes para resolver o caso e impedir que se repita. Mas outro ponto polêmico foi quando Daniel Alegre, COO da companhia, voltou a mencionar a contratação de uma empresa de terceiros para avaliar as políticas internas da companhia, a WilmerHale.
O anúncio dessa empresa vai contra as demandas dos funcionários que estão protestando e acumularam mais de 3000 assinaturas (até o momento) em uma carata aberta endereçada a seus líderes. Na carta, os funcionários exigem a contratação de uma empresa de terceiros, que seja neutra e alheia a situação atual, escolhida em conjunto por um comitê formado pelos próprios funcionários da companhia.
A WilmerHale é uma empresa que já atuou com a Activision Blizzard várias vezes no passado, o que levanta o questionamento de sua neutralidade nessa situação. Além disso, essa empresa tem a fama de ser uma “destruidora de sindicatos”, agindo contra os interesses dos funcionários em posições mais baixas na hierarquia de uma empresa.
Antes mesmo dessa reunião que aconteceu ontem, os funcionários lançaram uma nova carta protestando contra a escolha da WilmerHale, bem como as palavras de Bobby Kotick. Coincidentemente, ou não, essa carta já aborda muitos dos pontos que foram levantados na reunião, evidenciando que as ações tomadas pela Activision Blizzard estão contra as principais demandas dos funcionários. Que são:
- O fim da arbitrariedade forçada nos contratos de emprego;
- A adoção de práticas de recrutamento inclusivas;
- Aumento da transparência de pagamentos através de métricas de compensação, e;
- Uma auditoria das políticas e práticas da ABK (Activision-Blizzard-King) feita por uma empresa de terceiros escolhida por uma força-tarefa de Diversidade, Equidade e Inclusão, liderada por funcionários
Apesar do compromisso de tornar a companhia mais inclusiva (apesar de ações reais ainda não terem sido vistas), o ponto sobre a arbitrariedade forçada (que é uma cláusula que força os funcionários a cumprir decisões de um árbitro de disputas internas – Normalmente os próprios chefes e líderes da empresa) não foi abordado em nenhum momento.
Segundo Kotick, o ponto 3 já é uma prática, o que vai contra as denúncias de enorme disparidade de pagamentos entre funcionários homens contra mulheres, negros, LGBT+ e outros grupos marginalizados. O vai totalmente na contramão das denúncias dos funcionários. Culminando no ponto 4, que foi ignorado com a contratação imediata da WilmerHale.
Isso, entre vários outros motivos contra a contratação da WilmerHale ficam muito bem explícitos na carta. Mas, em resumo, a carta menciona que a empresa e a Activision Blizzard possuem ligações passadas e atuais, incluindo relações pessoais entre líderes de ambas as companhias. Além da WilmerHale se posicionar em favor dos ricos e de companhias poderosas, em detrimentos de seus funcionários.
Aliado a esses novos protestos de funcionários contra as respostas de seus líderes, a situação escalou ainda mais, pois um novo processo foi feito contra a Activision Blizzard em cima do processo original.
Esse novo processo, registrado na Corte Distrital da Califórnia Central, foi feito por um grupo de investidores que alegam que a Activision Blizzard falhou propositalmente em divulgar os problemas que estão culminando atualmente, o que resultou em aumento do valor de suas ações. Ou, em outras palavras, a companhia escondeu esses problemas para que os investidores investissem nela, pois se soubessem dos casos, não o fariam.
Parece confuso, mas na verdade é algo real dentro da legislação americana. Segundo o processo, que representa qualquer um que tenha feito negócios com as ações da Activision Blizzard entre 4 de agosto de 2016 e 27 de julho de 2021, a companhia cometeu violação de leis de seguro federais ao divulgar materiais falsos e enganosos durante o período do processo. O processo menciona os nomes do CEO Bobby Kotick, CFO Dennis Durkin, o antigo CFO Spencer Neumann e três outros executivos como responsável pela divulgação de informações falsas.
O processo tem base nas certificações SOX (Sarbanes-Oxley Act of 2002), uma lei criada para proteger o público de informações erradas e atividades fraudulentas de companhias e empresas. Todos os anos, empresas precisam lançar um certificado SOX, assinado por executivos, divulgando quaisquer problemas legais, investigações, auditorias e outros processos que podem afetar seu valor no mercado.
Em outras palavras, as empresas precisam divulgar publicamente qualquer problema legal que estejam enfrentando, por questões de transparência. Essa é uma ação obrigatória pois afeta o valor de mercado de uma companhia, e no caso da Activision Blizzard, o processo alega que os seus líderes já sabiam dos casos de assédio e abusos dentro de suas dependências, mas mentiram ao público sobre elas para não perder investimentos.
Isso implica que a Activision Blizzard mentiu em seus últimos certificados SOX, em especial o de 2020, pois já haviam investigações e processos de abuso e assédio acontecendo lá dentro.
Diariamente algo novo sobre o caso vem a tona, com nomes importantes na empresa deixando seus cargos; seus líderes se pronunciando, mas falhando em abordar o problema como um todo; os funcionários e vítimas continuamente se revoltando e protestando, inclusive recebendo o apoio de outros grupos, como os funcionários da Ubisoft, que também protestam; e agora um novo processo vem a tona.
É impossível dizer qual será a conclusão de todo esse caso, pois pelo visto muita coisa ainda virá a tona nos próximos dias, quem sabe até semanas e meses, até que o processo chegue ao fim – o que honestamente, parece que não vai acontecer cedo.
(Via: Eurogamer, Kotaku, PC Gamer, IGN)