Editorial: Afinal de contas, a E3 está em crise? Perdendo relevância? Vai acabar? Não!
Antes de começar, preciso esclarecer de que as opiniões expressas são totalmente minhas, e pode não ser a mesma opinião de outros membros do Arkade, tudo bem? Então, vamos lá!
Desde 1995, a E3 é o maior nome no que diz respeito a eventos com videogames. Realizada todos os anos em Los Angeles, o evento se tornou famoso por, primeiro, trazer as grandes novidades e tendências das empresas envolvidas com games. E, depois, por suas conferências, que foram se tornando, ano a ano, maiores, e impactantes entre os gamers.
Mas, o tempo passa, e com isso, novas maneiras de se apresentar projetos. E, com isso, a E3 acabou entrando em xeque, pelo menos pela comunidade do videogame. Mas, será mesmo que a E3 está chegando ao fim? Será que este apocalipse é midiático, ou, de fato, a E3 está perdendo força? É o que vamos discutir por aqui.
Vamos voltar ao início de tudo
Antes da E3, as novidades em games eram apresentadas na CES. A Consumer Electronics Show, que nasceu nos anos 60, era o local dos novos consoles e games. Mega Man X, por exemplo, foi apresentado por lá, pela primeira vez, em 1993. Mas o evento, que segue ativo até hoje, é uma feira de consumo eletrônico, como o nome diz. Assim, os games dividiam espaço com televisores, aparelhos de som, itens de limpeza, e muitos outros. Hoje em dia, a feira também apresenta novidades em celulares, hardware em geral, e até automóveis.
Mas os videogames estavam se transformando em uma grande indústria. E já dava conta de responder por um evento exclusivamente para jogos e consoles. Assim, a Interactive Digital Software Association (hoje Entertainment Software Association) lançou em 1995 a primeira E3. Que contou com forte apoio da indústria. Com uma nova geração chegando, foi o momento ideal para a Sony anunciar o seu primeiro Playstation, a Sega falar de seu Saturn, e a Nintendo mostrar do seu Nintendo 64.
As conferências foram um sucesso, e se transformaram em padrão. Assim, todo ano, as revistas, e, posteriormente, os portais e canais do Youtube faziam suas coberturas, acompanhando o “hype” das novidades. Isso leva a entender que tal formato é querido pela comunidade. E, qualquer situação distante a isso, como a ausência da Sony da feira, é vista como uma “ameaça” a feira.
A concorrência aumentou, e os eventos “solo” apareceram
Nos anos 90 e no início dos anos 2000, a E3 era absoluta. Apesar de existirem eventos, como a Tokyo Game Show, que estreou em 1996, era em Los Angeles que as “coisas aconteciam”. Inclusive, apresentações históricas, como a do Nintendo Wii, e a “briga” na época do Playstation 4 e Xbox One estão até hoje na memória dos gamers.
Mas a concorrência foi aumentando. Em 2006, a Gamescom inaugurou suas atividades na Alemanha. Depois, eventos espalhados pelo mundo também começaram a aparecer, como a Brasil Game Show, a Argentina Game Show, a Milan Games Week e a Paris Games Week. Em todos eles, pelo menos nos primeiros anos, a ideia era fazer a “E3 em seu país”. As primeiras edições da BGS, por exemplo, tinham conferências das empresas, com suas novidades focadas ao mercado brasileiro.
Também podemos observar a chegada de novas ideias, como o The Game Awards. O projeto de Geoff Keighley, que busca premiar os destaques dos videogames do ano, é considerado por muitos, como o Oscar dos Games. Mas, pra mim, o evento é o “Super Bowl dos games”. O evento acabou se transformando em uma plataforma de divulgação mais prática, e relevante. A ponto de pessoas que nem se importam com a premiação dos games acompanhar, em busca dos novos anúncios. O Xbox Series X foi apresentado neste evento.
E, por fim, as empresas de games começaram a fazer seus próprios eventos. A Nintendo apostou nos conhecidos Directs, enquanto a Sony seguiu a mesma tendência, com o PlayStation Experience. Já a Microsoft, que apesar de seguir na E3, também tem eventos como o X0. E a Blizzard, que já fez a sua Blizzcon ser tradição para os fãs da companhia. Tais marcas perceberam, cada uma a seu modo, que desta forma a proximidade com o público potencial é maior, do que eventos “divididos” em grandes eventos.
A E3 precisaria de mudanças. Como qualquer evento do porte dela precisa, para se adaptar a novos tempos.
Os números da E3
Dito isso, vamos ver como está a E3 hoje, em números. A E3 2019 apresentou sete conferências: Microsoft, Bethesda, Devolver, Ubisoft, Square Enix, Nintendo, e o PC Gaming Show. Além disso, foi palco de outros dez eventos, que incluem a apresentação do Google Stadia, o E3 Coliseum, a apresentação da Electronic Arts, entre outros.
48 estúdios, incluindo Nintendo, Xbox Game Studios, Capcom, CD Projekt Red, e até a Netflix, que anunciou games baseados em suas séries, anunciaram e apresentaram ao público centenas de games, como Cyberpunk 2077, que contou com Keanu Reeves no palco, Final Fantasy VII, Call of Duty: Modern Warfare, entre muitos outros.
