Análise Arkade – Predator: Hunting Grounds tem potencial, mas ainda esbarra em questões técnicas

8 de maio de 2020
Análise Arkade - Predator: Hunting Grounds tem potencial, mas ainda esbarra em questões técnicas

Símbolo máximo do cinema testosterônico de ação típico dos anos 1980 — com o qual crescemos na década seguinte com incontáveis reprises na TV aberta –, o Predador se tornou um dos ícones da cultura pop e do cinema de fantasia espacial, gerando incontáveis produções derivadas nas mais diversas mídias, incluindo os games, que se não tiveram o impacto e a relevância do primeiro (e mesmo do segundo) filme, mantém a marca presente no imaginário coletivo de forma bastante competente.

Predator: Hunting Grounds é a nova produção a se alimentar dessa fama, trazendo o caçador alienígena mais letal do universo para um jogo cooperativo e competitivo assimétrico, gênero que tem seus altos (como o divertido e subestimado Dead By Daylight e o ainda recente Resident Evil Resistance) e baixos (como o esquecível Evolve e o fraquíssimo Friday the 13th). Ainda que tenha seus deslizes, o jogo funciona bem, tem méritos inesperados, mas sofre em alguns aspectos que podem prejudicá-lo irremediavelmente.

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Era uma vez…

… um Predador e alguns militares se enfrentando em um ambiente tropical qualquer. E, bem, isso é tudo o que precisamos saber sobre o background do jogo. Como esperado, não há uma narrativa propriamente dita, uma história sendo contada. Na pele de um dos combatentes humanos, você tem algumas missões lineares a realizar em um dos três cenários iniciais (coletar certos itens, invadir alguns computadores, explodir alguns veículos, etc.) e sair dali antes de ser morto pelo próprio Predador ou pelos soldados inimigos controlados pelo computador.

O final da trajetória, aliás, remete diretamente à clássica frase “Get to the Chopper” de Arnold Schwarzenegger no primeiro longa, e é uma das melhores sacadas do game. Já do outro lado, na pele do Predador, a missão é ainda mais simples: eliminar o time adversário antes que ele conclua suas tarefas. Assim mesmo, sem meio termo, sem complicações, sem nuances ou qualquer profundidade nas motivações de estar lá, algo que não chega a ser um problema, mas está longe de acrescentar algo ao lore do personagem.

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Quem morrer primeiro, perde

Predator: Hunting Grounds é muito objetivo: há só um modo de jogo (público ou privado) e um tutorial que ensina o jogador, basicamente, a entender como funcionam as mecânicas específicas do Predador, considerando que todo mundo já tem noções de como lidar com o outro lado, que funciona como qualquer game de tiro em primeira pessoa.

No final das contas, o jogo é bastante simples e de fato, nem é necessário ter qualquer preparação para entrar em ação pelo lado dos humanos, a não ser que esse seja o primeiro FPS da vida do jogador. Senão, nada mais natural do que mirar, atirar, jogar granadas, usar itens de cura, etc. Mesmo sinais gráficos no mapa, direção dos inimigos e outras opções do HUD não trazem nenhuma novidade e são rapidamente reconhecíveis nos primeiros 5 segundos de partida.

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Há sim, algumas especificidades que bebem do que já conhecemos da franquia cinematográfica, como a possibilidade de, como humano, chegar em um riacho ou poça e se disfarçar com lama, dificultando os sensores do adversário, algo rápido e também descomplicado, que gera até pontos de experiência. alguns elementos das perks também oferecem atributos diferentes, mas nada que vá revolucionar o modo de se jogar.

Já o alienígena tem lá suas particularidades, e logo vamos compreender que as mais importantes são a visão térmica, que facilita muito localizar inimigos sobretudo em ambientes mais densos, e a camuflagem, que obviamente ajuda a se aproximar de forma mais sorrateira. Armas primárias e secundárias são bem fáceis de utilizar, sobretudo porque grande parte delas só será liberada depois de algumas boas horas de jogatina.

