Análise Arkade: A teia de mistérios de Spider: Rite of the Shrouded Moon

12 de novembro de 2016

Análise Arkade: A teia de mistérios de Spider: Rite of the Shrouded Moon

Ok, confesso: o título da análise é um tanto quanto clichê e parece até chamada de Sessão da Tarde para qualquer filme de aranhas gigantes. Mas, juro, não o é por acaso. Spider: Rite of the Shrouded Moon é um puzzle game bastante envolvente e com diferentes camadas de engajamento do jogador que vai do mais casual ao mais dedicado, premiando cada nível de envolvimento de modo único, tal como poucos jogos conseguem.

Seja uma aranha!

Com uma mecânica que remete a muitos jogos pautados na criação de quebra-cabeças, inclusive os disponíveis para mobile, tais como Cut The Rope, Spider… traz em sua essência um princípio que eu ainda não entendo o porquê de ainda não ter sido usado antes: uma aranha como protagonista, que usa suas habilidades naturais como nenhum Homem-Aranha fez antes, ou pelo menos não com tanta criatividade.

Análise Arkade: A teia de mistérios de Spider: Rite of the Shrouded Moon

Nada mais óbvio: no game, o jogador assume o papel de uma aranha e precisa descobrir como capturar insetos, procurar pistas e vencer os desafios colocados nos diferentes ambientes. É possível, portanto, em uma dinâmica que varia, dependendo da fase, entre perspectiva lateral e a visão superior, utilizar fios de teia para criar armadilhas ou plataformas, saltar, assustar insetos inimigos, capturá-los em pleno voo e, enfim, superar o ambiente e as demais criaturas.

Percorrendo os distintos cômodos da Mansão Blackbird, uma propriedade convencional (ou nem tanto assim) norte-americana, como sala, quartos, cozinha e até mesmo um celeiro, nossa pequena protagonista deverá conseguir alimento e, ao mesmo tempo, encontrar pistas escondidas que remetem a, acreditem, uma sociedade secreta do século XVIII que existiu de verdade, chamada de Knights of the Buried Chambers! Pois é… quando eu falei de camadas, não estava brincando.

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Conseguir capturar todos os diferentes insetos espalhados pelo ambiente, portanto, não chega nem perto de representar o maior desafio do jogo. Spider guarda uma série de inovações inesperadas, mas muito bem-vindas para uma criação indie, fruto do trabalho da Tiger Style, que é composta por desenvolvedores que já trabalharam em franquias AAA, como Thief, Deus EX e Splinter Cell e que vem se destacando no cenário.

O clima do jogo simula o clima da sua região

A primeira destas novidades já é revelada logo quando se abre o jogo pela primeira vez: utilizando um esperto sistema de geolocalização, o game “olha pela sua janela” e emulao clima do jogo ao ambiente real do jogador em quatro variações. Ou seja, se quando você jogar estiver um dia chuvoso lá fora, estará também no jogo. Está uma noite limpa? Idem no jogo.

E, o mais importante de tudo isso: além de mudar o visual dos espaços percorridos pelo aracnídeo, alguns elementos só aparecem em determinadas condições climáticas, como certos tipos de larvas que só aparecem em ambientes úmidos, moscas que adoram um tempo aberto ou mariposas que são seduzidas por lâmpadas e luminárias.

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Ou seja, ainda não que não seja exatamente longo, Spider é daqueles jogos que pede para ser apreciado em pequenas porções, em momentos diferentes para que, assim, seus 30 níveis se multipliquem, pois muita coisa pode mudar jogando de dia, de noite, com sol ou com chuva. Só dessa forma é que o jogador conseguirá extrair tudo o que é possível da experiência.

Quer mais? As fases da lua do mundo real também influenciam o jogo. Quando um certo mistério parece insolúvel (já falaremos mais sobre isso), estar na lua cheia ou na minguante por ser o fator fundamental para a resolução. Portanto, como dito, não adianta tentar pegar duas ou três madrugadas para tentar fazer um speed run e terminar o game logo. Ele não foi feito pra isso. Até pode acontecer depois de algumas pesquisas no Google, mas… aí qual é a graça?

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Claro que mesmo sendo uma novidade bem legal, pode ser que o jogador não tenha paciência para esperar uma tempestade noturna ou a mudança para a lua minguante, então há a possibilidade de usar um dispositivo do tempo para mudar o clima dentro do jogo e, assim, torná-lo diferente do que é visto pela nossa janela real. Mas aí, convenhamos… a novidade perde um pouco do sentido. Melhor esperar pelo momento certo para desvendar os segredos do jogo.

Audiovisual

Spider: Rite of the Shrouded Moon é um jogo bastante agradável para algo que tem insetos e outras criaturas invertebradas como protagonistas. Consegue transpor para a tela algumas das características que pouco notamos em formigas, moscas ou gafanhotos. São personagens muito bem criados e que facilitam o reconhecimento não só estético como também de comportamento.

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Não a toa, o seu painel de colecionador exibe todas as espécies de guloseimas que são descobertas durante as fases, e, como todos são baseados em insetos reais, traz até nome científico e tudo mais. Um quadro de fazer inveja a Timão e Pumba, com toda certeza. Além disso, há 5 espécies de aranhas a serem desbloqueadas durante a jornada, cada qual com suas particularidades. O jogo faz muito bem o papel de reverenciar cada uma delas com artes estilosas que as valorizam e que, para um inseto comum, seriam verdadeiras obras de terror.

