Análise Arkade: The Medium é um bom thriller de suspense sobrenatural

27 de janeiro de 2021
Análise Arkade: The Medium é um bom thriller de suspense sobrenatural

The Medium é o jogo mais ambicioso do estúdio polonês Bloober Team, que já desenvolveu títulos como Layers Of Fear 1 e 2, Observer e mais recentemente Blair Witch, todos com foco no terror psicológico.

Akira Yamaoka, compositor clássico de Silent Hill, assina a trilha sonora de The Medium e isso inevitavelmente traz o questionamento: será que é o nascimento de um novo título importante para o terror? Além da presença emblemática de Yamaoka, o novo jogo dos poloneses também tem uma espécie de “transição” entre o mundo real e um “mundo demoníaco”, outra característica muito marcante da clássica franquia da Konami.

Mas e aí, The Medium é bom? Consegue “tapar o buraco” de uma franquia tão grande e tão querida quanto Silent Hill? Confira nossa análise e descubra!

Investigação Mediúnica

O jogo introduz de forma muito eficiente nossa protagonista, Marianne, garota que, como o título sugere, tem poderes mediúnicos. O prólogo nos coloca no período em que ela perde seu pai adotivo, Jack, e devemos explorar sua casa para compreender qual era o tom dessa relação.

Por meio de uma narração em off, que perdura por todo o jogo, Marianne comenta como passou por vários lares adotivos antes de Jack, mas sempre teve problemas devido ao desconforto que seus poderes causavam às família que lhe abrigavam.

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Jack, seu pai adotivo, era dono de uma funerária. De uma forma ou de outra, ela tinha contato com os mortos.

As pessoas não enxergavam (literalmente), nada anormal, mas a garota sempre falava sozinha ou citava suas conversas com espíritos, por exemplo. Foi apenas quando Jack a encontrou que ela foi acolhida e aceita independentemente dessa condição. Esse pequeno recorte permite entender muito bem a personagem, o mundo que a cerca, suas dificuldades, etc.

Ao receber um telefonema misterioso, Marianne decide investigar, e é aí que a trama realmente começa, e somos lançados em um thriller de mistério que vai sendo revelado gradativamente até o fim da campanha.

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Os cenários soturnos ajudam na criação da tensão

Cada jogador tem uma tolerância própria no que diz respeito a sentir medo e tensão, mas minha jornada por The Medium nunca me deu medo. Se tivesse que classificar a obra dentro de um gênero, diria que é mais um suspense ambientado em um cenário soturno, mas jamais o classificaria como um “game de terror” porque, afinal, não senti medo e nem levei sustos. E, não é a primeira vez que o pessoal da Bloober Team opta por contar uma história “de terror” que não dá medo.

Apesar de não proporcionar medo, a história é bem pesada, pois trata de questões que acontecem em nosso mundo e geram muita revolta. Não vou dar spoilers nem estragar sua experiência com o enredo do jogo, mas fique avisado: The Medium aborda temas pesados e desconfortáveis. 

 Como é jogar The Medium?

Como citei Silent Hill na abertura do texto, por ser um expoente do gênero terror, vou continuar a usá-lo como ponto de comparação. The Medium não tem nada a ver com Silent Hill (além da câmera posicionada em terceira pessoa), diria mais que ele é uma amalgama de:

  • O estilo de exploração de um walking simulator
  • A leitura incessante de textos de Control ou Quantum Break, da Remedy
  • Quebra-cabeças bem simples para o jogo não ser totalmente linear

Não há armas ou sequências de combate; o que existe são algumas interações que se limitam a apertar um botão em determinado momento. Essa “ação” se dá por meio dos poderes mediúnicos de Marianne e, sendo honesto, tenho a impressão que só existem para que haja algum elemento mecânico além de andar/correr.

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Na direita, no mundo espiritual, reconstituímos cenas para entender melhor o que aconteceu no local onde estamos.

Não há como se perder porque o jogo é linear e, pela ausência de combate, dá-se a comparação com o walking simulator, mas isso não é um demérito. Apesar da linearidade, o jogo tem uma duração mediana (demorei algo em torno de 8-10 horas para terminá-lo) e ainda assim todos os cenários são únicos e variados, mostrando assim a ambição dos desenvolvedores.

Os arquivos de texto que encontramos dispostos nos cenários dão contexto sobre personagens e situações da história que está sendo contada. São leituras curtas e nada cansativas.

Além dos textos, há também objetos com os quais podemos interagir, e dos quais podemos extrair informações, ou como o jogo chama “sentimentos dos objetos”.

Os dois mundos

A feature mais destacada em trailers e materiais promocionais foi a divisão da tela ao meio, feita para mostrar o “mundo real” e o “mundo demoníaco”, ambos podendo ser explorados, de certa forma, ao mesmo tempo.

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A jogabilidade baseada em realidades simultâneas.

Essa curiosa mecânica tem relação com os conceitos do jogo porque é dito que Marianne pode existir em ambos os lugares, que sua mente pode habitar dois corpos em realidades distintas ao mesmo.