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Um dia da caça…

Há nuances interessantes nessa briga de gato-e-rato: ao sangrar, o Predador deixa rastros do seu sangue, que é bem fácil de enxergar. Mesmo andar pelas árvores descuidadamente pode derrubar folhas que denunciam a presença, principalmente em abordagens mais stealth. Utilizar a mira do canhão nos ombros também é uma ideia ruim se o jogador quiser manter o anonimato.

Mas o que se viu nesses primeiros dias é que quem está com o Predador dificilmente usa da sutileza, até porque ele é bastante resistente e poderoso em combates mano-a-mano. Com o tempo, e com jogadores aprendendo a lidar com as ferramentas dele, certamente esse cenário deve mudar, principalmente quando se atingir os níveis mais elevados.

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O mesmo vale para times formados pelos combatentes humanos. O jogo é bastante cruel com a falta de organização e de comunicação da equipe. Jogar com completos estranhos, às cegas, é meio caminho para a derrota, já que como dito, enfrentar o adversário sozinho é causa perdida. É fundamental que o time esteja sincronizado e, quando possível, saiba lidar com as diferentes classes (sendo que de início, só o padrão está liberada) para que todos, ou ao menos alguém, possa sair vivo dali.

Assim, como esperado, jogar com conhecidos é mais fácil e mais divertido. Principalmente porque com poucos mapas disponíveis, mesmo eles sendo relativamente amplos, as missões mudam pouco e bastam algumas partidas para saber onde estão os principais pontos de acesso, de onde vem as ondas de inimigos e qual a melhor estratégia a ser adotada. Predator é um game que irá precisar, de forma muito rápida e contínua, de atualizações com mapas, formatos e missões diferentes das que já tem. Caso perca esse timing, perderá também o interesse da comunidade muito rapidamente.

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Falando de mapas, o level design é um elemento um tanto quanto confuso, uma vez que mesmo com áreas amplas e, na maioria das vezes, densas, há claramente uma organização em bolsões de ação, e todo o resto acaba sendo somente um espaço virtualmente vazio para trânsito. Se o marcador indica para os humanos onde é o próximo ponto de interesse, o caçador não tem uma vida tão simples e precisa lidar bem com esses pontos para não ficar perdido do começo ao fim da missão.

Claro, você pode encontrar seus inimigos em qualquer espaço do mapa, mas é nos pontos de ação — dois ou três por cenário — onde 90% da ação realmente acontece. Se você pode caçar um porco-do-mato aqui e ali para se alimentar, não espere encontrar inimigos de verdade (os controlados pelo computador) a cada passo dado, algo que traria muito mais tensão.

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Falta de inteligência (artificial)

Outro elemento que deixa muito a desejar durante as partidas, que duram em torno dos 15 minutos cronometrados por padrão, são os inimigos controlados pela CPU, que basicamente são soldados genéricos e um ou outro diferenciado que ficam centralizados nas construções e bases (onde normalmente são as sub-missões) ou surgem em ondas em certos pontos de interesse. A IA é extremamente simplória, e a elaboração do mapa não ajuda.

É bastante comum, por exemplo, em um estado de perseguição, encontrar um ponto fechado — uma construção, por exemplo — e apontar para a porta esperando que os inimigos se enfileirem para ser massacrados, já que o modus operandi deles é basicamente se aproximar pelo acesso mais próximo, ficar de frente e atirar. Poucas vezes tomam cobertura e jamais assumem estratégias de abordagem mais sofisticadas. Até zumbis genéricos de outros jogos parecem pensar mais em como atacar e se defender.

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Por isso tudo, esses NPCs estão lá muito mais para dar movimento, oferecer ação, do que para serem, de fato, um obstáculo, seja para o Predador, seja para o time dos humanos. E, mesmo sendo fraquíssimos, cumprem bem esse papel. Se não oferecem um desafio elevado, podem ser uma boa distração para deixar tudo menos monótono, algo que poderia acontecer nos intervalos entre os encontros pontuais entre os dois lados do conflito.

