Análise Arkade: a beleza e a melancolia de Valiant Hearts (PC, PS3, PS4, X360, XOne)

5 de julho de 2014

Análise Arkade: a beleza e a melancolia de Valiant Hearts (PC, PS3, PS4, X360, XOne)

Chegou a hora de voltarmos 100 anos no tempo para uma dramática visita à Primeira Guerra Mundial. É a nossa resenha do belo Valiant Hearts que você confere na sequência!

Os desavisaods podem bater o olho neste jogo e achar que se trata de mais um jogo indie feito por um estúdio qualquer. Ledo engano: Valiant Hearts foi produzido pela Ubisoft — mais precisamente pela Ubisoft Montpellier, que tem no currículo a série Rayman e o famoso Beyond Good & Evil — em homenagem ao centenário da Primeira Guerra Mundial.

Essa “cara” de indie vem por conta da UbiArt Framework, a belíssima engine que o estúdio francês usou nos últimos jogos do Rayman e também no recente Child of Light. Mas não se deixe enganar pelo visual “bonitinho”: por tratar de um assunto delicado como a Primeira Guerra, Valiant Hearts é um jogo dramático e melancólico, mas ainda assim muito bonito.

SINOPSE

A história de Valiant Hearts se passa entre 1914 e 1917 e acompanha nada menos que 4 personagens distintos: Emile, Karl, Freddie e Anna. Alguns já se conhecem, outros não, mas de um jeito ou de outro, seus destinos irão se cruzar por conta da Guerra.

Análise Arkade: a beleza e a melancolia de Valiant Hearts (PC, PS3, PS4, X360, XOne)

Karl é recrutado para o exército alemão, enquanto seu sogro, Emile, é mandado para as linhas francesas. Freddie é um norte-americano durão que trava uma guerra pessoal contra o temível Barão Von Dorf, um dos mais gabaritados comandantes alemães. Por fim, temos Anna, filha de um cientista que foi sequestrado por Von Dorf que se voluntaria para ser enfermeira na Guerra, na esperança de descobrir o paradeiro de seu pai.

Ah e não podemos esquecer também do nosso companheiro canino: já no início do game, Emile é salvo por um simpático War Dog, apelido dado as cães que, no front, eram usados para buscar pessoas em escombros e cumprir outras atividades, e acaba fazendo amizade com o bichinho, que irá se tornar um importante aliado no game.

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Com exceção de Freddie, porém, ninguém está ali por escolha. Karl é tirado à força de seu lar, deixando para trás sua esposa Marie e seu filho recém-nascido. Para piorar, não tarda para o pai da moça, Emile, também ser recrutado, o que deixa Marie sozinha e desamparada com seu filho.

Este, aliás, é sem dúvida um dos maiores trunfos da trama de Valiant Hearts: aproximar a Guerra da vida dos cidadãos comuns. Valiant Hearts nos lembra o tempo todo do drama dos camponeses e das pessoas comuns que foram arrancados de seus lares contra sua vontade para virarem soldados e morrerem por seu país.

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Se você se acha durão, prepare para testar a força de suas emoções com este jogo: o clima de desesperança e melancolia é constante, e você vai se pegar torcendo e sofrendo junto com os personagens.

JOGABILIDADE

Valiant Hearts é essencialmente um adventure game recheado de puzzles. Você está na Guerra, mas não ache que vai sair por aí distribuindo headshots e jogando granadas: sua missão no meio do caos e da matança é basicamente cumprir ordens, ajudar pessoas e (obviamente) sobreviver.

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Para fazer tudo isso, você deve resolver puzzles que até são variados, mas que acabam se tornando repetitivos no decorrer das 6 ou 7 horas de campanha. Existem várias missões do tipo “garoto de recados” (busque e entregue itens), que funcionam em paralelo com puzzles envolvendo alavancas, canos, elevadores e lugares inacessíveis: você precisa ajudar as pessoas certas para ter acesso a um lugar ou item específico, para só então prosseguir. Além disso, cada personagem possui algum item ou habilidade único, como uma pá ou um alicate, todos bem úteis no gameplay.

