Cine Arkade (sem spoilers): Deadpool & Wolverine, fan service & nostalgia
Fazia tempo que eu não ficava “no hype” por um filme da Marvel. E sei que não sou o único. Pouca coisa prestou depois de Vingadores: Ultimato, e o excesso de “filmes e séries de super-heróis” deixou todo mundo saturado. Porém, Deadpool & Wolverine me deixou no hype. Eu mal podia esperar para ver o filme. Felizmente, a espera valeu a pena.
Como o filme estreia oficialmente hoje, pode ficar tranquilo: não teremos spoilers neste artigo (nem mesmo os falsos). Até as imagens são as oficiais de divulgação, sem spoilers. Porém, eu quero falar sobre este filme até para nivelar as expectativas de quem, talvez, ainda não esteja decidido se Deadpool & Wolverine vale o seu investimento de tempo e dinheiro.
A primeira coisa que você precisa saber é: Deadpool & Wolverine não é exatamente o filme que você espera que ele seja. Mas nem é culpa dele. O filme sofre do mesmo mal que Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa: a expectativa fez com que a internet criasse sua própria versão da trama, e há toneladas de rumores e especulações sendo alimentados há meses.
Então, se você está esperando que este seja o filme que vai colocar a Marvel na direção certa, a primeira peça em uma nova fase do MCU, fique ciente que não é bem por aí. Isso pode parecer óbvio, mas Deadpool & Wolverine é uma sequência de Deadpool 2, filme que, como você bem deve se lembrar, não se conectava ao MCU, uma vez que era uma produção dos tempos da 20th Century Fox.
E aqui talvez a gente precise contextualizar um pouco as coisas para os mais jovens….
A Marvel antes do MCU
Talvez a galera mais nova não lembre, mas no início dos anos 2000, a Marvel não era essa potência cinematográfica que é hoje. Na verdade, ela vendia os direitos de seus personagens para que outras empresas produzissem filmes com eles.
É o caso do Homem-Aranha, por exemplo, que teve não 1, nem 2, mas 5 filmes antes da fase Tom Holland e MCU. De fato, os direitos cinematográficos do personagem ainda pertencem à Sony Pictures, que “emprestou” o herói para os Vingadores, mas segue explorando o Aranhaverso com filmes de qualidade duvidosa tipo Venom, Morbius e Madame Teia — e, não por acaso, fez todo mundo esquecer quem é Peter Parker no MCU, para “pegar de volta” o Cabeça de Teia.
Também é o caso dos X-Men e do Quarteto Fantástico, supergrupos que tiveram um punhado de filmes lançados pela 20th Century Fox. O Demolidor também está nesse bolo: bem antes da série da Netflix, o teve um filme de gosto duvidoso protagonizado pelo Ben Affleck (que, anos depois, seria o Batman, olha que coisa).
Era uma época mais simples, de filmes mais descompromissados, sem um multiverso complexo interligando tudo. Porém, como atualmente a Disney é dona tanto da Marvel quanto da 20th Century Fox, tudo está “na mesma casa” e toda essa galera pode fazer parte oficialmente do MCU.
Dito isso, ainda que este seja o primeiro filme do mercenário falastrão sob o comando da Marvel, Deadpool & Wolverine pega bem leve em toda essa questão de multiverso e MCU. É recomendável que você tenha visto pelo menos a primeira temporada de Loki — visto que a organização AVT é bem importante aqui –, mas de resto, o filme funciona de forma independente e está mais preocupado em ser a sequência de Deadpool 2, sem grandes ambições de ser “o próximo grande acontecimento” da Marvel nas telonas.
O legado da Fox
Dito isso, o que esse filme é, na verdade é uma grande homenagem ao legado da 20th Century Fox, e a quase tudo que ela entregou em seu universo cinematográfico, lá no início dos anos 2000.
Tal qual Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa homenageou o legado da Sony Pictures, o que temos aqui é uma obra que não tem pudores na hora de mergulhar na nostalgia. O lance é que talvez não seja a nostalgia da galera que tem seus 20 e poucos anos e pegou o início do MCU em 2008… mas sem dúvida é um prato cheio para o público 30+ (como eu), que acompanhou de perto o alvorecer dos filmes de super-herói mais de uma década antes de Robert Downey Jr. ser o Homem de Ferro.