Uma opção que infelizmente ainda não está presente no jogo é a possibilidade de completar a partida com bots. Sobretudo por ser um jogo que depende do equilíbrio de quatro contra um, seria muito bem-vindo que em momentos onde o matchmaking não encontra jogadores suficientes. Não são raros os momentos onde as partidas são fechadas com 2 ou 3 contra 1, algo que desbalanceia bastante o combate.

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O problema se agrava em partidas privadas. A não ser que você seja parte de um grupo de exatamente cinco pessoas, a coisa complica. E pior, o jogo deixa isso acontecer e começar sem um dos times existir. Sim, pois é: é possível começar como Predador sem time adversário (e o jogo se resume a ficar caçando os NPCs perdidos até acabar o tempo) ou sozinho, sem Predador ou colegas (e aí vira uma missão solta de cumprir os objetivos contra os NPCs sem a ameaça que dá nome ao jogo).

Se vale para treinar objetivos e comandos, é uma abominação em termos do jogo em si, pois quebra tudo o que se espera desse game. Se houvesse a opção de bots assumirem esses lugares vagos, o jogo ganharia muito, já que permitiria, desta forma, um modo single player improvisado, para se jogar com menos pessoas, sem prejudicar a essência do game, e oferecendo, de quebra, uma opção a mais para quem quiser curtir o game sem ter que enfrentar outras pessoas quaisquer ou não quiser ficar esperando o matchmaking.

O dilema do multiplayer

Predator: Hunting Grounds, como dito, é um jogo relativamente simples e direto: ao entrar na organização das partidas, você estará alocado dentre sobreviventes humanos ou será o vilão da história. Fora do modo, ou você repete o breve e tedioso tutorial do Predador, ou customiza seus personagens. Então, o coração da experiência é entrar e jogar, morrer e entrar em outra partida. O problema é que essa é, também, a principal fraqueza do game nesse momento.

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Nos primeiros dias, basicamente o final de semana todo de lançamento, era virtualmente impossível conseguir jogar uma partida pública completa. Em média, o tempo de espera entre uma partida e outra variava entre os 15 e os 30 minutos, e quando finalmente funcionava, geralmente eram partidas incompletas de dois contra um. Durante 4 horas na noite do lançamento, consegui jogar meia dúzia de partidas e, dependendo da competência de quem estava lá, era possível morrer em alguns segundos sem ninguém te resgatar. Frustrante.

Aí pensamos: ok, afinal, é lançamento e pouca gente tem o jogo ainda. E de fato, com algumas atualizações (que devem ter corrigido o sistema de matchmaking) e mais gente comprando o jogo, essa espera diminuiu e a coisa começou a ficar mais fluida. Mas ainda assim, em dias comuns, em horários diferentes, conseguir sair de uma partida e entrar em outra é um teste de resiliência. Sem o respawn automático, é possível entrar, morrer rapidamente e ficar dois terços do tempo assistindo seu time e esperando que eles acionem a opção de revivê-lo, algo que surge em certos momentos.

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Soma-se a isso o fato do preço do jogo ser bastante elevado (para a quantidade de conteúdo que entrega até agora), o que afugenta os entusiastas que, certamente, esperarão a queda natural do valor ao longo dos meses, bem como saber se o game terá mesmo vida longa ou se será abandonado. Entramos naquele ciclo do biscoito: não há novos jogadores porque o jogo ainda está vazio e o jogo está vazio porque não há novos jogadores. Esse é o fator que, se não for equalizado muito rapidamente (preço, conteúdo, pessoas jogando), poderá significar o fim precoce da proposta.

Audiovisual

Predator: Hunting Grounds consegue ser uma mistura surpreendente entre ótimas soluções e péssimas resultados no que tange a questão estética. Os ambientes são bem cuidados e há um esmero na elaboração da natureza dos ambientes. Árvores, folhagens, vegetação rasteira, tudo funciona muito bem, ainda que não coloquem o título na lista dos que extraem o máximo que a geração tem a oferecer. A escolha por um alcance na escala de cores bem ampla torna o jogo muito bonito, traz muita vida para os cenários.

