RetroArkade – A história do TurboGrafx-16, console que vai voltar em versão mini
No mundo oriental dos videogames, há consoles e games que nós ocidentais só conhecemos pela superfície, ou através de alguma boa alma que foi até o outro lado do mundo, e dividiu conosco o que trouxe de lá. Entre estes videogames, temos o TurboGrafx-16, que no Japão, era conhecido por PC Engine.
Um console extremamente popular no Japão, e que contou com inúmeras inovações, surpreendentes para a sua época, contou com uma versão ocidental, mas teve um desempenho muito mais tímido. Toda essa história irá retornar, após o anúncio da Konami, nesta E3. A empresa, atual dona da Hudson, uma das fabricantes do videogame, irá relançar, em formato mini, o console.
Por isso, nada mais justo que contar a história de um videogame tão importante.
Do Bomberman para os videogames
Se falamos de TurboGrafx-16, temos que lembrar de Bomberman. Isso porque em 1985, a Hudson, empresa criada pelos irmãos Yuri e Hiroshi Kudo lançaram, para o NES, um dos maiores títulos do console, envolvendo, justamente o querido personagem que explode tudo. A empresa, que já existia desde 1973, decidiu, então, apostar em um console, acreditando que possuíam o necessário para o sucesso: conhecimento do mercado, e games.
Faltava apenas uma coisa: a tecnologia necessária. E ela veio, através da gigante de tecnologia japonesa NEC. A união das empresas, que compartilharam conhecimentos e tecnologia rendeu o PC Engine. Lançado em 1987, ele tinha uma proposta bem clara: ser mais potente do que o NES, e oferecer games com tecnologia superior.
E o console era, de fato poderoso, para a época. Tinha uma CPU central de 8-bits, e duas gráficas de 16-bit. E, justamente por isso, o console foi vendido como um de 16-bit, para dar ao mundo do videogame a ideia de que, de fato, era um videogame de uma nova geração. Na prática, o console era muito melhor do que o NES, mas se mostrou inferior aos consoles que de fato eram de 16-bit, como o Mega Drive, e o Super Nintendo.
Mesmo assim, o console oferecia novidades para a sua época: 512 cores e som estéreo não era comum, ainda. E, ainda assim, o console era pequeno. O design compacto, que usava o mínimo possível, ganhou gosto entre o público. E muito desse design diminuto veio devido ao formato dos games. Ao invés de cartuchos, ele usava cartões de memória. No caso, as HuCards. Os cartões traziam maior praticidade, e garantia um espaço menor para slots no videogame.
No Japão: sucesso e um dos maiores videogames de todos os tempos
Assim, os japoneses tinham à disposição algo muito interessante. Eles poderiam ter um sistema prático, com hardware sofisticado, e games de qualidade. Street Fighter (que era chamado de Fighting Street), o original, por exemplo, foi exclusivo do PC Engine. Ports de games dos arcades também agradavam, além da própria Hudson, que garantia mais games para o público.
Tanto é que, quando o Mega Drive foi lançado, em 1989, o console encontrou uma parada dura para enfrentar, anos antes da chegada do Super Nintendo. Porém, em terras nipônicas, o PC Engine seguiu fazendo sucesso, mesmo com a força da concorrente. Pelo menos, até a explosão de Sonic, e a chegada do Super Famicom, o videogame teve seu reinado intocável.
Tal reinado durou até 1991, com a chegada de Super Mario World, e do primeiro Sonic the Hedgehog. Mas ainda assim, mesmo perdendo espaço, o console seguiu bastante popular por lá, recebendo games novos e garantindo uma biblioteca competente. Street Fighter 2 contou com versão para o videogame, assim como Bonk’s Adventure, um clone de Mario, bastante competente.
Super Star Soldier foi outro grande sucesso, assim como três clássicos absolutos: Snatcher, o adventure de Hideo Kojima do MSX, que ganhou port para o sistema, Splatterhouse, e Dracula X: Rondo of Blood. O console ainda teria suporte de games da SNK, como Fatal Fury Special, e foi lar de uma franquia importante de futebol: o Formato Soccer On J League. O console desfrutou de variedade de games no Japão, fundamental para um sucesso de um sistema.
Nos EUA: um console esquisito, que ninguém viu
O ocidente recebeu o console anos depois. E este foi um dos primeiros fatores que atrapalhou muito o desempenho do console. Em 1989, chegou o TurboGrafx-16, o novo nome do console, que também ganhou um novo design, maior, “como americano gosta”. Os franceses também receberam o console neste ano, enquanto o resto da Europa só o conheceu em 1990.
O console foi retrabalhado, no possível, para se adequar a um novo mercado. Ganhou um nome “tipicamente made in USA”, com as palavras “Turbo” e o “X”, além do 16, que servia para “garantir” que era uma novidade em 16-bits, em uma época na qual a Sega mirava os EUA também, com o seu Genesis.