Isso quer dizer que temos participações muito especiais ao longo do filme. Você já sabe do Wolverine, claro, afinal sua presença está literalmente no título do filme. Mas, além do retorno triunfal de Hugh Jackman ao papel que o consagrou (retorno que, obviamente, rende piadas metalinguísticas), há muito mais. Surpresas capazes de arrancar sorrisos, palmas e exclamações empolgadas da plateia daquele jeito que a Marvel parecia não ser mais capaz de fazer.
Não vou entrar em detalhes aqui, mas, assim como Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa me fez vibrar no cinema ao reunir “3 gerações” de Peter Parker — e mesmo o filme do Flash deixou a marmanjada saudosa ao ressuscitar o emblemático Batman do Michael Keaton –, Deadpool & Wolverine é repleto de nostalgia e de fan service.
Felizmente, ele não faz isso de maneira gratuita: quase tudo o que está ali serve ao roteiro, ninguém está ali só pelo fan service, mas pela história. E por falar em história, ela é surpreendentemente bem escrita e bem amarrada. Rolam uns clichês aqui e ali, mas no geral o saldo é muito positivo. O filme entrega uma montanha de fan service, mas encaixa tudo dentro do contexto da narrativa que está sendo contada.
Sangue, humor & palavrões
Quando Deadpool entrou debaixo do guarda-chuva da Disney, ficou aquele medo de que Mickey e cia. iriam “amaciar” o personagem, notório por seus filmes para maiores de 18 anos repletos de sangue, palavrões e humor ácido.
Este medo não era infundado: a Marvel levou 15 anos para soltar seu primeiro “fuc*” em um filme (rolou em Guardiões da Galáxia 3), e todos os filmes do MCU são “para a família”, sem violência explícita e com piadas adequadas para menores.
Felizmente, Deadpool & Wolverine segue sendo um filmes +18. Toda a malícia está de volta, e o fato do Deadpool ter consciência que é um personagem em um filme (da Disney) rende ótimas piadas “proibidas”. A metalinguagem está afiadíssima, com muitas quebras de quarta parede e muita zoeira com o fato do Deadpool ser “o Jesus da Marvel“ em uma época em que a empresa está meio desacreditada.
E a violência está aqui, sangrenta do jeito que dois personagens como Deadpool & Wolverine merecem. A incrível sequência de abertura do filme já escancara isso, com profanação de cadáver, decapitações e momentos dignos de Mortal Kombat… tudo isso ao som grudento de um hit do N’Sync, com direito a dancinha e tudo — aliás, a trilha sonora é igualmente nostálgica, trazendo pérolas de Madonna, Avril Lavigne e Goo Goo Dolls.
Conclusão
E aqui eu repito o que já disse lá no começo: se você se deixou levar pelos rumores e especulações da internet, nivele as suas expectativas. Não vejo Deadpool & Wolverine como “o próximo grande evento da Marvel nos cinemas”. Ele é um filme mais sobre o passado da Marvel do que sobre o futuro. Uma obra mais contida, mais “avulsa”, que não exige que você tenha assistido 20 filmes e 8 séries para entender.
Ou melhor… ele sem dúvida fica MUITO mais legal se você tiver alguma bagagem de filmes… e não estou falando do MCU ou dos Vingadores, mas de coisas mais antigas — ou nem tanto, tipo Logan. E ter essa bagagem é importante não para entender o filme em si, mas para saber quem são os personagens que retornam. Quem diria que, tantos anos depois, alguns filmes tidos como “ruins” nos causariam uma nostalgia tão boa?
Fico me perguntando se a galera que nasceu de 2004 para cá — e já idade para poder ver Deadpool & Wolverine nos cinemas — vai captar a nostalgia que esse filme traz. Afinal, nem todo mundo deve ter se dado ao trabalho de ver os primeiros filmes “toscos” dos X-Men, quando havia tanta coisa melhor sendo lançada de 2008 para cá.
Deadpool & Wolverine é uma respeitosa carta de amor ao legado da 20th Century Fox e aos atores — incluindo o próprio Ryan Reynolds — que deram vida a personagens tão emblemáticos. Calibre as suas expectativas e vá ao cinema sabendo que vai dar boas (e descompromissadas) risadas. E isso é ótimo!
Deadpool & Wolverine estreia hoje (25/07) em cinemas de todo o Brasil.