Análise Arkade: caçando deuses ancestrais em Gods Will Fall

28 de janeiro de 2021
Análise Arkade: caçando deuses ancestrais em Gods Will Fall

Não é de hoje que os videogames nos dão a chance de nos rebelarmos contra os deuses. A série God of War fez fama em cima deste conceito, e antes disso, RPGs como Xenogears nos permitiram sair no braço contra deuses e entidades cósmicas.

A ilha dos deuses

Gods Will Fall traz este conflito entre homens e deuses para um patamar um pouco mais terreno, mas ainda brutal. Depois de milênios de subserviência e veneração aos deuses, um grupo de guerreiros que não quer mais obedecer aos caprichos divinos decide que é hora de acabar com os deuses.

Eles partem rumo à ilha em que os deuses deste mundo habitam, com a missão de derrubá-los, um a um, na base da porrada. Oito guerreiros desembarcam na ilha, e há 10 deuses vivendo lá, cada um deles entocado em sua própria dungeon. Nossa missão é desbravar essas dungeons, eliminando os monstros e lacaios dos deuses até que possamos encará-los frente a frente. O legal é que cada dungeon tem seu próprio clima, com ambientes e inimigos únicos.

Análise Arkade: caçando deuses ancestrais em Gods Will Fall
Dentro dessa dungeon, há um deus esperando para ser aniquilado

Como deuses que são, os chefes têm seus adoradores, bem como altares construídos em sua homenagem. A boa notícia é que destruir inimigos comuns e altares faz com que o chefe daquela área perca um pouco de vida, como se a falta da fé de seus seguidores afetasse seu poder. Salvo raras exceções, a barra de vida do chefe fica na tela por toda a dungeon, e podemos ver ela diminuindo conforme eliminamos seus capangas. É um jeito interessante de estimular o jogador a explorar bem cada dungeon, e tentar não deixar nenhum inimigo para trás.

Tretando com os desues

Gods Will Fall aborda este conflito de um jeito bem interessante, que bebe um pouquinho na fonte dos Roguelikes. Ter oito guerreiros significa que você vai ter oito “vidas”, oito tentativas de derrubar os deuses, cada um na sua dungeon. O layout das dungeons nunca muda, mas ela sempre é “resetada”: caso um de seus heróis caia, o próximo que entrar vai encontrar todos os inimigos de pé novamente.

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Dica: esse javali gigante (Carnoccus) é um dos melhores fotos para começar a jornada

Se um de seus personagens cair em combate, ele não necessariamente vai morrer, podendo ser resgatado por um próximo guerreiro, desde que o novo aventureiro consiga ir até o fim da dungeon — mas morrer para valer também acontece. Cada herói tem uma barra de vigor/vida (alguns tem mais, outros menos), e alguns podem tanto ganhar um pequeno boost de força e vigor — por estarem motivados para o combate — quanto perderem um pouco destes atributos — por medo/covardia. Se perder todos os seus guerreiros, é Game Over, e só lhe resta começar de novo — com um grupo aleatório de guerreiros.

O gameplay é relativamente simples: enquanto estamos na ilha, controlamos todo o grupo, e devemos guiá-los até os portais que levam para as dungeons. Vemos a ação por uma perspectiva isométrica, e embora a câmera trema um pouco mais do que deveria, geralmente ela dá uma boa visão da ação. Ao alcançarmos um portal, devemos selecionar qual o guerreiro que irá adentrar aquela dungeon para derrubar o deus que vive lá.

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A câmera treme um pouco, mas no geral dá boa visibilidade

Na hora da porrada, os botões mais importantes são os dois de ataque e o de esquiva. Os inimigos batem forte, então os combates têm uma cadência meio Souls: espere o ataque e arrume uma brecha para atacar. Há um sistema de parry, mas ele é horrível: você precisa, literalmente, se esquivar NA DIREÇÃO do inimigo quando ele te atacar. É uma relação de risco x recompensa muito impreciso, então eu preferia manter distância e evitar ataques me esquivando PARA LONGE dos inimIgos.

Se perder vigor, calma que não é o fim do mundo: atacar os inimigos e não tomar dano te concede bloodlust, o que te permite soltar uma espécie de “grito de guerra” que pode recuperar valiosos quadrantes da sua barra de vida. É mais ou menos como a determinação de Ghost of Tsushima, saca? Além de acumular bloodlust, você também pode coletar cogumelos que recuperam sua vida, ou melhoram seus atributos, bem como armadilhas e bombas (os itens são bem escassos, então use com moderação).

Confira abaixo um vídeo que mostra um pouco de gameplay de exploração + combate na dungeon, com direito a um deus derrotado ao final:

Uma dica de ouro que eu te dou para você sofrer menos: quase todo inimigo comum derrubado dropa uma arma. Essas armas são descartáveis, duram bem pouco. Então, arremesse-as de longe nos inimigos: assim você quebra a postura deles sem arriscar seu pescoço, e pode “chegar com os dois pés no peito” antes que eles se recuperem. Sério, arremessar as armas vai facilitar muito a sua vida!

Não canse seus guerreiros

Quando um personagem sai vitorioso de uma dungeon, todo o time pode ganhar pontos extras de vigor e força, motivados pela vitória… porém, o guerreiro que acabou de sair, fica cansado, perdendo um pouco de seus próprios atributos. É um jeito inteligente de “obrigar” o jogador a não escolher um favorito: se quiser ter sucesso, você vai ter que alternar entre os personagens, pois encarar mais de uma dungeon seguida com o mesmo herói é suicídio.

