Análise Arkade: Super Mario Party Jamboree é a festa em sua plenitude
Não sou a primeira pessoa a dizer que a Nintendo tem andado na contramão das grandes tendências desta indústria vital. Se o noticiário do mundo dos games não tem sido dos mais animadores, com promessas vazias, mercado de trabalho catastrófico, ciclos cada vez mais longos de desenvolvimento e mais conversa do que ação, eis que a gigante japonesa surge com o terceiro jogo de uma franquia nesta geração vitoriosa do Switch.
Super Mario Party é uma das marcas derivadas mais importantes do ecossistema da empresa e, em essência, consegue contemplar todo o conceito de diversão e amplitude de público que se tornou o diferencial da Big N diante suas contrapartes no mercado, que sequer podem ser considerados rivais ou concorrentes porque andam seguindo por outros caminhos. E esta nova entrada, não satisfeita em ser só mais um, busca ser a melhor de todas. E, sem rodeios, posso dizer que sim, ela é.
Uma festa na sala de casa
Por mais que seja óbvio afirmar que a ideia de celebração é o princípio norteador de Super Mario Party Jamboree, esta constatação não deixa de ser a mais absoluta definição de um produto que sabe o que quer ser e que trabalha, em todos os seus meandros, para atingir esta meta. Seja em seu modo mais convencional, seja nos demais, que deveriam ser complementares em tese, mas que ganham destaque pela excelência, tudo se direciona para o contínuo engajamento.
Para os desavisados que moram em outra dimensão bem mais chata, o jogo é a nova iteração da maior referência em experiências que são compostas por pequenos games casuais, ou um metajogo, para ser mais acadêmico. Em uma jornada emulando tabuleiros, os jogadores precisam contar com um pouco de sorte na rolagem de dados e bastante estratégia no uso de suplementos e nos pontos de minigames para, ao final, se sagrar campeão.
Em disputas com quatro participantes (sejam eles humanos, sejam controlados pela CPU em diferentes níveis de dificuldade), vence não quem chega ao final do percurso primeiro, mas sim quem acumulou mais estrelas. Estas, por sua vez, podem ser adquiridas de formas diversas, mas principalmente na troca por moedas quando as encontramos ao longo do caminho. No caso de empate final, as moedas restantes desequilibram a balança.
Estas moedas são conquistadas vencendo minigames; surrupiando de adversários com ou sem ajuda; habitando casas positivas do tabuleiro; ganhando em disputas diretas com os adversários ou casas especiais; e de outros modos bem distintos. Basicamente, tudo o que se faz no jogo pode render (ou nos tomar) esse importante ativo. Chegar em uma estrela e não ter o suficiente para comprá-la é sinônimo do sentimento de fracasso. É necessário estar sempre buscando formas de se manter rico o suficiente.
São vários os cenários disponíveis onde estes percursos estão disponibilizados, cada qual com suas armadilhas, seus atalhos e suas manhas. Atuar para modificar o mundo para nos favorecer – ou ao menos prejudicar os outros jogadores – é uma necessidade, aquela que pode nos colocar em grandes confusões com aquele familiar mais competitivo. Se você arruma encrenca em jogos como Overcooked, cuidado com as inimizades formadas só por mudar um Mega Wiggler de posição sem querer querendo.
Para quem prefere ter mais controle da situação e não quer ficar refém de uma estrela surgir “acidentalmente” a duas casas de seu adversário mais ferrenho, ou que a eventualidade de alguém cair na casa comandada por Bowser inverta as probabilidades, há uma opção Pro que oferece mais poder de decisão direta para jogadores, como a possibilidade se se votar pelo próximo minigame ou de ter a distribuição de itens de forma mais previsível.
Mas cá entre nós… quem quer precisão, que busque um soul-like, ou um jogo de luta competitivo para ficar contando frames ou para se preparar bem no timing perfeito. Super Mario Party Jamboree até dá essa colher de chá, mas nada melhor para uma festa que o imponderável.
