Cine Arkade: O exagero oitentista de Kung Fury
O insano projeto sueco finalmente saiu do papel graças ao Kickstarter e está disponível de graça na internet. Então que tal falarmos um pouco sobre Kung Fury?
No final do ano passado um bizarro projeto surgiu no Kickstarter, mas diferente de um jogo ou algo completamente inviável, o projeto era um filme que queria homenagear todo o exagero iluminado de neon que os anos 80 tinham em sua cultura pop.
Mesclando diversos temas e cenários absurdos, Kung Fury ganhou um trailer para apresentar sua estranha (mas interessante) premissa envolvendo um policial lutador de Kung Fu, vikings com submetralhadoras, Thor, dinossauros e até Hitler como o vilão do filme.
O projeto chamou a atenção de todos pelo quão absurdo ele demonstrava ser e Kung Fury finalizou sua campanha com mais de 630 mil dólares, três vezes mais que a quantia almejada. Alguns meses se passaram e finalmente temos Kung Fury e toda sua gloriosa insanidade em nossas mãos.
Em trinta minutos tivemos dinossauros que soltam lasers, mulheres vikings que usam armas de fogo e cavalgam em dinossauros, Hitler que pratica Kung Fu, um policial que também é um Triceratops, um Thor vivido por um ator idoso e estranhamente malhado, um fliperama senciente e até David Hasselhoff — responsável pela música tema “True Survivor” — como Hoff-9000, companheiro veicular de Kung Fury.
Mas tudo isso faz de Kung Fury um bom filme?
Me sinto dividido após ter visto Kung Fury mais de uma vez e percebido que, já na segunda assistida, as cenas que me deixaram de boca aberta se tornaram menos impactantes e os diálogos ficaram ainda mais vazios.
Não me entendam mal, eu gostei do filme, vibrei incessantemente durante os trinta minutos de sua duração e ainda cantarolei True Survivor enquanto os créditos subiam. Mas eu não consigo tirar o pensamento de que Kung Fury só consegue dar certo neste formato porque trinta minutos é o máximo que podemos assistir sem cansarmos da forma genérica de criar algo absurdos com que a Laser Unicorns trabalha, de modo que o filme serve mais como um teste de criatividade para saber até onde eles vão nas tentativas de prender a atenção do público do que como uma obra realmente relevante sobre a cultura pop oitentista.
Filmes de ação tendem a não passar das duas horas de duração porque explosões, perseguições de carros e coreografias insanas de lutas tendem a prender o público por um tempo menor do que um personagem bem desenvolvido ou de uma trama interessante. E é por isso mesmo que filmes como Mad Max: Estrada da Fúria, Operação Invasão 2 e De Volta ao Jogo são alguns dos melhores filmes de seu gênero, porque eles sabem como intensificar suas vantagens e subverter o que pode ser visto como uma desvantagem para o público em geral.
E isso quer dizer que filmes de ação são “menores” que filmes de drama? Claro que não, cada gênero têm suas vantagens, desvantagens e públicos distintos na indústria do cinema. Mas ainda não posso tirar o fato de que Kung Fury desperdiça o seu potencial em um emaranhado de referências e situações nonsense e acaba não fazendo o mesmo que os filmes citados.
Este desperdício não é pela falta de uma trama elaborada cheia de palavras complicadas — novamente, Estrada da Fúria nos mostrou bem que não precisamos de diálogos complexos e profundos para entendermos as ambições de um personagem –, mas as próprias frases de efeito (os famosos one liners) se tornam cansativos após os minutos iniciais de Kung Fury. Assim o diálogo mais interessante do filme é a conversa entre os dois nazistas sobre o “bigode ariano” dele, que assim como o tanque, foi terminada abruptamente com uma frase de efeito que é ruim por ser ruim, não caindo naquele pântano agridoce do “tão ruim que é bom”.
Você pode argumentar que estou pegando pesado com o filme e pode estar certo, afinal, todos que doaram no Kickstarter e fãs em geral estavam esperando um filme exatamente como este e a promessa foi cumprida ao lado de um trabalho impressionante nos efeitos especiais, com um nível insano de cenas absurdas, coreografias surpreendentemente bem feitas, uma trilha sonora composta por Mitch Murder tão viciante que a estou escutando (de novo) enquanto escrevo este texto, além de possuir uma estética geral que funciona perfeitamente bem no filme como um todo.
Por isso, sei que Kung Fury serve exatamente para o que foi intencionado: uma rápida viagem extremamente exagerada para os anos 80 mesclado com um pouco da insanidade que a equipe da Laser Unicorns quer tanto pregar em seu filme. Mas isso não tira o fato de que ele tem algumas falhas visíveis que acabam tirando a diversão do filme, especialmente depois da primeira vez, quando o impacto inicial das cenas começam a perder o seu valor.
No fim, eu só espero que Kung Fury não tenha uma continuação — pelo menos não neste mesmo estilo — e particularmente não consigo ver ele funcionando como um longa metragem. Kung Fury funciona do jeito que está, como um filme divertido para assistir uma vez e rir quando ver algum gif do filme sendo utilizado por alguém na internet, mas nem toda a nostalgia do mundo consegue mantê-lo tão interessante na segunda assistida.
E você, o que achou de Kung Fury? Vamos debater nos comentários!