Achei essa mecânica interessante em conceito (apesar de não ser realmente inovadora), mas desnecessária em execução. Existiria um backtracking bem mais legal se os cenários mudassem em tempo real ao pressionar de um botão ao invés da divisão de tela — para que pudéssemos “viajar” entre os dois mundos, e não vê-los simultaneamente na tela. Talvez a decisão tenha sido mais de produção do que de design: uma mudança em tempo real talvez acarretasse em um desenvolvimento mais difícil para um estúdio independente.

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Outro exemplo das realidades simultâneas

Alguns quebra-cabeças utilizam o dinamismo dessa mecânica: temos que pegar um item em uma sala que só está acessível no mundo demoníaco, pois, no mundo real há um beco sem saída, e o caminho dá em uma escada quebrada, por exemplo.

Na tela em que há a barreira tudo fica meio estático, enquanto avançamos com o puzzle no mundo correto. Não é “mal feito” ou chato, mas me parece mais uma barreira para realizar a ação do que uma feature realmente interessante que enriqueça a experiência de jogo. Enquanto Marianne interage com um espírito na tela inferior, vemos ela gesticulando sozinha na parte superior, algo que simplesmente não acrescenta ao jogo.

Na prática, o tão alardeado recurso da tela dividida parece servir mais para mostrar o poder de processamento dos novos consoles da Microsoft — que está “renderizando 2 versões do mundo do jogo ao mesmo tempo” — do que para fins de gameplay, ou para enriquecer criativamente/mecanicamente o jogo.

Inconstâncias

Apesar da boa introdução já citada, demorou umas boas horas para a história se tornar instigante ao ponto de me deixar curioso e empolgado com as possíveis resoluções. Se tivesse que dividir o jogo em três partes, diria que a primeira foi chata e as duas últimas muito boas.

Em muitos momentos surge um inimigo e como não podemos enfrentá-lo temos que fugir e essa é, de longe, a pior parte do jogo. A mecânica de fuga é cansativa e, diante de cenários propositalmente caóticos nos quais não entendemos qual o caminho correto, é fácil morrer e repetir a esmo essas sequências até acertar.

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Existem outras mecânicas, como uma espécie de modo detetive e outra que remonta acontecimentos e expõe memórias, mas não há muito a destacar sobre elas: tudo faz parte do tipo de narrativa textual que The Medium constrói, e essas utras mecânicas simplesmente cumprem seu papel para que o jogo conte sua história.

Outra coisa legal é o posicionamento da câmera, que lembra um pouco a trilogia clássica de Residente Evil, mas com um toque mais dinâmico, afinal, ela não é fixa, também acompanha o personagem, mas os ângulos escolhidos trazem à memória o que a Capcom fazia no início dos anos 2000.

E a trilha sonora?

Tá, mas e a tal trilha sonora do compositor de Silent Hill? Bom, vou deixar aqui embaixo uma das faixas compostas por Akira Yamaoka para você tirar suas conclusões, mas não acho que a música brilhe muito no jogo, apesar de ter rolado um cuidado em trazer dois compositores: um para compor os temas do mundo real (Arkadiusz Reikowski), outro para o mundo demoníaco (Akira Yamaoka):

Na maior parte da campanha as melodias são bem sutis e, tirando a composição dos créditos que é bem mais catártica, não tive momentos em que parei de andar simplesmente para apreciar a música — algo que todo mundo já fez quando estava realmente envolvido por uma faixa.

Em muitos momentos parece que nem existe música rodando no background. É claro que essa é a experiência que tive sendo um leigo, talvez quem entenda de teoria musical e afins encontre mais maestria no trabalho — que considero minimalista — de Yamaoka.

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Ah, e para os caçadores de conquistas/achievements, fica a dica: em apenas uma run consegui 37 das 39 conquistas possíveis, então esse é um jogo que dá para fazer 100% sem muito esforço. 😉

Conclusão

No geral, eu gostei de The Medium, especialmente por ele não tentar imitar nenhuma franquia já consolidada e ter a coragem de assumir que tem seu próprio ritmo. Se esse ritmo é bom, ou não, aí vai muito da expectativa do jogador.

Apesar das primeiras horas meio morosas, da metade em diante o jogo engrena, e me deixou animado e até mesmo empolgado com os mistérios que apareciam… Mistérios esses que fazem referências a outras obras, talvez? Fica aí o mistério 😉

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Vale mencionar que Troy Baker dubla um personagem em The Medium, mas há tanta distorção em sua voz que nem dá para saber que é ele. ¯\_(ツ)_/¯

Então, fica a dica: não venha esperando algo parecido com Resident Evil ou Silent Hill, e tenha em mente que o jogo é muito mais focado em “andar e investigar” do que em “enfrentar monstros e sentir medo”. O que temos aqui é mais um thriller sobrenatural do que um jogo de terror, e o jogo tem seus méritos, ainda que dê suas escorregadas.

The Medium será lançado amanhã, 28 de janeiro, com versões para PC e Xbox Series S/X — e estará disponível no Game Pass para todas as plataformas. Este review foi feito com base na versão Xbox Series X do game, que recebemos antecipadamente da Microsoft para fins de análise. O game possui dublagens em inglês, com menus e legendas em português brasileiro.

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