110 motivos para não parar de jogar
Ainda que a ambientação seja importante, o sucesso de um Mario Party está diretamente associado à qualidade (e até quantidade) de seus minigames. A melhor notícia sobre Jamboree é que podemos encontrar aqui algumas das melhores propostas de toda a franquia, muitos que sabem utilizar bem as características dos joycons, mas a maioria muito bem pensada para qualquer tipo de controle.
Uma rápida viagem de balão por este verdadeiro resort de luxo confortavelmente instalado em um belíssimo arquipélago, partindo do ponto central conhecido como Party Plaza, vai nos conduzir até os diferentes pontos de interesse possíveis, incluindo os modos que nos levam diretamente para estas competições. Sem qualquer vergonha em abusar das cores e formas tão consagradas em jogos do gênero, nota-se que os desenvolvedores tiveram toda a liberdade para inventar.
O resultado são disputas que, seja colocando cada jogador por si ou em colaborações simétricas e assimétricas, se aproveitam com muita criatividade de comandos simples, normalmente aqueles que já esperamos de um produto de Super Mario, mas em situações imaginativas e que flertam, em muitos casos, com proposições non sense, que não chegam aos absurdos muito mcomuns no ótimo WarioWare: Get It Together!, mas que se arriscam mais do que eu esperava.
A pluralidade de possibilidades equilibra bem os aspectos da sorte e da aleatoriedade, parte do que se espera de um jogo como esse; e das habilidades específicas, como pontaria, memória, velocidade e precisão, que valorizam a competência. Isso significa que não há uma exacerbação de uma coisa em relação a outra, e tanto jogadores inexperientes quanto veteranos vão se sentir contemplados com esse meio termo.
Para quem, aliás, não tem a paciência para as partidas relativamente alongadas do modo convencional, é possível partir diretamente para o painel dos minigames e jogá-los com mais poder de escolha, seja do que experimentar, seja de como isso vai funcionar. Aqui, é possível decidir pela dificuldade da CPU em cada reiteração, ajustar regras, rearranjar times e coisas do tipo. É um ótimo lugar para praticar, conhecer coisas que ainda não foram vistas ou só passar aqueles cinco minutos de bobeira.
Elenco de peso e modos surpreendentes
Para quem já acompanha os jogos de festa estrelados pelo encanador bigodudo e sua turma, algumas presenças são mais do que esperadas, como a do próprio Mario, Luigi, Peach e Donkey Kong. Outras são bem comuns, como a de Toad, Yoshi, Bowser, Rosalina, Daisy, Wario e Waluigi, enquanto alguns coadjuvantes também preenchem a diversidade de escolha, e desta vez temos nesta posição Goomba, Koopa Troopa, Shy Guy, Toadette, Birdo, Boo, Monty Mole, Spike e, pela primeira vez, Ninji e Pauline. No total, 22 personagens.
São avatares muito bem modelados, que seguem todos os padrões estabelecidos anteriormente, cada qual com animações próprias de comemoração, decepção e assim por diante. Visualmente, há muito pouco o que se destacar de original, e estes personagens se parecem muito com outras participações em jogos recentes deste universo. Adota-se aqui um princípio que não é necessário mexer naquilo que funciona.
Por outro lado, além da lojinha de conteúdos colecionáveis, (muitas) figurinhas de reações, músicas e outros desbloqueáveis para fãs, há uma gama de modos periféricos de jogo que se mostraram surpreendentes e mais parecem com versões tunadas de ideias para minigames que acabaram crescendo demais, a ponto de se tornarem independentes.
O primeiro deles, provavelmente o mais viciante, é um jogo de ritmo culinário que se aproveita ao máximo dos controles de movimento do Switch para nos fazer dançar e agir no ritmo envolvente enquanto tentamos compor o cardápio ideal para os jurados Yoshis. São movimentos coreografados para cortar, virar, espetar, fatiar, montar ou passar manteiga que são simplesmente cativantes. Infelizmente, porém, este exige que se use uma das metades do joycon, porque é baseado só em movimento.
