Voice-Chat Arkade: Por que você joga FIFA cara?
Recentemente, nas minhas andanças pela internet, eu encontrei este texto, da coluna VICE Vs Video Games, sobre como FIFA ajuda os homens a lidar com seus sentimentos. O que me fez refletir sobre certas experiências similares que tive ao longo do meu amadurecimento, e mais recentemente a enxurrada de preconceito que transborda quando falo que sou jogador assíduo do joguinho em questão.09
Vivemos numa época de extremos. As opiniões são reforçadas por meros achismos e avaliações superficiais daqueles que arranjaram um grande público de maneira rápida demais, ou sem muito esforço. Tornando assim a internet, com ajuda da anonimidade, um eterno coliseu de chorume, onde alcançar o meio termo é uma via crúcis obsoleta. Isso anda dificultando certo diálogo que, volta e meia, precisamos ter acerca de assuntos mais sensíveis.
“Você joga FIFA?”, “Ah, esqueci que você é um fifeiro” ou “Por que você joga FIFA cara?” são as frases que mais ouço dos amigos próximos, tão gamers quanto eu, quando caímos no assunto casual ou hardcore, que pra mim é um rótulo insignificante, mas isso já é um outro texto. Por mais que já tentei discutir isso com eles, eu, no fundo, entendo o motivo do preconceito perante quem é rotulado como um fifeiro. É inegável que exista uma esmagadora quantidade de jogadores – não só de FIFA mas dos triple-A em geral – que são sexistas. E este fato fora reforçado quando pipocaram os comentários machistas sobre o anúncio das seleções femininas no próximo jogo da EA, o que me fez repensar toda minha posição nessa discussão, sendo o fifeiro que sou.
Imagine que você acabou de se mudar para um bairro novo. Você desce com sua bola chuveirinho, afinal não há como não fazer amizades através do esporte mais famoso do mundo, e não só é hostilizado como sofre de abuso quando tenta se aproximar dos outros moradores, aficionados por futebol assim como você. Se eu te contar que isso acontece todos os dias numa proporção de 4 mulheres para cada homem, no meio online, é algo a se pensar, certo?
É triste ter que admitir que aqueles seus amigos de infância, que cresceram contigo, não mudaram os discursos que ouviam dos pais ao longo dos anos. Não buscaram outras referências, e pior, não internalizaram a autocrítica, afinal, sem ela não há a evolução do bom senso e julgamento. Assim que me sinto com FIFA em questão. Um jogo que me acompanhou por praticamente toda uma vida, um casamento sem divisões de bens. Claro, houve traições ao longo deste percurso (WE e PES), mas não foram nada além de pedras num sapato que formaram um forte alicerce.
No inicio do relacionamento, fingimos não ver os defeitos do parceiro. Eu era incrivelmente indulgente em relação aos comentários machistas que notava na comunidade, seja em fóruns, em discussões nas noticias ao redor da web e de colegas que conheci em campeonatos. Sim, eu era um fifeiro de carteirinha. Era notável o ambiente que me acomodara quando jovem, que por tanto tempo vi como um lugar seguro, mas ele se transformava a medida que eu amadurecia, e as coisas começaram a mudar de figura. Eu mudei, mas não é por isso que todos devem me acompanhar, então o que fazer?
Rapidamente eu me vi como se eu participasse de um público que, genericamente falando, não me representava mais. Seja em ideais e atitudes, minha única ligação com aquilo era o meu amor por futebol, e me afastei. FIFA pra mim acabou se tornando, cada vez mais, uma experiência solitária e desinteressante, a ponto de ouvir meus podcasts enquanto pegava uma partida contra o computador, ou, raramente, um amigo próximo no online. É como se eu usasse o jogo como um momento de guilty pleasure. Um momento de nostalgia recente, mascarado num torpor moribundo. Então por qual motivo ainda jogo FIFA? Simples, acomodação.
No fim das contas o FIFA se tornou, pra mim, um casamento entediante tradicional, que já deu o que tinha que dar, e que a qualquer sinal de comentário opinativo, de quem está do outro lado, me faz largar o controle, na maioria das vezes. Não é como se eu não gostasse de jogar, de ler sobre as novas funcionalidades a cada novo lançamento, mas é apenas como se fosse um fetiche para esquentar um relacionamento muito longo. Algo que passa tão rápido quanto uma chuva de verão após os primeiros meses de nova edição.
Não culpo os fifeiros por terem me desmotivado, até porque conheci ótimas pessoas nesse meio tempo, muito menos os desenvolvedores(apesar do que parece, para os leigos, realmente há mudanças significativas entre os lançamentos), ou qualquer outra pessoa, isso é um problema meu. Uma desconstrução. Pode ser um pensamento infantil ou utópico, mas prefiro me abster do que aturar uma ignorância inexorável.
A gente as vezes só cansa de fazer parte do sexismo dissimulado e institucionalizado que permeia a comunidade de games. Eu deveria então analisar melhor os demais games que jogo? Talvez sim, mas uma coisa digo, parando para pensar agora, já faz muito tempo que não sei o que é, ativamente, participar de uma comunidade online de qualquer jogo que seja. E isso é triste de assumir, porque sei que existem comunidades ótimas das quais adoraria fazer parte, mas sou vencido pela minha própria intolerância perante possíveis futuras frustrações.
Quanto a mim, vou continuar jogando FIFA sim… Mas no aleatório com pessoas estranhas? Talvez hoje não, quem sabe um dia eu me reanimo, deixa eu ver quem está online na minha lista de amigos mesmo. E olhe lá, prefiro modo carreira no fim das contas.