Cine Arkade: O Problema Inerente nos Filmes de Terror
Qual foi a ultima vez que você se sentiu aterrorizado? Nada daquele susto barato, mas sim estar verdadeiramente com medo durante o filme inteiro. Confira o verdadeiro problema que os filmes de terror enfrentam hoje em dia, na Cine Arkade!
Estou perguntando isso porque quero discutir o problema que há nos filmes de terror hoje em dia, será que os filmes mais famosos nos deixam com medo de verdade ou é tudo fabricado de uma forma tão artificial que os gritos de medo são provenientes de simples jump scares onde o monstro aparece do nada na tela acompanhado por um som agudo e estridente?
Mas antes de criticar o que temos no quesito de filmes de terror hoje em dia, vamos voltar para os primórdios do terror, filmes de monstros como Nosferatu, Frankenstein e os primeiros contos de Drácula. Todos eles compartilhavam uma similaridade que era a tendência a dezenas de anos atrás, sendo o medo do desconhecido e do sobrenatural o maior fator de todos eles, o que é totalmente normalmente quando imaginamos que muitas dessas histórias foram originadas de livros e contos de terror.
O ATERRORIZANTE INÍCIO
O filme alemão Nosferatu, de 1922, se acentuava graças a sua tendência ao expressionismo, que intensificava ainda mais o horror. O diretor germano, F.W. Murnau, tinha maestria em utilizar sombras para capturar a essência do terrível monstro, o visual de Conde Orlok ao lado da conveniência de ser um filme mudo ajudou ainda mais para dar o ar de tenebrosidade que o monstro tanto necessitava, além da atuação estupenda de Max Schrek. Uma coisa que esses filmes tinham como vantagem era pelo monstro ser algo totalmente possível de acontecer, o que acaba trazendo um mistério a mais em uma época onde as pessoas não eram tão cínicas e habilidosas quanto hoje em dia.
Após uma década vimos o começo de uma tendência que acabou mudando o cinema como um todo, em alguns pontos para o melhor, e outros para o pior. Eis que temos os grandes monstros da Universal Pictures, filmes como Frankenstein, Drácula, Lobisomem, Noiva de Frankenstein, Múmia e o Monstro da Lagoa Negra surgiram para introduzir este novo gênero de monstros para o público. Estes filmes começaram trabalhando fielmente ao material original, e atores como Bela Lugosi, Lon Chaney Jr. e Boris Karloff merecem toda a honra por trazerem tantos antagonistas à vida pela performance estelar ao trabalhar como diferentes monstros, especialmente Karloff que soube usar sua altura para interpretar o melhor monstro já visto em Frankenstein.
A crise começou quando o conceito de monstros saturou o mercado, cada antagonista recebia vários filmes e as mudanças entre elas eram mínimas a ponto de perder qualquer resquício de criatividade fundado nas grandes obras de Bram Stoker e Mary Shelley.
O tempo foi passando E o terror nos filmes foi mudando, o público esperava algo diferente e a cada ano novas ideias eram implementadas, um novo vilão, um conceito, temas e pesadelos foram desenvolvidos graças aos cineastas que tanto admiramos. Claro que muito mudou após todas estas décadas, sub-generos foram criados para acentuar um certo estilo de terror e diferentes filmes foram surgindo para agradar todos, desde aquele cara que é fã do sobrenatural e mágico, até aquele que prefere algo mais realista e pesado.
Mas eu quero focar em um certo gênero que começou nos anos 80. Perdeu um pouco de sua força nos anos subsequentes, explodiu no final dos anos 90 e voltou recentemente a todo vapor. Estou falando do found footage, o famoso estilo cinematográfico onde o filme é gravado por um personagem e no fim aquela fita com todos os acontecimento gravados é encontrada por alguém que lança como um filme baseado em fatos reais, por isso o nome de found footage, que seria algo como filmes perdidos.
ENCONTRANDO FITAS PERDIDAS
O found footage é normalmente utilizado para aumentar a imersão do filme pelo espectador se encontrando e vendo tudo aos olhos daquele que manuseia a câmera, que acaba sendo o protagonista em sua maioria das vezes. A segunda vantagem que o found footage dá é a sensação de que todos os eventos no filme podem ter realmente acontecido.
O gênero se iniciou em grande estilo graças ao Holocausto Canibal, um dos filmes considerados mais bizarros e grotescos até hoje, ao lado de outros longas igualmente infames, como Centopeia Humana, A Serbian Film (que foi traduzido para cá como Terror Sem Limites) e algumas das obras mais famosas do cineasta japonês, Takashi Miike.
O documentário de Ruggero Deodato colocou a misteriosa tribo indígena da floresta amazônica como o objeto de estudo sobre canibalismo e todo o gore, perversão e brutalidade gráfica em um único filme. Sua popularidade aumentou cada vez mais graças a toda polêmica em volta do filme e de seu diretor, incluindo crueldade com animais e até alegações de que os atores morreram de verdade para que trazer autenticidade, se tornando um verdadeiro filme de snuff, e que acabou sendo uma óbvia mentira.
