Análise Arkade – Dying Light 2: Stay Human fica entre o ótimo e o inconstante
Anunciado inicialmente durante a E3 de 2018, Dying Light 2: Stay Human é um jogo de ação e sobrevivência pós-apocalíptico bastante focado em parkour. A continuação do game de 2015 levou bastante tempo para chegar ao público, mas após alguns bons adiamentos, finalmente está entre nós. Se o primeiro jogo aproveitou a alta do parkour em videogames lá em 2015, essa continuação aparenta querer chamar ainda mais atenção.
O game que se passa anos após os acontecimentos do primeiro jogo, em um novo local e com um novo protagonista, e traz evoluções claras de gameplay se comparado ao seu antecessor. Seja visualmente, em aspectos de layout, na história ou até nas mecânicas de movimentação, Dying Light 2 é uma clara evolução do primeiro game. Entretanto, ele ainda comete erros questionáveis que não passam despercebidos. Mas vamos falar disso com mais calma ao longo da análise.
Villador e a busca pela sua irmã
O enredo de Dying Light 2 se inicia de modo bem clichê para a sua temática. Após o surto viral que gerou todos os acontecimentos do primeiro jogo, o vírus sofreu mutações gerando variantes que acabaram por dizimar a população mundial. Isso resultou na extinção de 90% da população, fazendo com que os sobreviventes vivessem em assentamentos isolados, como uma releitura dos feudos, em versões pós-apocalpticas.
Nesse contexto, entramos na pele de Aiden, um dos chamados Peregrinos, desbravadores do mundo aberto especialistas em sobreviver às hordas de zumbis, desbravando territórios inóspitos. Os Peregrinos são os únicos aptos a atravessar o território de um assentamento para outro. Após um tutorial bem vago e desnecessário, Aiden chega à cidade de Villador, na qual, de acordo com pistas, poderá encontrar um dos responsáveis pelo desaparecimento da sua irmã anos atrás.
Nesse meio tempo ele acaba se deparando com Hakan (interpretado por ninguém menos que David Belle, um dos criadores do Parkour). No jogo, ele é um mercenário sobrevivente da cidade que serve como guia e melhor amigo do protagonista ao iniciar sua aventura. E a partir daí, como todo bom jogo ambientado em apocalipses zumbis, temos reviravoltas e tensões que ao mesmo tempo mostram a decadência da civilização e também o impacto da ausência desta para indivíduos separadamente.
A história sem dúvida tem seus pontos altos, mesmo que seja clichê na maior parte do tempo. A participação de figuras conhecidas como o já citado David Belle (que foi protagonista do filme B13) ou a atriz Rosario Dawson (que interpreta Ahsoka Tano em The Mandalorian) ajudam a dar mais personalidade para os personagens. Além também do jogo estar completamente dublado em português brasileiro, o que ajuda ainda mais na imersão.
Fazendo parkour no apocalipse
Se a franquia Dying Light se destaca por algum elemento, definitivamente não é por ser “mais um jogo de zumbis”, mas sim por ser um jogo de Parkour com zumbis. No primeiro game isso chamou bastante atenção, mesmo que a mobilidade fosse um pouco atrapalhada e não muito precisa precisa. Em Dying Light 2, vemos uma clara evolução nesse aspecto.
Desde o início do jogo é possível notar que a movimentação de Aiden é bastante fluida, com algumas mecânicas de movimentação se tornando bem mais precisas do que eram anteriormente. Se antes o jogador saía correndo e podia apertar o botão de salto desenfreadamente que por sorte poderia fazer algo sem entender nada, agora temos plena consciência de cada movimento que nosso personagem é capaz de fazer.
Essa evolução na movimentação é bastante significativa para você aproveitar Dying Light 2 como deve. Uma vez que o mundo aberto do jogo foi construído de modo a se assemelhar bastante com um jogo de plataforma bastante vertical. Seja durante o dia ou a noite, o ideal é que você percorra a cidade por cima das construções — as ruas quase nunca são seguras.
