Crítica – Pantera Negra faz bonito com boa história e personagens excelentes
Muito foi falado durante o processo de divulgação de Pantera Negra, a respeito das questões políticas que o filme poderia levantar, sobre o fato de a Marvel Studios introduzir, nesta altura do campeonato, um personagem desconhecido da massa, com atores questionados, isso sem mencionar os problemas, muitos deles infantis, que o filme enfrenta durante sua chegada.
Mas o que interessa em um filme, é o filme em si, não é mesmo? E Pantera Negra mostra a Marvel Studios em sua melhor forma, apostando e acertando em diversos elementos, trazendo assim um longa divertido, que consegue discutir temas políticos sem ficar chato e com uma história que consegue reservar espaço para a ação e a aventura, sem nenhum exagero.
A dura vida de um rei
Pantera Negra precisava abordar política, e o faz muito bem. Temos um país, Wakanda, o mais avançado tecnologicamente do planeta, mas que se esconde atrás de uma cortina de pobreza na África central. Também temos T’Chala (Chadwick Boseman), o novo rei do local, que acumula a função de Pantera Negra, usufruindo de poderes maiores para proteger seu povo, que precisa lidar com questões pessoais e governamentais para garantir o melhor para seu povo. E também temos várias questões que envolvem um reino, como visões que entram em conflito por serem diferentes, mobilizações para fins específicos e até as já conhecidas traições.
Tudo isso em um local com suas tradições, uma construção muito caprichada que mistura elementos comuns da cultura africana mais os avanços tecnológicos característicos deste povo, que deixa tudo mais interessante. O respeito às tradições pelo povo de Wakanda é enorme, e garante que tenhamos esta mistura de maneira bem inteligente, com rituais, músicas e danças tribais misturados com carros que são pilotados à distância. E estes elementos também fazem parte da discussão política do filme.
Porém, o filme não aborda estas questões de maneira forçada. O reino de Wakanda entrou em turbulência após alguns eventos conhecidos por quem viu Guerra Civil, o que gera diversas situações e que, personagem a personagem, podemos refletir — e muito — sobre questões que são apresentadas no nosso dia a dia: a intolerância, a “limpeza” étnica, a evolução interna ignorando os problemas externos e por aí vai. Continua sendo um filme de herói Marvel, porém, como estamos falando de um personagem que também é um líder político, seria um crime tirar isso do longa, apenas para encher de cenas de ação.
Elementos de nossa realidade também foram introduzidos de maneira bem inteligente na trama, a fim de nos ajudar a adentrar no conturbado mundo político de Wakanda, além de auxiliar nas reflexões que o filme propõe. A presença do Agente Ross (Martin Freeman), e uma menção a California de 1992 (já que foi neste ano que aconteceu a conhecida Los Angeles Riot, em um conflito racial em resposta a absolvição de oficiais brancos que foram acusados de agredir o motorista negro Rodney King após uma perseguição, com imagens como prova), que ajuda a remeter ao sofrimento dos negros, defendido pela visão de Killmonger (Michael B. Jordan).
Falando em Killmonger, aproveito para falar que, desta vez, até no vilão a Marvel acertou (lembrando que o filme com Thanos de antagonista ainda não estreou). O personagem conta com traumas e razões suficientes para seus objetivos, mas controlado pelo ódio, faz com que suas atitudes acabem sendo muito questionadas. Só que o seu discurso também se faz necessário, tanto que a sua presença, somada a outros eventos, mudam o ponto de vista de T’Chala e seu reino, para a construção de uma nação que será muito importante para os eventos que estão para acontecer.
Boa ação com um time de respeito
Muito se falou sobre a participação do apoio de T’Chala no filme. Okoye (Danai Gurira), Shuri (Letitia Wright) e Nakia (Lupita Nyong’o) trazem juntas um brilho a mais para o filme. O Pantera Negra é um grande herói e um rei, e, como tal, conta com a lealdade e o apoio de uma guarda real de respeito. O bacana é que tais personagens não foram introduzidas “na marra” apenas para garantir presença feminina, e sim, como personagens fortes que, cada uma com sua personalidade, somam ao já rico universo de Wakanda que, desde já, terá continuações desejadas pelo público.
Todos os personagens garantem cenas de ação de muita qualidade. Seja pela inteligência e irreverência de Shuri, que inclusive se apresenta como um alívio cômico muito bem colocado, já que garante risos sem exagerar para as famosas piadinhas a todo momento comuns em filmes Marvel, pela lealdade e firmeza de Okoye, ou pelo senso de justiça de Nakia, as garotas chutam traseiros com todos os méritos possíveis. O Pantera também se garante nas cenas de ação, em momentos que nos lembram vagamente dos clássicos de ação dos anos 90, mais as ações de Killmonger, que age como um terrorista no começo e vai se transformando em um “personagem de quadrinhos” com o passar da trama, garante ótimos momentos para o público.
Os novos rumos do universo Marvel
Já estamos cansados de saber que o Universo Cinematográfico Marvel caminha para uma nova e decisiva fase. O filme do Pantera Negra em si não tem lá muitos elementos que nos remetem a ameaça de Thanos, preferindo nos introduzir ao reino de Wakanda, assim como a sua tecnologia e visão de mundo, porém sabemos, através de trailers, da importância do país em relação aos problemas que estão para acontecer. De forma sutil, somos introduzidos aos eventos que virão.
O ponto de vista mais sério, somado a uma narrativa mais dramática e até sombrio (que, se não fossem os trailers, nos traria uma sensação de insegurança ainda maior) nos garante que, a partir daqui, mesmo com filmes mais “pipoca” agendados, como Homem-Formiga e Vespa, a Marvel quer sim deixar os seus filmes com esta nova narrativa, mas sem perder a ação blockbuster que nos apresenta há uma década.
Pantera Negra acerta por nos oferecer esta ação comum a filmes de herói e que garante o entretenimento do público, mas também ganha pontos por convidar o público a refletir sobre as questões políticas levantadas em seu enredo, além de confirmar que um novo momento para os heróis está chegando.