Nas conferências, a Microsoft teve, de acordo com o Githyp, 1.5 milhão de pessoas acompanhando a sua conferência no ano passado. A Ubisoft contou com 1.4 milhão, enquanto a Bethesda contou com 1.2 milhão de visualizações. Os números ficam na mesma média de 2018 e esta falta de crescimento é interessante para ser observado. Mas seja sincero? Isso é “falta de relevância”? É sinal de “final de feira”?
O público também diminuiu, de 2018 para 2019. De 69.200 pessoas, para 66.100, de um ano para o outro. As marcas expositoras seguiram, mesmo com uma pequena queda, para a média das 200. De novo: isso é sinal de “final dos tempos” para a E3? Pois bem, eu também acho que não.
Vale lembrar, também, que o Twitter anunciou que o evento que recebeu o maior número de tweets em 2019 foi a E3 2019. Na frente de todos os demais, como a Tokyo Game Show, o The Game Awards, e a Paris Games Week. Muito estranho, para um evento “irrelevante”.
A E3 vai mudar, mas todo mundo muda. Isso não significa “o fim”.
O mercado de exposições passa, de fato, por um tempo de mudanças. O Salão do Automóvel de Detroit, referência no setor automotivo, mudou de data. Fugiu do inverno e da CES, pela simples razão de que carros, cada vez mais tecnológicos, encontram na feira de Las Vegas boas oportunidades para seus negócios. O Salão do Automóvel de São Paulo, tradicional no setor, está tendo dificuldades com algumas montadoras, que podem não aparecer neste ano. O formato de exposições está deixando claro que mudanças precisam ser observadas.
Mas, por outro lado, pense um pouco comigo: como está a Gamescom? A Tokyo Game Show? A Paris Games Week? Aqui no Brasil, temos a Brasil Game Show, a Game XP e a CCXP, entre outros, sempre anunciando números que garantem o sucesso destas apresentações, com possíveis oscilações, comuns e passíveis de observação por seus organizadores.
Mas, vamos ser sinceros. Com os números apresentados, e muitas outras informações, a E3 vai falir? Está perdendo relevância? Mas é claro que não. A falta de empresas como a Sony, que leva na memória dos games boas lembranças por suas boas conferências — todos os quatro Playstations foram apresentados em uma E3 — mexe, de fato, com boa parte da comunidade dos videogames.
E a ausência de Geoff Keighley, respeitado devido ao seu The Game Awards, também coloca em cheque estas questões. Mas eu preciso dizer algo a você: não é só de Sony, e de Geoff, que a indústria vive. Suas ausências são, de fato, dignas de nota e de observação, mas nem de longe isso pode significar um “fim”. A indústria é muito maior do que estes dois nomes. E, vamos ser sinceros de novo: chegando maio, matérias e vídeos com “apostas para a E3 2020” estarão lá, como sempre.
A própria Brasil Game Show, em seus primeiros anos, oferecia conferências semelhantes. Eu mesmo já vi, dentro de uma BGS, apresentação da Rovio, durante os anos dourados de Angry Birds, fui um dos primeiros a jogar o Playstation Vita no país, vi produtor de Rocksteady jogando (e perdendo) no Batman: Arkham City, vi Phil Spencer em um evento da Xbox, e joguei em conferência, antes do lançamento, o Playstation 4. Lembrando também que a Laura, de Street Fighter V, foi apresentada no evento. Hoje, a BGS não conta mais com esses eventos, mas quem visita a feira, entre seus acertos e erros, pode falar que a “BGS vai acabar”? Que a “BGS perdeu relevância”? Mas é claro que não.
O mesmo princípio vale para a E3. O evento não terá nomes e marcas importantes, e isso é fato. Precisou mudar durante os anos, como abrindo as portas para o público, e oferecendo mais espaço para influenciadores. E mais mudanças podem ser feitas. Mas, isso, de maneira nenhuma, significa que a feira “perdeu relevância”. Se você, por um acaso, sente muito a falta de nomes na feira, e pra você a feira perdeu a tal da relevância, tudo bem. Mas projetar a sua opinião em cima de todo um evento que carrega os números que tem, é meio que demais.
Vejo, nessas mensagens “apocalípticas”, duas coisas. A primeira, é o simples fato de que “o apocalipse vende”, e a mídia, em geral, pode usar desse artifício para ganhar mais visualizações. Se é certo ou errado, não estou aqui para julgar. Mas é fato de que se usa muito desse recurso, na comunicação moderna. E a segunda, um fenômeno que pode acontecer, relacionado à nostalgia. Mudança gera desconforto. E, especialmente pra quem acompanhava a E3 na infância, através das revistas, e depois pela Internet, qualquer mudança gera incerteza quanto ao futuro daquilo que gostamos.
Mas, pode ter certeza. A E3 não vai perder relevância tão cedo. Ela pode perder impacto, dividir os holofotes com outros eventos e projetos, e até errar em algumas iniciativas no futuro. Mas um legado tão grande como a E3 não desaparecerá do dia para a noite não. Pode ficar tranquilo, e acompanhar conosco, em junho, mais uma rodada de lançamentos, e novidades do mundo dos games. E torcendo pelo sucesso da indústria como um todo, para quem sabe, os ausentes possam observar oportunidades de retorno. Até lá.