Análise Arkade: Ultimate Chicken Horse é a criatividade a serviço da zoeira
Com um título como Ultimate Chicken Horse, certamente a desenvolvedora Clever Endeavour não tinha qualquer intenção de produzir o jogo definitivo da auto-reflexão, do questionamento social e da análise existencialista. Se a proposta é criar um ambiente completamente maluco e non sense, o game consegue alcançar esse objetivo com louvor. Afinal, é um ótimo trabalho que mistura plataforma com uma lógica de construção e customização, tudo regado a um ótimo multiplayer para rir muito com os amigos, seja no sofá, seja online.
Fácil de entender, difícil de dominar
Para pegar emprestado um termo comum dentro do campo do design de jogos, o conceito do jogo é muito fácil de compreender: todos os jogadores devem chegar do ponto A ao ponto B do cenário e, para isso, precisam construir, a partir de ferramentas disponíveis de criação, o próprio caminho. Algo semelhante ao conceito de Mario Maker, ou mesmo do saudoso e clássico jogo de browser Magic Pen. A princípio, tranquilo.
Contudo, é um jogo essencialmente multiplayer e o objetivo principal não é só chegar ao final, mas também evitar que o seu adversário faça o mesmo. E aí entra o elemento mais divertido do jogo, que é construir um ambiente que não seja tão fácil, já que se todos os personagens atravessarem, ninguém pontua, e nem tão difícil, já que se ninguém chegar, também não há vantagens. Ou seja, a principal meta é alcançar o ponto final e evitar ao máximo que outros façam o mesmo.
A questão é que todos estão criando o ambiente e o atravessando em turnos contínuos. Não exatamente em tempo real, já que a dinâmica é primeiro inserir um ou dois itens – que podem ser desde plataformas simples até armadilhas mortais – ao mesmo tempo que o(s) adversário(s) e, quando todos tiverem feito sua jogada, o jogo libera a fase para que cada um possa atravessá-la. É necessário montar o cenário que facilite a sua forma de jogar e obviamente dificulte ao máximo o caminho dos demais.
Essa é a parte complicada: criar um ambiente com uma lógica clássica de plataforma – buracos, armadilhas de espinhos, flechas contínuas, chão grudento ou escorregadio, etc. – que seja “atravessável” (afinal, você mesmo terá que superar esse caminho para vencer), mas nem tanto, apostando que suas artimanhas irão evitar que o seu inimigo faça o mesmo. Mais do que simplesmente espalhar armadilhas a torto e a direito, é necessário estudar a forma com que o outro joga e prever o que será eficaz contra ele.
Assim, a dinâmica entre os jogadores é fundamental para a diversão. Obviamente, jogar calado acaba tirando metade da graça do jogo, já que Ultimate Chicken Horse é daqueles games onde a provocação e a estratégia colaborativa — ou nem tanto — são muito bem-vindas para a criação de algo para além de um caminho tradicional de jogos de plataforma mais comuns. Competição e colaboração andam juntas e, muitas vezes, se misturam e se confundem.
Visual digno de escola primária
Ok, esse sub-título pode parecer pejorativo. Todavia, a intenção é exatamente contrária a isso, já que um dos grandes trunfos do game é exatamente não se levar a sério demais em momento algum. E se isso é verdade, a composição estética precisa fazer valer a regra, e o faz bem, com personagens caricatos e com traços simples, composição de cores muito bem arranjadas no melhor estilo flat design e com animações simplificadas, mas bem fluidas e confortáveis.
O mesmo vale para a trilha sonora, descontraída e com a essência de um party game, já que considera que a conversa, seja presencial, seja a distância, como parte da experiência do jogo. Assim, nada de notas mais trabalhadas ou efeitos mais sofisticados. E nem por isso, a mixagem se torna repetitiva ou exaustiva. O game é competente em não saturar os jogadores com informações audiovisuais demais, valorizando a criação e o diálogo como parte de sua estética.
Como um todo, o game consegue transpor seu conceito ao mesmo tempo simples e complexo para suas composições visuais e sonoras. Ao mesmo tempo que trabalha com cores chapadas, silhuetas e texturas, sabe lidar com os elementos que serão incorporados pelos jogadores. A malha quadriculada é um artifício interessante para os que buscam mais precisão, mas é no imprevisível que o game ganha os melhores contornos e as paisagens mais únicas. E é difícil lidar com ambientes enquanto telas em branco. Felizmente, missão bem sucedida.
Conclusão
Ultimate Chicken Horse é, antes de mais nada, um jogo para se jogar junto. Isso não quer dizer só que é um game multiplayer, já que é mais do que isso. Ele precisa de um elemento social forte, seja ao combinar com amigos, seja ao procurar ilustres desconhecidos na rede. Ou seja, para valer a pena, para que o jogo possa alcançar seu máximo potencial de diversão, é preciso que cada jogador esteja disposto a estar com o outro. De participar, de curtir, de se permitir dar risadas, provocar, ser provocado… enfim, zoar para usar uma palavra que resume a ideia.
Se isso for cumprido, 80% dos objetivos do jogo estará garantido. Aí é só escolher o bicho mais esdrúxulo possível para se tornar uma lenda, o ultimate animal, e montar os ambientes mais bizarros para conhecer diferentes formas de morrer e conhecer a derrota – ou até vencer e fazer uma dancinha maluca. esse é daqueles games onde brincar é até mais importante do que o resultado final. E quando o caminho é tão bom ou melhor que fim, o jogo vale a pena.
Disponível para XBox One, Playstation 4, Nintendo Switch e PC, Ultimate Chicken Horse está todo localizado para o português.