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Os modelos do próprio Predador e dos soldados são muito bem resolvidos. Se não há uma variedade enorme na constituição das feições humanas (algo que realmente seria desnecessário aqui), a diversidade de cores, equipamentos, pinturas, e todos os elementos de customização (via loot boxes, mas sem microtransações) funcionam muito bem. As soluções visuais para rastrear inimigos, bem como a estética da câmera térmica também são bem competentes e muito coerentes com o que já conhecemos desse universo.

Contudo, um olhar mais atencioso começa a desvendar alguns problemas em muitas texturas, incluindo pedras e construções bastante repetitivas e genéricas. Os modelos são bastante simplificados, e a pouca variedade na composição de objetos fa o game parecer, por vezes, com jogos da geração anterior. Isso fica ainda mais explícito no rosto dos soldados genéricos controlados pela CPU ou em espaços um pouco mais diferenciados, como escritórios e salas especiais.

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Tudo isso, claro, é esperado para favorecer a dinâmica e o desempenho de um jogo que depende muito da precisão ao rodar liso em estado online contínuo. Aí entra o outro problema mais sério, que é o desempenho. O jogo parece ainda mal otimizado e apresenta quedas na taxa de quadros frequentemente, engasgos, coisas surgindo do nada, aliados flutuando, enfim, uma série de questões que quebram a imersão, mesmo quando se compreende que as limitações visuais são para favorecer o gameplay.

O mesmo vale para a construção sonora. A clássica trilha musical era uma necessidade quase indispensável para o jogo, mas sozinha ela pouco faz durante horas de jogatina (ou esperando uma partida surgir). A sonorização é muito fiel, sobretudo quanto ao alienígena, e jogar com bons fones de ouvido faz diferença para compreender o ambiente, detectar sutilezas, e valorizar o modo caçador presente no jogo. Mas há aspectos na dublagem, ou no som de disparos das armas comuns que cumprem seu papel de forma mais burocrática.

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Como conjunto da obra, Predator: Hunting Grounds se arrisca muito pouco e seu maior mérito é emular com precisão os elementos artísticos pré-existentes. Claro, há uma variante aqui e outra ali, a customização dá mais personalidade para cada set, a ambientação funciona, mas tudo o que de melhor encontramos é só uma transposição do que já tinha funcionado. Tudo o que é novo aqui parece pouco inspirado e genérico.

Conclusão

Predator: Hunting Grounds guarda em si uma essência muito genuína, trazendo, de uma forma que honra o primeiro filme, um personagem e toda a essência do que o tornou o ícone que é. Sem complicações, sem melindres, sem tentar ser mais do que nasceu pra ser. O game é fácil de aprender, com uma jogabilidade bem gostosa de se aproveitar e tão belo quanto o esperado de uma produção desse escopo e com esses objetivos.

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Deslizes técnicos, como desempenho e texturas, podem ser corrigidos com o tempo e não são um problema em si. Conteúdo pode (e precisa) ser incrementado com constância para manter o engajamento. A presença massiva (ou não) de jogadores nos servidores também não é especificamente culpa do jogo em si. O mesmo vale para o preço, uma escolha mercadológica e contextual que pouco tem a ver com o produto.

Mas, em uma experiência unicamente pautada pelo multiplayer competitivo e colaborativo, onde a única forma de se curtir ao máximo é poder entrar, jogar suas partidas, customizar seu personagem e se sentir satisfeito com o tempo e o dinheiro investido, tudo isso acaba fazendo parte de como percebemos o jogo. E nesse caso, Predator: Hunting Grounds deixa a desejar, e deixa claro que ainda há um caminho a ser percorrido para que ele seja realmente recomendável.

Predator: Hunting Grounds está disponível para Playstation 4 e PC, com áudio original em inglês e textos em português brasileiro.

Paulo Roberto Montanaro

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