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A mesma qualidade não se repete, contudo, no ambiente. Não que móveis, paredes e objetos de decoração sejam feios, longe disso. As escolhas artísticas feitas para o jogo são muito bem colocadas e cabem perfeitamente na proposta, mas certos espaços carecem de um pouco de detalhamento e até mesmo profundidade. Ainda que seja um jogo absolutamente em 2D tradicional, no geral tudo parece chapado demais, não há sensação de profundidade ou dimensão do espaço físico.

Afinal, Spider é daqueles jogos que tratam de um mundo que nos é invisível. Tal como em MilitAnt, o que nos é diminuto deve parecer monstruoso para uma formiga ou, nesse caso, para uma aranha de parede. Essa dimensão, ainda que esteja lá, não passa uma sensação de grandiosidade real. O espaço cênico é, portanto, prático e serve perfeitamente à ação que o game propõe, mas fica devendo um pouquinho em termos de visual e imersão.

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A trilha sonora como um todo mostra um saldo bastante positivo. Não há exageros e tudo é muito comedido. Nada mais justo, já que a ação dentro desse universo é, sobretudo, algo que está longe de ser barulhenta ou agitada. Aqui sim sentimos o ritmo mais cadenciado e que cabe perfeitamente em um puzzle com essa temática. A representação do ambiente, até para potencializar seus recursos mais avançados, se destaca mais uma vez e sempre se mostra ao jogador.

Uma experiência instigante

Ainda que se pareça bastante, como dito, com outros puzzle conhecidos, é importante destacar que Spider se diferencia da maioria deles principalmente em termos de liberdade. Claro que há caminhos bem definidos e o ambiente não é tão extenso ou variado assim, mas o jogo permite que se construa uma rota de ação da forma como o jogador achar melhor, principalmente aquele que adora buscar o 100% de cada fase, de cada área.

Evidentemente, a criação de teias é o elemento mais divertido aqui. Basicamente, a proposta é estabelecer figuras geométricas fechadas usando um número limitado de fios de teia disponíveis que variam de acordo como a quantidade de insetos comidos. E, de fato, falo de simples triângulos até eneágonos (e outras figuras que só mesmo consultando o Google ou aquele caderninho velho da escola para saber o nome pelo número de lados).

Confira um pouco de gameplay abaixo, capturado da versão PS4 do game:

Nem sempre é possível ser tão criativo assim, já que há superfícies onde a teia não adere, ou ainda que se movimentam de tempos em tempos, mas é exatamente nesse modelo onde se ganha em termos de criatividade. Ao mostrar como um ambiente finalizado ficou, o jogo escancara que, certamente, nenhum jogador vai resolver seus caminhos da mesma forma que outro. É nessa percepção de que fez as decisões por conta própria que o jogo encanta o jogador.

Tudo isso imerso em um ambiente mutante e uma narrativa que, mesmo não sendo contada como visto tradicionalmente, com cenas, narrações, ou outros recursos, pode se tornar algo muito imersivo e profundo. Afinal, a mansão não é um lugar qualquer e guarda muitos segredos, dentre eles, onde estão, as pessoas que deveriam star vivendo ali? E os tais Knights of the Buried Chambers? Qual a relevância deles?

Análise Arkade: A teia de mistérios de Spider: Rite of the Shrouded Moon

Bom, ainda que o jogo não tenha uma história propriamente dita, ele esconde muitos mistérios que irão fundir a sua cuca. Os produtores pesquisaram símbolos e códigos desta sociedade secreta para criar alguns puzzles realmente complexos, e conforme você consegue decifrá-los, entende um pouco mais do mistério da mansão Blackbird.

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Em muitos casos não há exatamente uma lógica, e você vai precisar realmente pesquisar na internet sobre o significado dos símbolos para tentar resolver um puzzle, que provavelmente vai te dar acesso a alguma passagem secreta. É muito mais complexidade — atrelada à realidade de uma sociedade secreta que realmente existiu — do que vemos em Uncharteds e Tomb Raiders da vida.

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Curiosamente, estes puzzles meio que podem ser levianamente ignorados pelo jogador que se atém mais à jogabilidade em si. Mas, considerando que a jogabilidade aqui se resume a criar teias e comer insetos, é louvável o esforço dos produtores de colocar em Spider algo muito mais complexo do que a proposta do game sugere.

Conclusão

Spider: Rite of the Shrouded Moon é uma daquelas ideias do tipo Ovo de Colombo. Depois que você experimenta, fica se perguntando porque alguém não teve essa sacada antes. De forma simples e, ao mesmo tempo, sofisticada, o jogo consegue se adaptar ao tipo de jogador sem sequer oferecer níveis de dificuldade diferentes.

Quem bater o olho nele pode achar que é apenas um jogo onde uma aranha deve criar teias e comer insetos, mas quem realmente se deixar levar pelos mistérios do game encontrará uma experiência extremamente intrincada e desafiadora. Spider é aquele tipo de jogo que oferece diferentes camadas de experiência e profundidade para cada jogador, valorizando a criatividade e premiando a dedicação.

Disponível para PCs (via Steam), Playstation 4, Playstation Vita e dispositivos móveis Android e iOS, o jogo conta com uma muito bem-vinda localização para o português do Brasil e se mostra uma agradável surpresa, seja para quem tem arrepios cada vez que  assiste Aracnofobia ou para quem, como eu, que sou pai, não consegue evitar a musiquinha da dona aranha que subiu pela parede…

Paulo Roberto Montanaro

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