Com cada partida, sempre cooperativa entre todos os quatro componentes, prevendo alguns pratos diferentes entre entradas, principais e sobremesas (incorporando um MasterChef digital), há uma boa variedade de ações aqui também, fazendo com que cada run em busca da perfeição da nota máxima seja bem distinta da anterior. Simplesmente viciante.
Outra ótima opção é mais exigente ao nos fazer voar usando os dois lados do joycon, o que significa que para se aproveitar ao lado de outras pessoas é necessário ter necessariamente mais conjuntos. Neste caso, consegui experimentá-lo sozinho e é, de todos, um dos mais complexos em termos de precisão, e claramente o mais cansativo fisicamente.
Para os adeptos do jogo on-line, muito provavelmente o ponto de retorno ao longo da vida útil do jogo será o Koopathlon, com a possibilidade de até 20 pessoas compartilhando a aventura virtualmente em rodadas bastante dinâmicas, que invertem a lógica do tabuleiro para dar mais foco às competições em blocos de três minigames e armadilhas pouco amistosas promovidas pelo grande vilão. Ele, aliás, também é a estrela de Bowser Kaboom Squad, uma raide de até oito pessoas que precisam carregar um canhão para derrotar o maldito em sua forma gigante.
Estes modos inéditos são alguns os maiores acertos de Jamboree ao preencher uma das poucas fraquezas tradicionais da série com algo dedicado e pensado para este multiplayer mais amplo e focado em múltiplas pessoas competindo ou colaborando. Considerando um jogo onde o estar junto é seu motivo de existir, amplia-se a ideia de que pode-se juntar pessoas de lugares diferentes, explorando esta característica de modos distintos e apropriados para o on-line, não só tentando emular a presencialidade convencional.
Conclusão
Super Mario Party Jamboree é um caso que merece destaque. Como a décima terceira edição da sub-franquia, consegue alcançar aqui o ápice, até agora, de suas potencialidades. Se os dois últimos jogos foram bastante sólidos em reafirmar suas melhores qualidades e reavivar o que de melhor já tinha sido feito, este se apoia em tudo isso para trazer frescor, com novas ideias incorporando densidade ao que já funcionava muito bem.
Mesmo que se aproprie de coisas que são características de jogos baseados em aleatoriedade – no final, você ainda depende de alguma sorte em vários aspectos para além da rolagem de dados – há uma sensação de recompensa satisfatória no final de cada partida, das mais diretas às mais longas composições. Tudo porque suas pequenas partes, incluindo o amigo Jamboree que muda a dinâmica de uma partida muito rapidamente, são divertidas em si, não só um meio para algo maior.
A retroalimentação orgânica do game em nos recompensar o tempo todo por diferentes ações é inerente ao princípio de renovação e replay, mas aqui ela entra muito mais como consequência do que objetivo. Você não joga mais uma partida de 10 ou 20 rodadas para liberar um tabuleiro novo, mas o contrário. Você joga porque gosta e, por um acaso, aparece lá um cenário novo para explorar.
Não é difícil compreender que este jogo, porém, não é uma unanimidade, porque só vai funcionar mesmo para quem tem com quem compartilhar a experiência em casa, ou tiver a assinatura on-line e disposição para lidar com uma galera pela internet. Jogar sozinho pode funcionar melhor em um ou outro modo, em momentos pontuais, mas cansa muito rapidamente.
Por isso, os minigames cujo proveito pode se dar só com uma banda do joycon, ou dois juntos, em estado dock ou portátil, ou com controles convencionais, são os que mais me instigaram. Ter possibilidade de se juntar a uma galera on-line agrega muito valor também. Nada melhor do que colocar todo mundo para dentro da bagunça porque, afinal, o jogo é feito para ser uma festa, certo?
Super Mario Party Jamboree está disponível exclusivamente para Nintendo Switch desde 17 de outubro de 2024, com localização em textos e, em partes, por voz, para o nosso português brasileiro.