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Repare nos atributos negativos da guerreira Erin: não é uma boa ideia usá-la nesta dungeon

Seus guerreiros portam diferentes armas (espadas, maças, machados, lanças), e isso influencia na força e na velocidade de cada um. Podemos liberar armas melhores, mas cada guerreiro tem suas preferências (você não pode dar uma espada para um guerreiro que usa machados, o upgrade deve respeitar a classe da arma). Pessoalmente, eu gostei dos guerreiros que usavam espadas ou lanças, mas invariavelmente tive que utilizar os grandalhões que usam maças e machados, pois não podia me dar ao luxo de ficar usando apenas os que mais gostava.

Isso traz um pouco daquele feeling dos esquadrões de XCOM, sabe? Conhecemos (bem) pouco desses personagens, mas eles são muito unidos. Quando um deles cai, abala o restante do grupo e o jogador — que fica com “uma vida” a menos para prosseguir. Perder muitos guerreiros é péssimo, e se você acabar ficando com quatro ou menos, talvez seja melhor abortar a missão e iniciar um novo save — com um novo grupo aleatório de guerreiros.

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Explorando a ilha dos deuses

Esse peso de perder guerreiros é evidenciado por outra característica peculiar do jogo: Gods Will Fall te deixa livre desde o início. Isso significa que você visita as dungeons na ordem que quiser… mas só fica sabendo qual o tamanho da vida do chefe depois que já está la dentro. Não há checkpoints dentro das dungeons, então, é sempre um um exercício de tentativa e erro: escolher a ordem “menos difícil” das dungeons para eliminar os deuses menos poderosos primeiro faz toda a diferença… mas você só aprende a melhor ordem tentando (e falhando).

Você vai ter guias e walkthroughs disponíveis para te ajudar, depois que o jogo sair, mas como eu joguei antes do lançamento, penei um bocado, e só consegui realmente avançar no jogo ali pelo 4º save, quando consegui matar 7 deuses dos 10 deuses perdendo apenas um guerreiro!

Análise Arkade: caçando deuses ancestrais em Gods Will Fall

O fato é: mesmo sendo um jogo mecanicamente simples, Gods Will Fall tem muita profundidade nas entrelinhas. Você precisa saber em que ordem enfrentar os desafios do game, quais guerreiros usar, respeitar o tempo de descanso e os medos de cada um. Não é um jogo particularmente longo (cada dungeon dura cerca de 20 minutos), mas conseguir passar por todas em uma única run é praticamente impossível, o que agrega fator replay ao game.

Audiovisual

Embora tenha sido feito na engine Unity — que é versátil, mas um pouco limitada — Gods Will Fall é um jogo até que bem agradável visualmente: seu visual é meio cartunesco, e apesar da temática dark fantasy, há muitas cores, especialmente no mundo aberto da ilha, que entrega algumas paisagens e ruínas bem bacanas.

Análise Arkade: caçando deuses ancestrais em Gods Will Fall
Repare no tamanho da barra de vida (dupla) do chefe dessa dungeon

O design dos nossos guerreiros e dos inimigos comuns não chega a ser particularmente inspirado, mas os deuses são muito legais, emulando o visual de insetos e animais selvagens, ou simplesmente sendo criaturas bizarras, com línguas enormes, corpos feitos de plantas, caras com tentáculos, e muito mais.

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Esse parece uma planta/mariposa pestilenta

A trilha sonora é muito boa, com uma pegada meio tribal, com muita percussão, que combina perfeitamente com o clima do jogo. Há poucas vozes no jogo, e elas se resumem a gritos de guerra e a locução em um idioma fictício. E por falar em idiomas, infelizmente Gods Will Fall não recebeu nenhum tipo de localização para o nosso idioma. Não que haja uma grande história sendo contada, mas conforme seus guerreiros evoluem, eles ganham uma história — que só está disponível em inglês.

Conclusão

Gods Will Fall não é um jogo para todos. Eu mesmo não gostei na primeira partida, mas confesso que tenho um problema com características de roguelikes, tipo a falta de checkpoints e a permadeath. Falhar nesse tipo de jogo significa (literalmente) perder tempo, e quanto mais velho a gente fica, mais valorizamos nosso tempo.

Porém, conforme eu jogava e “pegava a manha”, o jogo se tornava mais interessante, e eu até me afeiçoei a alguns dos meus guerreiros — Trenton, da minha quarta run, foi um verdadeiro herói, matou nada menos que 5 deuses sozinho!

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“Ensopado pelo sangue de um deus” Trenton estava cansado (perdeu vigor), mas a empolgação da vitória lhe deu +3 de força!

O fato é: eu demorei um pouco para “entrar no clima” do jogo, e acho que ele demanda essa paciência, pois há muito o que aprender nas primeiras tentativas, e falhar faz parte do processo. Porém, se você tiver a perseverança necessária, vai encontrar uma experiência muito interessante e desafiadora.

Gods Will Fall será lançado amanhã, 29 de janeiro, com versões para PC, Playstation 4 (versão analisada), Xbox One, Nintendo Switch e Google Stadia. Agradecemos a Deep Silver pela cópia antecipada para este review.

Rodrigo Pscheidt

Jornalista, baterista, gamer, trilheiro e fotógrafo digital (não necessariamente nesta ordem). Apaixonado por videogames desde os tempos do Atari 2600.

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