O problema é que, tirando “a casca”, sua essência ainda era tipicamente japonesa, o que dificultava, por questões culturais, seu desempenho em vendas. O game que o acompanhava, Keith Courage in Alpha Zones, além de ser um jogo regular, não tinha qualquer apelo comercial, para acelerar vendas de um console. O Genesis vinha acompanhado de Altered Beast, por exemplo.
Outro problema do console era a porta única do controle. O mesmo erro que o 3DO cometeu, anos mais tarde. Em época na qual jogos para dois jogadores era bem comum, era estranho explicar que era preciso comprar um acessório extra para jogar com mais jogadores. Também errou ao vendê-lo nos EUA como “um console de 16-bit”. O mesmo erro que o Jaguar cometeria, anos mais tarde. Os jogadores percebiam as diferenças entre TG-16 e o Super Nintendo.
E, por fim, havia um outro problema. Era a Nintendo, que dominava praticamente a maioria dos estúdios, e exigia exclusividades. Assim, a biblioteca do console nos EUA foi extremamente limitada, com títulos quase que apenas da própria Hudson. Se no Japão o console era visto como sofisticado (pelo menos em seus primeiros anos), e com uma biblioteca de títulos interessante, no ocidente a sua impressão era totalmente oposta: a de um videogame atrasado, e de poucos jogos.
Tanto é que poucos jogadores apostaram no console. No Brasil, muitos jogadores nunca nem chegaram a ver um console destes de perto. Pois, mesmo que alguém conseguisse comprá-lo, que garantia teriam de ter jogos novos? Nem as locadoras apostavam nisso. Assim, muitos games só conheceram o console mesmo, mediante às revistas de videogame da época, que apresentavam um game aqui, e outro ali.
E quais foram as versões do console?
O PC Engine foi desenvolvido para ser um videogame prático, pelo menos no Japão. Isso garantiu para o console uma rica variedade de versões, que variam da original, uma com CD, e até um portátil. Novas tecnologias, e modelos mais acessíveis, foram a marca registrada da iniciativa da NEC e da Hudson.
Em 1989, anos antes de Xbox One X, Playstation 4 Pro e todo esse papo de “teraflops”, a NEC lançou o seu “PC Engine X”. Chamado de SuperGrafx, o videogame rodava todos os games, além de outros, exclusivos para o aparelho, com visual melhorado. Entretanto, foram apenas cinco games os que contavam com o “upgrade”.
Outras versões do console envolvem o Core Grafx, o Core Grafx II, o PC Engine Shuttle, e o PC Engine LT. O LT, inclusive, vinha com uma tela de cristal líquido no próprio aparelho, e já permitia que o drive de CD fosse acoplado. Sim, o PC Engine foi um dos pioneiros dos consoles a rodar CD, e já falei sobre isso em outra oportunidade.
Em 1990, chegou o PC Engine Duo. O Duo no nome significava que, agora, era possível ter o console e o leitor de CD-ROM em um só aparelho. E ainda oferecia mais memória. Em 1992, o TurboDuo oferecia ainda mais potência no conceito de console mais leitor de CD. E, ainda em 1990, chegou o Turbo Express, um portátil que aceitava os games em cartão, e tentou, sem sucesso, rivalizar com o Game Boy.
A NEC ainda lançou o PC Engine Duo-R, e o PC Engine Duo-RX, entre 1992, e 1993. Em 1994, enfim, a NEC lançou um legítimo sucessor. O PC-FX chegaria para rivalizar com o Playstation e Saturn. Mas além de não fazer lá muito sucesso, nunca saiu do Japão. O videogame foi produzido até 1998.
Legado do TurboGrafx-16 / PC Engine
Como dois produtos diferentes, o console da Hudson/NEC tem boas lições para ensinar. O PC Engine mostrou que, é possível se manter competitivo, mesmo quando novidades mais avançadas chegam, desde que a biblioteca de jogos seja atraente. O TurboGrafx-16 mostra exatamente o contrário: que um console sem jogos, não consegue fazer sucesso, independente do que ele tenha em hardware.
O PC Engine também contou com diversas atualizações durante sua vida. E, de certa forma, é desta forma que a indústria do videogame está trabalhando, ao manter sua base de games, e consoles atualizados, como o Xbox One X, e o PS4 Pro. Isso sem mencionar na impressão de que os seus próximos consoles seguirão com esta filosofia.
O console deixou também as primeiras iniciativas quanto ao uso do CD-ROM como mídia. Se no início, os desenvolvedores não sabiam o que fazer com as novas possibilidades, com o passar do tempo, pudemos acompanhar ótimos e melhores jogos, usando o disco como mídia. Basta lembrar da história de Final Fantasy VII, que deixou o Nintendo 64, em nome de “mais espaço”, sendo, assim, um dos maiores games da história.
Vários fatores deixaram o TurboGrafx-16 bem distante de nós. Foi apenas com a emulação, e a adição de seus games no Virtual Console, que pudemos acompanhar melhor seus games. E, apesar de não ser um anúncio tão vibrante, quem sabe a versão mini da Konami não seja uma maneira de fazer algum curioso, ter um pouco sobre o que é jogar no console que, apesar de não ser o mais conhecido por aqui, tem status de cult. Por seus próprios méritos.