Algumas missões são bem prosaicas: preparar o jantar de seu superior, entregar o cachimbo de um soldado ou dar um jeito no encanamento para fazer com que a a água chegue até o galpão onde os soldados tomam banho. Porém, estas missões “bobinhas” geralmente estão entrelaçadas com objetivos importantes, pois aquele soldado do cachimbo vai sair da frente de uma passagem importante para fumar, e aquele soldado que queria tomar banho vai deixar de lado algum item que você precisa para avançar. Esta sinergia funciona muito bem, pois mantém o jogo fluindo mesmo durante as missões mais sem graça.

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Como em outros jogos do gênero, na maioria dos casos você pode ver uma dica de como resolver o puzzle. Os puzzles mais complicadinhos possuem até 3 dicas cada, mas o jogo tem um timer entre uma dica e outra para te obrigar a pensar um pouco. E isso é muito bom, pois a maioria dos enigmas pode ser resolvida com um pouquinho de atenção e raciocínio lógico. Não desista na primeira, pense mais um pouco antes de apelar para as dicas!

Para cumprir diversos objetivos, você precisará da ajuda de seu fiel companheiro canino: extremamente obediente, seu amigo peludo é capaz de passar por buracos e passagens pequenas, escavar e coletar itens, puxar alavancas e muito mais. Basta manter pressionado o botão L1 (no PS4) para dar ordens ao cãozinho. E não esqueça de fazer um carinho no dog sempre que ele lhe ajudar, ok? =)

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Além de todos estes puzzles, existem ainda trechos de perseguição, combate e stealth onde geralmente precisamos atirar menos e sobreviver mais: distrair inimigos, evitar ser visto se escondendo atrás de arbustos e trincheiras, acertar o timing de disparo e recarga de um inimigo para escapar, plantar bombas, desmantelar defesas inimigas… existe uma boa variedade de missões mais voltadas para a ação, e em algumas delas podemos inclusive pilotar tanques enormes e distribuir uns tiros.

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Outras fases bacanas envolvem Anna e seu carro: em mais de uma ocasião no jogo, você terá que dirigir, enquanto desvia de bombas e obstáculos. Nessas horas, a câmera vai para a frente do carro, e temos indicações visuais na tela para saber quando desviar. Esses trechos lembram um pouco as boas e velhas fases tipo “bola de neve” da série Crash Bandicoot e são bem divertidos.

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Por ser a enfermeira do grupo, Anna também tem que salvar a vida de muitas pessoas. Nessas horas, somos levados a um quick time event temático meio chatinho, onde botões vão passando por uma bandagem, e devem ser pressionados no timing correto. Quanto mais limpa a bandagem, melhor o seu desempenho, então capriche, pois nessas horas as vidas das pessoas estará em suas mãos!

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E não podemos esquecer das batalhas contra chefes, que são muito dinâmicas e engenhosas. O combate raramente é direto, e na maioria dos casos você precisa usar elementos do cenário para acertar o boss, ou pedir um auxílio para seu cachorro. Os confrontos são tão legais e criativos que eu gostaria muito que tivessem mais deles pelo jogo.

VERDADES DE GUERRA

Embora apresente personagens fictícios envolvidos em uma trama exageradamente dramática, Valiant Hearts se apoia em eventos e fatos para desenvolver sua trama. É bem pouco provável que alguma batalha da Primeira Guerra tenha envolvido um órgão de igreja (?!), mas por trás destas liberdades poéticas, há um embasamento histórico muito aprofundado.

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As fases geralmente são divididas por data e por região (ambos reais), e a cada novo lugar visitado, você habilita uma pequena data base que traz um panorama sobre aquela região e sua importância na Guerra. Esta pequena enciclopédia é ilustrada com fotos reais daquele período, é bem didática e muito interessante, e além de ser totalmente em português (como todos os outros textos e menus do jogo), se preocupa até em mostrar um pouquinho da atuação brasileira na Guerra.

Mais do que isso, todos os cenários escondem cartas, documentos e itens (moedas, dog tags, armas e munições, cantis, objetos de higiene pessoal, etc.) que também chegam acompanhados de pequenos textos explicativos que nos dão um vislumbre de como era a dura vida dos soldados no front.

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Nunca fui um entusiasta do assunto Primeira Guerra Mundial, e meus conhecimentos sobre o assunto eram oriundos basicamente das aulas de História do colégio. Justamente por isso aprendi muita coisa bacana jogando Valiant Hearts, e descobri alguns fatos bem curiosos sobre este período tenso de nossa história.