Isso gera o comportamento de traçar rotas que condizem com a sua capacidade de movimentação naquele momento, que vai sendo expandida com novas habilidades durante o decorrer do jogo. Aqui é preciso citar outro ponto positivo de Dying Light 2: seu mundo aberto. Para os padrões do jogo — e em comparação com o game de 2015 –, o mundo está muito mais bem construído e propício para o Parkour.
Combate não tão afiado assim
Se a movimentação de Dying Light 2 está estupenda, infelizmente não podemos falar o mesmo do seu sistema de combate. Dizer que ele é básico demais talvez resuma um pouco o que percebi dele. O problema é que ele tenta não ser básico, mas acaba falhando nessa tentativa. Isso porque o combate gira em torno do sistema de stamina que garante suas esquivas, defesas e golpes potentes.
O problema é que o sistema é pouquíssimo preciso no que tange movimentação e controle, com o timing para defesas e acertos sendo bem inconstante. Além disso, Dying Light 2 é repleto de habilidades que giram em torno de duas árvores, uma focada em Parkour e a outra em combate. Falarei mais sobre essas árvores de habilidades já já, mas aqui é importante citar que as habilidades de combate são complicadas demais para serem executadas na prática, de forma fluida, no calor dos combates.
Numa tentativa de tornar os combates mais diversificados, criou-se um sistema de combate que utiliza movimentos de Parkour nada convencionais durante a pancadaria. Isso é uma ideia interessante, mas na prática simplesmente não funciona. A movimentação — que em cima dos prédios é muito fluida e natural — se torna pouco natural e nada prática com o que acontece nas lutas.
Além disso, mesmo as habilidades mais simples e iniciais da árvore de combate são difíceis e pouco práticas de serem executadas. Acaba sendo mais vantajoso para o jogador ficar no velho e tedioso esquema de “bate e defende” do que inventar moda com técnicas que vão acabar fazendo você se arriscar mais (e tomar mais dano). Isso tudo principalmente contra humanos, já que raramente mais de dois inimigos vêm te atacar ao mesmo tempo.
Quando a noite cai…
Se o combate contra humanos é frustrante, contra zumbis a experiência pode ser um pouco diferente. Isso porque o comportamento dos zumbis é bem diferente do dos humanos, principalmente no que tange a sua inteligência artificial. Enquanto os humanos são limitados e previsíveis, os zumbis (principalmente de noite) são vorazes, erráticos, e atacam todos ao mesmo tempo.
Os zumbis mais evoluídos não se destacam tanto, não saindo do padrão de outros jogos como Left 4 Dead 2 ou até Days Gone. Com alguns inclusive podendo ser confundidos com os zumbis mais b´ásicos do game. Porém, são inquestionavelmente mais desafiadores do que os humanos, quase sempre sendo mais vantajoso fugir deles do que enfrentá-los.
E aí chegamos na mecânica de jogo mais interessante de Dying Light 2, seu ritmo circadiano de exploração. Existem diversas atividades a serem feitas durante o dia, principalmente que envolvem humanos e explorações mais verticais. Porém, existem também diversos lugares que durante o dia são praticamente impossíveis de serem invadidos, uma vez que, nesta versão do apocalipse, os zumbis se escondem do Sol dentro de construções.
Assim, existe também todo um conjunto de atividades e coletáveis que precisam ser obtidos durante a noite, onde as ruas são praticamente uma sentença de morte, mas o interior das construções não está tão cheio assim, uma vez que os infectados saíram às ruas. Nesses momentos temos algumas mecânicas de stealth interessantes que, mesmo não fugindo dos clichês, são bem divertidas de serem executadas.
Habilidades pouco convencionais
Dando continuidade aos nossos altos e baixos de Dying Light 2, chegamos ao ponto que atrapalha um pouco a vivência noturna no jogo: a árvore de habilidades. Como já dito, as habilidades de combate deixam bastante a desejar, seja pela animação pouco natural ou pela complexidade incômoda de serem executadas de forma prática.
Sendo assim, o melhor a fazer é usar e abusar do Parkour, certo? Bom, nem tanto assim. Isso porque os desenvolvedores limitaram consideravelmente as habilidades de Parkour do jogo, escolha que inclusive não condiz nem com o enredo da história. A árvore é bem completa, porém inclui elementos que, ao meu ver, são básicos demais para serem considerados “habilidades de uma árvore de skills”.
