O game over de Shenmue é a prova de que até nos games, paciência tem limite
O game over é algo que anda lado a lado com o jogador. Mais presente no passado, a temível tela era sinal de que era preciso começar a aventura tudo de novo. Atualmente, com o formato dos jogos e o conceito de fim de jogo, tais telas se tornaram mais amenas, servindo até para os desenvolvedores criarem coisas interessantes através delas.
Mas há alguns games que lidam com o “fim de jogo” de forma bem únicas. Como Shenmue, o clássico da SEGA que saiu para Dreamcast, e trazia uma proposta única em sua época, com conceitos que seriam evoluídos com o passar dos anos, rendendo o que conhecemos hoje como jogos de mundo aberto.
Como bem sabemos, Ryo Hazuki precisa investigar Lan Di, para se vingar de seu pai e acabar com os planos do vilão. E dentro de Shenmue, para atingir este objetivo o personagem precisará conversar, executar tarefas, lutar e até trabalhar no porto da cidade. É um processo bem “cotidiano”, com o dia a dia de uma pessoa sendo incorporada à trama, já que o personagem tem que perseguir o vilão, mas cumprir uma rotina diária, com manhã, tarde, noite e sono.
O jogo começa no dia 29 de novembro de 1986, com os eventos iniciais colocando tanto protagonista quanto jogador na situação, em um contexto sem respostas, que devem ser procuradas. A partir daí, inicia-se uma jornada onde o personagem terá que sair pelas ruas da cidade, e fazer todas as possibilidades oferecidas pelo jogo.
Dia após dia, o personagem pode progredir, ou não, na trama. Eventos podem ser agendados, vistos ou perdidos, com Ryo precisando prestar atenção nos detalhes, e ir progredindo em sua aventura, mas também podendo gastar seu tempo nos fliperamas disponíveis ou participando de atividades das mais variadas.
De qualquer forma, paciência tem limite. Até pra Lan Di. Jogadores dedicados de Shenmue, passam pelos dias do game, comemoram o natal em Yamanose e em meados de janeiro de 1987, resolvem as questões e colocam um ponto final no game. Mas, ainda assim, é possível demorar um pouco mais dentro do jogo, caso o jogador tenha alguma dificuldade.
E, de fato, o game é bem amigável, permitindo que o jogador gaste mais tempo dentro do game. Seja para explorar mais o que o game tem para oferecer, ou mesmo para dar mais tempo para quem não consegue ainda resolver o desafio.
Mas se o jogador chegar em abril de 1987 sem nada resolvido, o game começa a perder a paciência com você. E é preciso deixar claro que, mesmo os jogadores menos capacitados de Shenmue não conseguiriam demorar tanto para terminar o game. Especialmente hoje, na era dos detonados em vídeo, e disponíveis de forma tão simples, diferente dos tempos das revistas de games.
Assim, tal “game over” acaba sendo um bom final secreto. Para chegar neste ponto, é preciso que, literalmente, o jogador não faça nada além de acordar, passear e dormir, com zero avanços na trama. Algo que, dentro do contexto do jogo, é raro de se acontecer. Mas em primeiro de abril, curiosamente, no dia da mentira, Ryo tem mais um sonho com Shen Hua, mas desta vez, com a garota o alertando sobre um “inimigo sinistro que está se aproximando”.
Este sonho, na verdade, é um aviso. Ryo tem mais duas semanas para colocar um ponto final em sua jornada. Se o jogador não fizer nada a respeito até o dia 15 de abril, aí tanto o game quanto Lan Di perdem a paciência e eles que decidem resolver tudo de uma vez por todas.
Shenmue gira em torno de dois espelhos, importantes para a trama. O primeiro espelho foi roubado por Lan Di, e o segundo deve ser procurado pelo jogador. E de fato, é encontrado com o passar dos dias, e da história. Mas se o jogador “atrasar” quase quatro meses a mais do que o esperado para se terminar o game, é Lan Di quem acaba descobrindo o paradeiro do artefato.
E descobrir o paradeiro do artefato significa Lan Di indo até você e matando Ryo, garantindo o “final ruim” do game. Se você não liga para spoilers, o final é este aqui, com direito a “game over”:
O “final ruim”, afinal, é uma maneira de incentivar o jogador a ter a experiência que os desenvolvedores programaram para o game. Isso tudo por causa de uma busca por dinheiro que Ryo precisa, para um objetivo dentro do game. A questão é que o personagem ganha uma mesada diária e, caso o jogador quisesse, poderia simplesmente ignorar o resto do jogo a partir do momento em que tal necessidade aparecesse e vivesse “de mesada”, terminando o jogo “pulando” boa parte da história.
Desta forma, o jogo impõe um limite de tempo, e bem longo por sinal, suficiente tanto para que o jogador possa explorar e terminar o game sem nenhuma pressão, mas curta o bastante para que o jogador não “trapaceie” cumprindo seu objetivo financeiro na base da mesada, explorando o game do jeito que deve ser explorado.
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