Por exemplo: em 1915, a Alemanha surpreendeu as tropas francesas ao utilizar o gás cloro em combate. O gás cloro não é venenoso, mas causa uma irritação absurda nas vias áreas, que incham a ponto de impedir a respiração. Os franceses não esperavam por um ataque químico, e por conta disso, milhares de soldados morreram, pois não havia tempo para trazer máscaras ou qualquer outro equipamento de proteção adequado para o front.

Sabe qual foi a solução improvisada pelos soldados franceses para contornar o problema? Xixi! Sabe-se lá como alguém descobriu que usar um pano ensopado com urina sobre o nariz e a boca minimizava a ação do gás! Curioso, não?

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E essa é só uma das curiosidades legais que descobri com o game: de capacetes de metal de soldados mortos que eram usados como braseiros em noites frias até chuvas que matavam dezenas de soldados afogados em suas trincheiras (?!), Valiant Hearts está cheio de informações bacanas — e reais — sobre a Primeira Guerra Mundial.

Vi sites afirmando que estas informações são invasivas — de fato, elas “popam” na tela sempre que você encontra algum item importante — mas isso não me incomodou. Muito pelo contrário, acho que se eu tivesse que ficar pausando o jogo e tendo que entrar em menus para ler estes dados, acabaria deixando passar muita coisa bacana.

AUDIOVISUAL

Por ser feito com a belíssima UbiArt Framework, espere por um visual no mínimo incrível. Aqui o tom de pintura de Child of Light é deixado de lado em prol de um visual mais com cara de história em quadrinhos. Como em um gibi, a identidade visual dos personagens é bem marcante, e é fácil perceber o que eles estão sentido. A narrativa também usa recursos típicos de HQs: ações paralelas aparecem em “quadrinhos” separados e todos os diálogos acontecem por meio de balões.

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Como em Rayman Legends, o visual é totalmente 2D, mas os cenários possuem diferentes “camadas”, como se fossem vários planos 2D colados um sobre o outro. Vez ou outra você pode avançar para a frente ou para o fundo do cenário, mas fique ligado, pois as vezes é meio difícil enxergar a passagem capaz de te levar de um plano para outro.

Há muitas repetições de modelos de personagens, mas fica a impressão que isso foi intencional, para criar uma espécie de estereótipo visual dos soldados do bem e do mal. O que não é proposital é a falta de resolução: quando a câmera aproxima de personagens e detalhes do cenário para um zoom dramático, podemos ver aquela “sujeira pixelada”, como quando esticamos demais uma foto pequena, sabe? É um detalhe feio, mas que não desmerece a incrível beleza desse jogo.

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Falas são raras em Valiant Hearts: temos um narrador e algumas leituras de cartas nas cutscenes, mas durante o jogo os personagens basicamente murmuram (embora seja possível entender algumas palavras), e os balões de fala mostram ilustrações para indicar o que eles querem ou qual seu estado de espírito. É bem simples, mas funcional.

a trilha sonora mistura temas melancólicos em piano com marchinhas e temas típicos das forças armadas. Estes últimos são executados com tambores, cornetas, pratos e todos aqueles instrumentos típicos de uma banda marcial real, o que causa uma impressão bem bacana. O conjunto da obra é incrível, digno de botar para ouvir no MP3.

CONCLUSÃO

Valiant Hearts é o tipo de jogo que pode não agradar a todos. Ele é relativamente fácil, relativamente curto, relativamente repetitivo e praticamente não tem nenhum fator replay. A sua assumida “cara” de jogo indie também pode afastar muitos jogadores que estão acostumados a jogos de Guerra que envolvem tiroteios frenéticos, gráficos realistas e cabeças explodindo.

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Porém, se você não faz parte deste grupo, e entende que videogames podem ser obras de arte capazes de contar belas histórias e mexer com nossas emoções, então com certeza precisa dar uma chance para este jogo. Melancólico, bonito e educativo, Valiant Hearts presta uma bela homenagem aos 100 anos da Primeira Guerra, e é capaz de fazer muito marmanjo chorar.

Valiant Hearts foi lançado digitalmente no dia 24 de junho, com versões para PC, PS3, PS4, X360 e XOne.

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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