Quando eu digo básicos, quero dizer do nível de correr, deslizar por baixo de objetos, aguentar mais de três segundos segurando na beirada de um prédio, e coisas do tipo. Além do fato de que essas “habilidades” deveriam ser comandos básicos do jogo, elas ainda se encontram muitas vezes no meio da árvore de habilidades, ou seja, leva um certo tempo para alcançá-las — o que limita bastante a movimentação nas primeiras horas de jogo.
A sensação que dá é como se o comando de se esconder em moitas da franquia Assassin’s Creed fosse uma habilidade desbloqueável avançada. Isso é limitador demais, tornando as primeiras horas de jogo frustrantes e desanimadoras. Além disso, estas “travas” não condizem com o enredo, uma vez que Aiden é um peregrino com alguns anos de experiência no mundo fora das cidades — e já deveria ser capaz de fazer pelo menos “o básico” do Parkour, não concorda?
Uma paleta de cores diferenciada
Muito se comentou após o lançamento de Dying Light 2 sobre sua paleta de cores. Muitos jogadores elogiaram as cores mais vivas e impactantes do game, enquanto outros apontam que a paleta não combina com o tom decadente que o jogo se propõe a ter. A verdade, para variar, está no meio do caminho entre as duas afirmações.
Comparado ao primeiro jogo da franquia, a paleta de cores e efeitos de iluminação de Dying Light 2 são muito belas, principalmente durante o dia. De noite tudo se torna mais denso e sombrio, o que também condiz com a intenção da atmosfera noturna do game. Afinal, é possível transmitir decadência e terror sem ficar preso em tons pastéis e cinzentos o tempo todo.
Isso Dying Light 2 faz muito bem. O mundo é cheio de cores vívidas que enchem a tela, mas nem de longe isso afeta o tom lúgubre e o senso de urgência do jogo. Porém, existem inconstâncias aqui. Principalmente quando reparamos na iluminação do jogo. A iluminação afeta bastante as texturas, tornando o rosto de alguns NPCs um tanto estranho dependendo da iluminação que é colocada sobre eles.
Mesmo com esses deslizes, o game consegue ser bastante bonito, principalmente se considerarmos que ele deveria ter sido lançado bem antes da nova geração estar entre nós. Por isso, é compreensível que não tenha um visual tão de primeira assim, mesmo que não faça feio.
Diversão cheia de inconstância
Dying Light 2: Stay Human pode ser resumido como um conjunto de diversão e inconstâncias. Ele com certeza não é um desastre, pois consegue ser divertido, com personagens minimamente interessantes e um mundo pós-apocalíptico legal de ser explorado. Porém, ao mesmo tempo que acerta em determinadas mecânicas (como o Parkour para exploração da cidade), erra feio em outras (como os combates).
Em um momento você está deslumbrado com o que está vendo, para no momento seguinte se frustrar com alguma mecânica questionável — e logo depois vai se divertir durante uma fuga e se frustrar novamente com uma habilidade mal colocada. Em termos técnicos, o jogo supera seu antecessor em vários pontos, mas em termos de experiência como um todo, ele é inconstante, comprovando que nem mesmo um longo tempo de desenvolvimento resulta em um jogo impecável.
Assim, se você é um fã da franquia que não liga para algumas inconstâncias durante a gameplay, pode gostar bastante do que vai encontrar nas dezenas de horas de Parkour, combate e stealth de Dying Light 2 (a produtora prometeu 500 horas de conteúdo e um ciclo de vida de 5 anos para o jogo). Porém, se você espera uma experiência inovadora ou extremamente superior ao primeiro jogo, pode se frustrar um bocado.
Dying Light 2 – Stay Human foi lançado no dia 03 de fevereiro, para PC (via Steam e Epic Games), PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series S/X e futuramente chegará também ao Nintendo Switch. Para esta análise, rodamos o game em um notebook gamer com processador i5-9300, 24GB de memória, placa de vídeo GTX 1650 (4GB) e SSD de 450gb.