Alguns anos depois o gênero explodiu com A Bruxa de Blair, de 1999. Por ser um dos precursores do gênero, A Bruxa de Blair se tornou um sucesso financeiro e aclamada pela critica, conseguindo arrecadar a quantia estrondosa de mais de US$ 248 milhões em todo o mundo, o que surpreende ainda mais quando levamos em conta que foi gasto apenas US$ 60 mil para produzir o filme, de acordo ao site Box Office Mojo.
Assim o segredo de conseguir uma grana fácil foi descoberto pelos idealizadores de A Bruxa de Blair, mas foi somente utilizado de verdade com Atividade Paranormal, de Oren Peli. O filme lançado em 2009 deu imenso empurrão para os cineastas que trabalhavam com terror. Para ter uma ideia de seu lucro, Atividade Paranormal teve um orçamento de US$15 mil e conseguiu atingir mais de US$ 193 milhões mundialmente. Além das inúmeras continuações que tornou a franquia de Atividade Paranormal uma das maiores já vistas na indústria do cinema. E tudo isso foi adquirido por causa de uma boa ideia acompanhada de uma única câmera.
Mas Atividade Paranormal não foi simplesmente um filme que conseguiu muito dinheiro gastando praticamente nada para ser feito, ele acabou trazendo uma triste tendência nos filmes de terror: O uso exagerado e não sábio do uso de mecânica mais simples para assustar alguém.
O VALOR DE UM SUSTO
Quantas vezes isto aconteceu com você? O filme está chegando em seu segundo ato. O personagem principal anda em um lugar escuro manuseando uma lanterna que acaba falhando de tempos em tempos. A trilha sonora desaparece e a único som possível de escutar são os lentos passos do protagonista. O silêncio reina e eis que do nada algo/alguém totalmente inofensivo aparece ao lado de um barulho estridente e agudo.
Dependendo do filme esta mecânica acaba mudando, porém o essencial é dar um susto barato no espectador graças toda a tensão acumulada desde o começo daquela cena, ou do filme por completo.
Agora, eu não tenho nada contra com filmes de found footage ou dos filmes que utilizam esta mecânica em sua vantagem (porque o gênero found footage não esta relacionado diretamente a esta mecaniza, mas com certeza é o subgênero que mais utiliza), e acredito que todos pularam da cadeira naquela cena do filme Sobrenatural, nas ultimas cenas de Atividade Paranormal ou do filme espanhol, REC.
Mas o que me incomoda são os inúmeros sustos falsos que acabam sendo uma imensa desvantagem no filme, já que ela acaba tirando toda a tensão que estava sendo acumulada e gasta em algo tão barato e simples. E o pior é que este ano foi repleto de filmes que utilizaram esta mecânica a seu favor e que, infelizmente, todos conseguiram atingir o sucesso financeiro.
Após uma pesquisa no site Box Office Mojo e no agregador de criticas, Rotten Tomatoes, vocês podem ver como a quantia arrecadada em um filme de terror é inversamente proporcional pela recepção da critica e do público que o viu. Com filmes como Annabelle arrecadando mais de US$ 84 milhões, enquanto atinge um triste 29% pela critica e 40% pelo público em análises; Ou até Ouija, que conseguiu nada menos que US$ 49 milhões em seu lançamento doméstico, mas está em um das ultimas posições no Rotten Tomatoes, com 7% favorecida pela critica e 29% pelo publico.
O RETORNO AO TERROR
Mas nem tudo está perdido, ainda existem filmes que conseguem manter a essência do que foi capturado há quase cem anos atrás. Um deles que vi recentemente foi The Babadook, um filme australiano de terror psicológico dirigido e escrito por Jennifer Kent e que talvez seja um dos filmes mais aterrorizantes lançado nos últimos anos.
The Babadook conta a história de Amelia, uma viúva e seu filho Samuel, que acaba o criando sozinha após a trágica morte de seu marido. O garoto, interpretado Noah Wiseman, tem um comportamento errático pelo sua preocupação de um suposto monstro. Tudo muda repentinamente quando a mãe e o filho decidem ler um livro chamado Mister Babadook e de lá uma série de aterrorizante eventos começam ocorrer diante a família.
Sua sinopse é simples, mas o seu ponto alto é como eles mostram o vilão titular no filme, utilizando a pura e simples tensão daquele monstro estando no ambiente em vez de quebrá-la com sustos. Assim como seu enredo, o terror psicológico de The Babadook é complexo, não precisando de uma imagem explicita na tela para te deixar com medo e sim favorecendo a sutileza de um clima pesado e angustiado durante o filme inteiro, além de uma performance espetacular da personagem Amelia, interpretada pela atriz australiana, Esther Davis.
The Babadook e todos estes filmes que mencionei é somente um exemplo de que o terror, assim como vários gêneros na indústria cinematográfica, tem seus altos e baixos. E cabe a você, caro leitor, separar o joio do trigo, porque na visão do investidor tudo se resume em quanto que aquele filme arrecadou para saber qual é o próximo passo e a consequência são todos estes filmes que continuam adquirindo muito dinheiro em troca de praticamente nada.
E você, qual foi o ultimo filme que te deixou verdadeiramente aterrorizado? Deixe a sua resposta nos comentários!